Só os gestores mais conceituados podem levar um
banco à falência
O
ramo mais atraente para quem quer uma carreira de sucesso é ser proprietário de
uma organização financeira falida
E cá estamos novamente. O sistema financeiro opera sem freio nem
regulação, dois ou três bancos vão à falência, o Estado intervém para evitar o
efeito de contágio, os bancos falidos prometem se comportar e, uns anos depois,
começa tudo outra vez.
E cá estamos novamente. O Silicon Valley Bank, o Signature Bank e o Credit Suisse estão em dificuldades.
O mais
fascinante, para mim, é a frequência com que bancos caem. O negócio dos bancos
é infalível. Trata-se de comprar dinheiro barato e vendê-lo mais caro.
Eles comercializam um produto de que todo o mundo gosta e que
não estraga.
Nunca ninguém foi ao banco dizer: "Desculpem, estas notas são
da semana passada. Este dinheiro não está fresco." Nunca.
Os bancos são administrados por pessoas que estudaram nas
melhores universidades e usam as melhores gravatas. É gente inteligentíssima a
gerir um negócio seguríssimo. Ainda assim, os bancos vão à falência
constantemente.
No entanto, há bastantes sinais de que os bancos são
administrados por gente superior ao mortal comum.
Quando o mortal comum vai à falência, ele vai à falência. O
banco é recapitalizado.
Não é uma ajuda: é uma recapitalização. Ajudas são para pobres,
que não conseguem se governar.
Esses devolvem a ajuda com juros dolorosos, para
não se esquecerem do que fizeram. Mesmo que alguém quisesse, não poderia
recapitalizar um pobre, porque ele nunca teve capital para começar.
O ramo mais atraente para quem quer construir uma carreira de
sucesso é ser proprietário de um banco falido.
Enquanto o banco não vai à
falência, os acionistas retiram todos os benefícios que ser banqueiro oferece;
quando vai à falência, não suportam nenhuma das desvantagens de falir —o Estado
toma conta de tudo.
Quem deve R$ 5.000 pode ter problemas: intimações, tribunais,
penhoras. Quem deve 5.000 milhões, em princípio, está mais à vontade.
Se você contrair empréstimos, já sabe: o segredo é apontar para
cima.
Para os devedores, aplica-se o mesmo princípio de mérito que
rege o resto da sociedade: os maiores e mais talentosos têm mais dinheiro e
prestígio.
Eu teria todo o gosto em fundar um banco falido.
Desgraçadamente, não tenho curso de economia ou gestão, e temo que a minha
falta de preparação técnica me levasse a criar um banco bem-sucedido e
próspero.
Só os mais conceituados e bem pagos gestores parecem ter a capacidade
para conduzir um banco estrondosamente à bancarrota.
RICARDO ARAÚJO PEREIRA - humorista, membro do
coletivo português Gato Fedorento. É autor de “Boca do Inferno”.