Cícero, nascido em 106 a.C, grande autor da literatura latina
“A coisa mais moderna que existe nesta vida é envelhecer” –
brinca Arnaldo Antunes na letra de uma das suas canções. Outra coisa moderna é,
por incrível que pareça, um texto de Cícero – sim, Marcus Tullius Cicero
(nascido em 106 a. C.!), importante autor da literatura latina – justamente
sobre o envelhecimento. Além de político influente, Cícero era jurista, orador
e filósofo. Suas breves e diretas reflexões sobre “a arte de envelhecer” são
atualíssimas (há uma barata e prática edição de bolso de “Saber envelhecer”, da
L&PM, fácil de encontrar, em tradução de Paulo Neves).
Segundo Cícero, “os velhos inteligentes, agradáveis e
divertidos, suportam facilmente a velhice, ao passo que a acrimônia, o
temperamento triste e a rabugice são deploráveis em qualquer idade”. Ou seja,
há velhos que pelo temperamento e sabedoria são mais jovens do que muitos
moços; há velhos que conseguem manter uma espécie de juventude permanente,
fruto de uma joie de vivre – uma atitude positiva diante da vida e da
passagem do tempo.
Cícero enumera no seu texto as quatro razões que as pessoas, em
geral, apresentam para achar a velhice detestável: o afastamento da vida ativa,
o enfraquecimento do corpo, a privação dos prazeres e a aproximação da morte. O
mestre latino rebate cada uma dessas razões, com argumentos fortes e realistas.
Em relação à vida ativa, por exemplo, ele observa que “não são nem a força, nem
a agilidade física, nem a rapidez que autorizam as grandes façanhas; são
qualidades como a sabedoria, a clarividência, o discernimento.
Qualidades das quais a velhice não está privada, mas, ao
contrário, pode muito especialmente se valer”. Segundo Cícero, “a irreflexão é
própria da idade em flor, e a sabedoria da maturidade”.
Como há mortos que estão mais vivos do que muitos vivos, há
velhos (apenas na idade) que estão mais vivos e ativos do que muitos jovens.
Cícero enfatiza como qualidades na velhice a vivacidade de espírito, o estudo
(e a descoberta) constante de coisas novas, o uso da força com parcimônia, o
exercício físico e a temperança, a ocupação do espírito e da alma, o trabalho
contínuo, a conversação etc. Enfim, manter a chama acesa.
Sobre a morte, que se aproxima com o envelhecimento, Cícero
observa: “como é lastimável o velho que, após ter vivido tanto tempo, não
aprendeu a olhar a morte de cima! Cumpre ou desprezá-la completamente, se
pensamos que ela ocasiona o desaparecimento da alma, ou desejá-la, se ela
confere a essa alma sua imortalidade. Não há outra alternativa”. E conclui com
sabedoria: “a natureza fixa os limites convenientes da vida como de qualquer
outra coisa. Quanto à velhice, em suma, ela é a cena final dessa peça que
constitui a existência”.
Carlos Ávila -
poeta e jornalista. Publicou, entre outros, Bissexto Sentido e Área de Risco
(poesia); Poesia Pensada (crítica) e Bri Bri no canto do parque (infantil).
Foi, por quatro anos (1995/98), editor do “Suplemento Literário de Minas
Gerais”. Trabalhou também na Rede Minas de Televisão e foi editor do caderno de
cultura do jornal “Hoje em Dia”. Participou de mais de vinte antologias no país
e no exterior.
Fonte: site domtotal - http://www.domtotal.com.br/noticias/detalhes.php?notId=777806