O Enem passou, os vestibulares
passarão e muitos pais irão respirar aliviados. Muitos deles mal sabem que um
caminho bem mais tortuoso que o anterior poderá começar.
A título de ilustração, vamos
ver o exemplo de Cláudia, que sempre foi uma excelente aluna: estudiosa,
comprometida, nunca deu trabalho aos pais. Almejava cursar uma graduação em uma
universidade concorrida e se empenhou muito para tanto. Entrou de primeira. No
primeiro mês de aulas ficou muito animada, mas logo em seguida passou a duvidar
da escolha feita. Antes de finalizar o primeiro semestre, desistiu do curso e
voltou a fazer cursinho. Hoje, já está em seu terceiro curso universitário e
continua insatisfeita. Seus pais não sabem o que fazer.
Paulo nunca se comprometeu
muito com os estudos. Levou a escola sempre no limite: repetiu o primeiro ano
do ensino médio e só terminou essa etapa escolar graças ao empenho de seus pais
na contratação de professores particulares. Não queria fazer faculdade. Seus
pais insistiram, e prestou um vestibular só para ver como era. Passou. Dizia
aos pais que estava cursando, mas nem aparecia na universidade. Hoje, passa o
tempo convivendo com os amigos e indo a baladas. Seus pais se sentem reféns da
situação.
Esses dois jovens, que
representam muitos outros, têm em comum uma família em boa situação
socioeconômica e pais que, apesar de não concordarem com a vida que os filhos
levam, não encontraram ainda uma maneira de agir principalmente porque os
filhos se dizem adultos e rejeitam a interferência dos pais.
O que é ser adulto, afinal? Ter
mais de 18, 21 anos? Não! Ser adulto é ter maturidade, fazer as próprias
escolhas na vida e arcar com elas. Esses jovens citados hesitam ao fazer suas
escolhas e não arcam com a própria vida: seus pais é que fazem isso. São
adolescentes, independentemente da idade. Permanecem sob a tutela econômica dos
pais, que não têm coragem de retirá-la.
Jovens que levam esse tipo de
vida precisam ainda de seus pais: estes, precisam dar um empurrão no filho para
precipitá-lo na maturidade. E, para tanto, eles precisam sentir necessidade
disso.
Você já se deu conta, caro
leitor, de que criamos os filhos hoje sempre a evitar que eles sintam
necessidades? Estamos quase sempre a nos antecipar às necessidades deles: antes
que eles queiram, queremos por eles
e damos a eles.
Isso faz com que eles tenham
uma visão bem equivocada da vida: acreditam que não precisam batalhar para
viver, que outros farão isso por eles. E esses outros são seus pais, não é
verdade?
Uma garota de 22 anos, que vive
uma situação semelhante à dos exemplos citados anteriormente, foi interpelada
pelos pais sobre como viveria quando eles não estivessem mais presentes. A
resposta dela assustou seus pais: "Vou viver da herança que vocês me
deixarem".
A situação é mais preocupante
do que muitos pais imaginam. Muitos jovens vivem às custas de seus pais. Já
outros vivem por seus pais -há poucos dias, um deles me disse: "Eu preciso
ir bem no Enem, não posso decepcionar meus pais".
Perguntei se ele queria, tanto
quanto seus pais, fazer a faculdade, e a resposta que ele deu foi: "Não
sei, nunca parei para pensar nisso."
Precisamos ajudá-los a crescer,
não precisamos?
Rosely Sayão – psicóloga e consultora em educação
Fonte: caderno cotidiano / jornal FSP