Chinês usa rede social; país vem se
tornando gerador de propriedade intelectual
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Se tem uma coisa que quem trabalha com política
pública no Brasil precisa fazer é parar de se informar sobre a China a partir
da perspectiva da imprensa norte-americana. O único jeito de entender o país é
vendo de perto como ele funciona. Em outras palavras, é preciso
"guanxi", termo que indica o costume chinês de só confiar em uma
pessoa depois de ter tido um encontro pessoal com ela.
A China está deixando de ser o "chão de
fábrica" do planeta para se tornar um país gerador de design e propriedade
intelectual. Há uma forte reorientação em busca de inovação ocorrendo.
O país já ocupa o segundo lugar no número de
patentes registradas, ficando atrás apenas dos EUA. Em nanotecnologia, a China
já está no primeiro. Em patentes de robótica, está em segundo, só atrás do
Japão.
A China se tornou o país do WeChat, aplicativo
criado pela empresa local Tencent. Ele é difícil de descrever. Funciona como
rede social, mensageiro eletrônico, app de transporte urbano, de paquera e meio
de pagamento. É impressionante ver que quase ninguém usa mais dinheiro ou
cartão. Todo pagamento é feito por celular com o WeChat. Inclusive quando
alguém manda dinheiro para outra pessoa (o app se integra à conta bancária
diretamente).
Se o Brasil quiser ter uma política externa capaz
de alavancar o desenvolvimento nacional, um bom passo é bater às portas da
China para cooperar em ciência e tecnologia. As Universidade de Pequim e
Tsinghua ambicionam ser a Harvard e a Stanford chinesas. Os campi estão
cercados de empresas de tecnologia. O iCenter de Tsinghua funciona como o
laboratório de novas técnicas de manufatura e está aberto a colaboração
internacional. Lá é possível ver impressoras 3D capazes de imprimir um carro de
uma vez, supercomputadores e programadores especializados em bitcoin e
blockchain.
Já a Academia Yenchin da Universidade de Pequim tem
sistematicamente acolhido estudantes brasileiros interessados em construir
pontes com a China, tal como a paulistana Lais Sachs. Ela e seis outros acabam
de criar uma associação dos estudantes brasileiros espalhados pela China.
Deveriam ganhar uma medalha da embaixada brasileira.
Brasil e China foram (e continuam sendo) dois
grandes beneficiários do sistema da OMC. Isso em si já consiste em um ponto de
cooperação entre os dois países, em especial neste momento de crescente
reprovincialização do comércio.
Além disso, o Brasil tem a ambição de deixar de ser
apenas um gigantesco mercado consumidor de tecnologia para se tornar produtor.
Para isso, o papel do Estado como indutor de inovação é essencial. Nesse
sentido, é importante a construção de um Plano Nacional de Internet das Coisas
(iniciativa da qual, vale dizer, faço parte). Só nesse setor já há grande
espaço de cooperação.
Nenhum país se desenvolve isoladamente. China e
Brasil eram economias agrárias nos anos 1970.
Só um deles reverteu esse quadro.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do
Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). Mestre em
direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil.
Fonte: coluna jornal FSP