Em períodos de crise, a liquidez
vale mais do que a rentabilidade e a segurança.
Quando
investimos, estamos acostumados a dar muita atenção à rentabilidade. “Quanto
vou ganhar”, pergunta o investidor, dando pouca ou nenhuma importância aos
outros dois atributos que formam o tripé dos investimentos, a segurança e a
liquidez.
Esquecemos
que a rentabilidade depende fundamentalmente dos
riscos inerentes às aplicações que constituem o leque de opções. Os
investimentos mais rentáveis são, naturalmente, os mais arriscados.
Quando
o investidor privilegia a rentabilidade, renuncia à segurança, assumindo riscos
que nem sempre conhece ou que não espera irão acontecer. A perspectiva de
ganhar mais ocupa todo o espaço mental, e a análise dos riscos e das perdas
possíveis deixa de ser feita.
A
liquidez então, coitada, colocada em terceiro plano e muitas vezes esquecida,
nem ao menos passa pelo processo de decisão, da escolha dos atributos que a aplicação financeira deve ter.
Se
pensarmos bem, os atributos, classificados por nível de importância, deveriam
ser liquidez, liquidez e liquidez, nessa ordem. Explico por quê.
Sabe
aquele imóvel que você comprou por R$ 500 mil e acha que vale R$ 700 mil? O
ganho esperado de R$ 200 mil só acontece quando e se o imóvel for vendido. O mercado imobiliário é o exemplo mais
contundente de como a falta de liquidez pode comprometer a estratégia do
investidor.
Se
não houver comprador, ou se o comprador não estiver disposto a pagar o preço
que o vendedor atribui ao imóvel, nada feito. O imóvel permanece com a placa de
“vende-se” durante meses ou anos, inviabilizando não apenas a realização do
ganho esperado como também a recuperação do capital investido.
Em 4 de março, o Ibovespa estava cotado a 107.224 pontos.
Em apenas 13 pregões, o preço do conjunto de ações que compõem o índice caiu
40%, para 63.569 pontos. A explicação simplista para o fato é a falta de
compradores no mercado —a quantidade de vendedores era muito maior do que a de
compradores.
O
comprador sumiu em razão da percepção de um risco que antes não estava no
cenário. O risco da Covid-19 na saúde das pessoas e o impacto das paralisações
de diversas atividades na economia como um todo destruíram todas as projeções
anteriores ao novo fato.
Em
uma situação de baixa liquidez, os preços são determinados pelos poucos
compradores, dispostos a comprar um ativo que muitos querem vender. O comprador
dita o preço, aplicando um bom desconto, até atingir um valor que considere
atrativo. A lei da oferta e da procura regula o preço.
Evidentemente
que existe uma explicação mais complexa que esclarece por que a quantidade de
compradores ou vendedores diminuiu. Mas essa é outra história que não precisa
ser entendida ou conhecida por todos.
Na
ponta final, o fator que afeta o nosso bolso, o nosso patrimônio e a
rentabilidade de nossas aplicações financeiras é a liquidez.
A
falta de equilíbrio entre compradores e vendedores altera, temporariamente, a
liquidez do mercado e, também, o chamado preço justo, que só se apresenta em
situações normais de mercado.
O
conceito de liquidez vai muito além dos investimentos e afeta também as nossas
finanças. Quando a receita cai ou a despesa aumenta, nossa liquidez, se houver,
nos salva. Refiro-me à reserva financeira constituída exatamente para períodos
de escassez, como o atual.
Pessoas
e empresas que tiverem recursos em aplicações com liquidez diária, isentas do
risco de flutuação adversa de preços, terão a chance de atravessar, com poucos
danos, esse período de crise. Bendita liquidez!
Marcia Dessen - planejadora financeira CFP (“Certified Financial
Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro”.
Fonte:
artigo jornal FSP