A importância da interação jurídico-atuarial


Nas atividades das operadoras de seguros em geral e previdência é inquestionável a importância dos serviços profissionais de atuários e advogados.

O atuário tem participação no desenho dos produtos, na definição das premissas técnicas e na avaliação das estatísticas, quando é o caso, tudo para dimensionar o custeio e, em consequência, estabelecer a precificação dos produtos.

Em paralelo à atuação do atuário, a administração da empresa deve, em conjunto com a área jurídica, tratar do preparo do regulamento/condições gerais dos produtos, ou seja, estabelecer em síntese os meios para efetivação das contratações.

Este trabalho conjunto tem por objetivo descrever os clausulados dos produtos atendendo às exigências das legislações e satisfazendo o equacionado em Nota Técnica Atuarial, mantendo com isso o equilíbrio das operações de forma consistente e duradoura ao longo da vigência dos contratos.

Apesar de tudo isto ser de pleno conhecimento das administrações das empresas, a atuação dos atuários e dos advogados nem sempre ocorre de forma uníssona na estruturação dos produtos de seguros e previdência ou até mesmo na solução dos questionamentos que possam advir da comercialização.

Hoje as empresas já dispõem de ouvidorias que num primeiro estágio procuram dirimir as dúvidas do consumidor. Porém, nem sempre os pontos questionados são de fácil solução, necessitando de esclarecimentos mais técnicos que envolvem a área atuarial ou jurídica, até mesmo ambas. É neste momento, quando o consumidor não entende ou não aceita as explicações da empresa, que ele parte para reclamação junto ao órgão fiscalizador ou aos Procon’s, indo em muitos casos até o judiciário.

Quando a discórdia chega às raias da justiça, cabe ao departamento jurídico da empresa avaliar a questão. Muitas das vezes, por acúmulo de serviço e aparente pouca importância da causa, é frequente a defesa da empresa ser entregue ao patrocínio de advogado terceirizado, nem sempre especializado na matéria em debate, mormente quando se faz necessário o auxílio do cálculo atuarial ou até mesmo de fundamentos atuariais.

O grau de importância dado pelas empresas às demandas está diretamente relacionado ao montante do valor em discussão em cada ação versus a despesa para defender posição tecnicamente correta. Muitas das vezes não é dada relevância à repercussão que um julgado negativo para a empresa possa ter no futuro em situações similares, sendo que por economia processual admite-se acordo sem vislumbrar as consequências para o patrimônio da empresa. E este risco é crescente, principalmente quando cada vez mais as empresas se voltam para a comercialização de planos coletivos, o que é facilmente observado em relação aos produtos da área de saúde, seguros e previdência.

De uma maneira geral, os produtos estão estruturados de forma correta, com aval dos órgãos fiscalizadores, fundados nos dispositivos das legislações.  Porém, nem sempre são assim entendidos pelo judiciário se não forem devidamente explicados e fundamentados tecnicamente.

Por isto é que nas demandas judiciais, onde seguradoras, entidades de previdência complementar, planos de saúde e produtos afins sejam acionados com pedidos que impliquem em questionamento sobre cláusulas contratuais relacionadas à matéria atuarial, deve ser requerida perícia específica logo na peça de contestação de modo a subsidiar  o processo de elementos técnicos que venham apresentar ao Juízo condição de convencimento da correção das justificativas expostas pela defesa. Isto não deve ser deixado para mais adiante no curso do processo, sob pena de que após a sentença a perícia se torne inócua diante dos prejuízos que daí possam advir.

Instalada a fase pericial no processo, torna-se importante, até porque não dizer imprescindível, a interação do advogado que defende a empresa com o atuário que venha a ser seu assistente técnico no processo. Este trabalho deve começar com o estudo da peça inicial, avaliando-se o pedido da parte autora e daí o preparo em conjunto da quesitação a ser levada ao processo de modo a contrapor-se ao requerido e conduzir as respostas do perito do Juízo na sequência da linha de raciocínio correta como está estruturado o produto objeto da demanda.

Isto tudo deve ser devidamente esclarecido ao Juízo para que ao final possa ser atingido o sucesso, ou seja, a rejeição do pedido do autor.

A atuação do assistente técnico, sempre em conjunto com o advogado, deve avaliar os quesitos da parte autora e interagir com o perito do Juízo de forma a obter respostas à quesitação na linha de defesa da empresa ré.

Apresentado o laudo pelo perito do Juízo, cabe ao assistente técnico avaliá-lo e a partir daí emitir Parecer Técnico que deve ser juntado ao processo em petição do advogado. Objetiva-se assim sentença favorável e no caso do prosseguimento do feito ter-se subsídios técnicos consistentes para prevalecerem em instâncias superiores, obtendo-se ao final o resultado desejado.

Apesar do descrito, vem sendo crescente a interação entre advogados e atuários nos trabalhos em processos judiciais contra empresas dos segmentos ligados as atividades securitárias não só quando a parte autora é pessoa física, mas principalmente quando ambas as partes são pessoas jurídicas: de um lado a seguradora, plano de saúde ou previdência complementar e de outro lado empresas, dos mais diversos ramos de atividade, que contratam ou intermediam produtos securitários e/ou previdenciários seja para si ou para seus colaboradores. Nestes casos os volumes de recursos em discussão são mais substanciais, além da representatividade do cliente na carteira da empresa securitária.

As matérias que envolvem temas relacionados às áreas de seguros, previdência e afins vêm num crescendo em demandas levadas ao judiciário. Tratam-se, em geral, de assuntos técnicos que careceriam em muitos casos de acolhimento em tribunais arbitrais no amparo da Lei nº 9307/96, porém até então são rejeitados neste sentido diante da considerada hipossuficiência dos autores, quando pessoas físicas, diante de supostos poderosos. Isto nem sempre é verdade quando a demanda é entre pessoas jurídicas. Por ora, esta alternativa ainda requer tempo para ser consolidada, sendo, porém, de se destacar que nas discussões no âmbito do resseguro é frequente a nível internacional a adoção de Tribunais Arbitrais.

Enfim, por tudo relatado, cabe aos administradores das empresas dos segmentos de seguro, previdência e afins, em conjunto com seus advogados, diante dos processos em que suas empresas sejam acionadas, identificar a cada caso a oportunidade do requerimento da perícia atuarial, utilizando-se de assistência técnica nestas demandas de modo que a matéria possa ser discutida consistentemente de forma técnica.


Heitor Rigueira - Consultor Atuarial

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