Sabe aquela cutucada, uma frase
oportunista que incentiva o consumo, mesmo quando você não quer e não precisa
de nada? Quantos de nós compram alguma coisa ao ouvir frases que mais parecem
um empurrão que nos apressa em direção ao consumo? "Só até amanhã",
"últimas unidades", "compre 2 e pague 1", "pague em
dez vezes sem juros".
O vendedor sabe que precisa
pressionar você a tomar uma decisão rápida. Se você parar para pensar, é grande
a chance de desistir da compra. Isso é fato, não se trata de
"achismo". Os portais que oferecem produtos, cursos e bugigangas dão
a venda como perdida quando o consumidor não confirma a compra no primeiro
acesso. Por isso a insistência para tomarmos a decisão rápida.
Resistiu à pressão? Pior para o
vendedor, melhor para você, que acaba de desistir da compra de um produto ou
serviço que você não tinha certeza de que queria, nem tinha gostado tanto assim
e não tem dinheiro para comprar agora.
Será que a cutucada também
funciona no sentido contrário, quando incentiva a poupança? Ou em políticas
públicas de combate ao consumo de drogas, prevenção a obesidade, diabetes e
outras doenças?
VOCÊ DECIDE
Em inglês, o "nudge",
em português, cutucada ou empurrão, só sugere, induz, mas deixa bastante espaço
para nossa decisão de aceitar ou não. O GPS, por exemplo, sugere um caminho.
Não aceite e faça outra escolha se não gostou da sugestão. A advertência no
maço de cigarros é outro exemplo; lembra que fumar faz mal à saúde; você que
sabe.
Os avisos legais nos rótulos de
alimentos e as campanhas educativas do tipo "se beber, não dirija"
são outros exemplos de cutucadas que tentam influenciar nossa decisão, visando
preservar a saúde e a vida.
VOCÊ QUIS ASSIM
Muitas vezes, não temos
escolha. Estacionar em local proibido é infração às leis de transito. Pode ser
que você tenha a sorte de não ser pego, mas, se for, é multa certa. Não espere
receber um empurrão simpático sugerindo que não faça isso. Os
"nudges" pressupõem uma boa liberdade de escolha; não é o caso aqui.
"Use camisinha" é um
"nudge" importante utilizado em políticas públicas de prevenção à
saúde e gravidez indesejada. Mas não espere uma cutucada amiga no que se refere
ao pagamento de pensão alimentícia. Deixar de pagar pensão para o filho, fruto
dessa relação desprotegida, não é escolha sua. Cadeia na certa!
APP
Muitas de nossas decisões de
compra são tomadas por impulso, sem planejamento, induzidas por comportamentos
que vêm sendo amplamente estudados pela psicologia econômica. Será que
mudaríamos os hábitos de consumo e gastaríamos dinheiro de maneira mais
consciente se pudéssemos contar com a ajuda de um aplicativo? Parece que sim.
Um app pode ser útil e ajudá-lo
a tomar uma decisão mais consciente. Para tanto, as instituições financeiras
deveriam implantar políticas e ferramentas para monitorar os gastos e enviar
alertas ao cliente. Vejamos exemplos que podem funcionar.
Cartão de crédito: permitir ao
cliente definir um limite, menor do que o concedido. O app alerta para o fato
de que o nível de consumo está próximo do limite definido. Avisa que gasto
superior a determinado valor poderá causar o financiamento da fatura no
vencimento, com pagamento de juros de X% ao mês.
Conta-corrente: o limite do
cheque especial deixaria de ser divulgado como disponível para saque. Alerta
quando o saldo efetivamente disponível estiver perto do fim. Alerta sempre que
o limite estiver sendo usado, informando o montante de juros que será cobrado
no fim do mês.
Quando o assunto é crédito,
seriam avisos benéficos para ambas as partes. Um banco não ganha dinheiro ao
conceder um empréstimo; ganha quando e se recebe o dinheiro de volta. Não
interessa a ninguém uma dívida que não será paga.
Investimentos: sempre que o
saldo em conta-corrente excedesse a determinado valor, o app enviaria alerta
informando o saldo excedente e perguntando se deseja investir. A aplicação
seria feita em produto previamente escolhido.
E você, se deixa influenciar
por cutucadas? Aprova a ideia de um app para ajudar você a tomar decisões
financeiras?
Marcia Dessen - planejadora financeira
pessoal, diretora do Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais
Financeiros e autora de 'Finanças Pessoais: o que fazer com meu
dinheiro'.
Fonte: coluna no jornal FSP