À
medida que a expectativa de vida aumenta e a taxa de natalidade cai, as
populações cada vez mais velhas colocam em cheque noções e políticas sociais.
Essa conversa sobre o envelhecimento foi realizada em Londres em parceria com a
curadora de palestras 5X15. O moderador foi Serge Schmemann, antigo responsável
pelos editoriais do International
Herald Tribune.
Os
participantes são Sarah Harper, gerontóloga britânica e fundadora do Instituto
do Envelhecimento Populacional da Universidade de Oxford; Babatunde Osotimehin,
médico, ex-ministro da saúde da Nigéria e diretor executivo do UNFPA, o Fundo
de População das Nações Unidas e Ruby Wax, comediante, escritora e
apresentadora de TV nascida nos EUA, vive em Londres e faz campanhas pela saúde
mental.
Serge Schmemann: A proporção de jovens e
idosos está mudando rápida e dramaticamente. A razão é simples, ao menos no
mundo desenvolvido: temos cada vez menos filhos e vivemos cada vez mais. As
estatísticas são surpreendentes. Na Roma antiga, sobreviver à infância era um
grande feito; atualmente, duas pessoas comemoram 60 anos de idade a cada
segundo. A maior parte de nós, especialmente as mulheres, irá viver até os 80
anos e alguns chegarão aos 100. Essa longevidade é uma conquista considerável
do desenvolvimento e dos tratamentos de saúde.
Porém,
ela também representa uma série de desafios; à medida que aumenta a proporção
de adultos, quem tomará conta deles quando chegarem à velhice? Quem irá pagar
as aposentadorias e as contas do médico? Em suma, viver mais é uma benção ou
uma maldição? Dr. Osotimehin, sua agência acompanha as tendências populacionais
de todo o planeta. Pode nos dar uma ideia do que está acontecendo à medida que
as populações envelhecem?
Babatunde Osotimehin: O envelhecimento é
inevitável e o mundo todo está ficando mais velho. Esse é um fenômeno global,
que não afeta só o norte ou o sul. Infelizmente, a consciência dos governos em
relação ao envelhecimento varia de lugar para lugar. Enquanto que o Japão, que
tem a população mais velha do mundo, reconhece o envelhecimento e criou
sistemas para garantir que os mais velhos recebam o cuidado necessário, existem
muitos países no mundo, especialmente no mundo em desenvolvimento, onde a
consciência ainda não está tão avançada. No ano 2050, dois bilhões de pessoas
no mundo terão mais de 60 anos e diversos países terão menos crianças com menos
de 5 anos, que pessoas com mais de 65. O mundo não pode ver isso como um
desafio, ou como um problema, mas como uma parte do desenvolvimento: como nós,
enquanto comunidade global, podemos lidar com a questão do envelhecimento?
É
importante que comecemos a mudar a forma como nos relacionamos com os cidadãos
mais velhos. Descobrimos que as pessoas mais velhas ainda possuem habilidades
que podem ser usadas no mercado de trabalho ou em suas comunidades. Precisamos
repensar a noção de aposentadoria e também a de emprego. É preciso refletir
sobre o desenvolvimento para os cidadãos mais velhos. É claro que não poderemos
fugir do fato de que todas as economias precisam de um grande número de jovens.
Não importa o quão habilidoso você seja aos 64, ou 68 anos; existem algumas
coisas que não consegue mais fazer e os jovens são importantes para isso.
Atualmente,
o equilíbrio está mudando drasticamente ao redor do planeta. Algumas economias
no norte da Europa e na Ásia tentam lidar com a falta de jovens, introduzindo
programas para encorajar a fertilidade. Ao mesmo tempo, em muitos países em
desenvolvimento na África e na Ásia – em especial no sudeste asiático –, 70% da
população têm menos de 30 anos. Os dois países mais populosos do mundo, a China
e a Índia, estão envelhecendo mais rápido do que a Europa e o restante da Ásia.
Isso se complica ainda mais em função da migração rápida dos campos para a
cidade. Por isso, esses países precisam estabelecer as formas de proteção
social de que essas pessoas precisam.
Porém,
em todo o planeta as populações estão vivendo mais. Precisamos garantir que
todos estejam socialmente protegidos, que todos tenham acesso à saúde, à
moradia e ao transporte. Essas pessoas precisam ser capazes de desenvolver suas
habilidades e precisam ter acesso a oportunidades econômicas, pois estarão
conosco por muito tempo.
Schmemann: Dra. Harper, muita gente
teme que, com o envelhecimento da população, estejamos caminhando em direção ao
colapso da família, dos sistemas de saúde e até mesmo de economias. Esse medo
tem fundamento?
Sarah Harper: Existem muitos mitos por aí.
Olhando em perspectiva, já sabíamos há muito tempo que isso iria acontecer.
Tudo começou na Inglaterra há cerca de 250 anos. Isso se chama transição
demográfica e é a substituição de populações predominantemente jovens, por
sociedades predominantemente idosas. Demorou 150 anos para que a Europa
passasse por essa transição, mas, no Hemisfério Sul, os países passarão por
essa transição em apenas 25 anos.
Contudo,
os demógrafos não foram capazes de prever duas coisas que tornam o contexto um
pouco mais complicado do que se previa. Em primeiro lugar, ninguém se deu conta
de como as taxas de natalidade caíram rapidamente. E isso não se limita à
Europa: os países com a taxa de natalidade mais baixa atualmente ficam na Ásia.
Em Hong Kong o total é de menos de uma criança por mulher. Na Coreia do Sul,
Cingapura, nas áreas urbanas da Índia e da Malásia a natalidade é muito
inferior aos níveis de reposição, que giram em torno de duas crianças por
mulher. Portanto, as taxas de natalidade de dois terços dos países do mundo
estão abaixo do nível de reposição.
De
certa forma, isso é bom, já que significa que as previsões iniciais de que a
população mundial poderia chegar a 24 bilhões de pessoas caíram atualmente para
10 ou 11 bilhões. Isso é melhor para o planeta, mas também significa que a
fertilidade está diminuindo tão rapidamente que já está causando um enorme
efeito paralelo. É a queda na fertilidade que ameaça nossas economias. Essa
previsão se baseia na noção econômica de que produzimos, consumimos, poupamos e
impulsionamos a economia quando somos jovens; e que, à medida que ficamos mais
velhos, nos tornamos menos produtivos e passamos a consumir nossas poupanças.
Portanto, o equilíbrio entre os grupos etários de determinada população gera um
impacto enorme sobre a economia.
O
outra coisa importante que não previmos foi ou aumento dramático da
longevidade. Basicamente, estamos deixando a morte para depois – em 1859,
metade da população inglesa morria antes de chegar aos 45 anos. Agora, metade
da população ainda está viva aos 85 e não precisamos fazer muito para concluir
que, em breve, metade da população estará viva aos 100. De fato, se observarmos
o crescimento no número de pessoas centenárias ou supercentenárias, estaremos
falando em expectativas de vida de 103, 104, ou 105 anos. Minha filha nasceu em
1996 e tem boas chances de ver no século 22.
O
isso fará com as sociedades? Há quatro coisas importantes para observar. A
primeira é o conceito de sucessão geracional: a ideia de que transferimos
posses, poder, riqueza e status de uma geração para outra de forma regular. O
que acontece quando você não recebe uma herança dos seus pais ou avós até
chegar aos 80 anos de idade?
A
segunda é o que acontece com o mercado de trabalho? Passaremos um período curto
nos educando, um período curto trabalhando e várias décadas aposentados?
Acredito que nossas trajetórias irão mudar completamente e que isso causará
impactos sobre o mercado de trabalho, mas nós não nos preparamos para isso.
Meu
pai se aposentou aos 54 anos. Agora ele tem 84 anos e passou mais tempo
aposentado do que recebendo salário e tem muito orgulho disso. É impossível que
eu, minhas irmãs, qualquer pessoa da minha família e muitos de vocês: a) tenham
esse tipo de aposentadoria e; b) sejam capazes de se aposentar aos 54.
A
terceira coisa é o contrato geracional. Na maioria das sociedades, nós temos um
contrato entre as gerações que afirma basicamente que você cuida dos filhos
quando são pequenos, para que eles cuidem de você quando chegar à velhice.
Agora precisamos nos perguntar se as famílias que têm menos filhos e vivem mais
deveriam assumir mais responsabilidades em relação às próprias vidas no futuro.
A
quarta é o sistema de saúde. Estamos realmente deixando a morte para depois,
mas em algum momento vamos chegar lá. Portanto, iniciativas de saúde pública
que nos mantenham saudáveis a vida toda serão absolutamente essenciais.
Acredito que as sociedades irão se adaptar e não creio que as economias irão à
falência, mas é possível que nossas sociedades se tornem ainda mais desiguais.
Schmemann: Sra. Wax, pelo que entendi,
acabou de terminar seu mestrado. Sobre o que foi sua dissertação?
Ruby Wax: Eu me formei na Universidade
de Oxford em terapia cognitiva baseada na plena consciência, que é parte
neurociência, parte atenção plena.
Schmemann: Isso é impressionante! Não
sei se isso a torna uma especialista em envelhecimento, mas, assim como eu,
você vive em um mundo em que as pessoas envelhecem, o que nos obriga a refletir
sobre isso. Sendo assim, gostaria de ouvir suas impressões, na qualidade de
alguém que sempre está no palco e que fala com as pessoas. Como você define a
velhice? É uma questão de idade, de fragilidade, de sentir-se velho? Como na
música dos Beatles, é quando "chegamos aos 64"?
Wax: Bom, para ser honesta não falarei a
partir do ponto de vista governamental ou sociológico. Achei que falaríamos
sobre como evitar a velhice, sobre como ter mais qualidade de vida quando
ficamos idosos. Ou então que falaríamos sobre onde fazer o melhor botox.
Nunca
direi que estou velha. Acho que quando você começa a se identificar como velho,
ou a dizer "sou alcoólatra", "sou deprimido", ou o que quer
que seja, você começa a se rotular. Uma das coisas que estudei foi a
neuroplasticidade; ou seja, que quando você começa a limitar sua visão de
mundo, e sua visão de si mesmo, milhões de neurônios começam a se atrofiar. Se
você não os usa, começa a perdê-los.
A
forma como devemos tratar os mais velhos é dizendo: "Tire essa bunda da
cadeira e vá aprender a nadar. Não fique sentado desse jeito. Arrume uma
massagista para o sangue circular direito e ajeitar essa coluna". Mas os
deixamos ficar velhos e começamos a tratá-los como animais de estimação. É
assim que vemos os idosos.
Para
ser sincera, ninguém quer ver uma velhinha nas telas. As pessoas não querem e é
por isso que não existem estrelas de cinema com mais de 50 anos. Assim, as
únicas pessoas que têm que encarar a velhice frente a frente são os próprios
idosos.
Então,
precisamos nos perguntar o que podemos fazer para a vida ser melhor. Correr,
andar, fazer exercícios, não ficar por perto das mesmas pessoas. Vá para a
Jamaica, pule de paraquedas. Você já está velho mesmo, o pior que pode
acontecer é você morrer.
Não
quero pensar a meu respeito como uma pessoa velha. Nunca digo a minha idade e o
dia em que fizer isso, estarei me tornando aquilo que imagino em uma pessoa
velha. É isso o que penso.
Schmemann: Você vai pular de
paraquedas?
Wax: É claro! Veja bem, a gente vive tempo
demais. Precisamos nos reinventar. Parte da tragédia é que os velhos ficam
amargos e dizem: "Me mandaram embora porque estou velho". É claro que
irão substituí-lo por gente mais jovem! O que você acha que vão fazer, deixá-lo
na TV para o resto da vida?
Ninguém
fica no mesmo emprego para sempre. Todo mundo é substituído, como as imagens de
cera do Museu Madame Tussauds – em algum momento eles o derretem e o
transformam na próxima grande atração. Contudo, todas as vezes que isso
acontece, você fica chocado. Quer dizer, eu fui mandada embora da TV porque
estava velha demais e, para mim, nunca estive mais bonita…
Schmemann: Você tem toda razão...
Wax: ...ainda assim eu fui tirada da TV,
então não vou passar o resto da minha vida berrando em frente à BBC com um
cartaz nas mãos. Eu pensei: é agora que vou colocar esses neurônios para
trabalhar. Vou voltar a estudar e aprender como o cérebro funciona. Isso é o
equivalente a aprender chinês. Nunca fui tão esperta e já entrei na casa dos
60. É isso!
Schmemann: Ruby disse uma coisa que não
costumamos encontrar na literatura sobre o envelhecimento: "O pior que
pode acontecer é você morrer". Morrer é uma das coisas que passam o tempo
todo pela cabeça dos idosos. E eles têm muitos medos: ficar sozinho é um deles.
Eles não acreditam que alguém irá ajudá-los quando chegar a hora. Dra. Harper,
o que você pode dizer sobre os medos que nos afetam quando chegamos a
determinada idade?
Harper: Até 100 anos atrás, a morte estava em
toda parte. Bebês morriam, crianças morriam. Agora, vivemos em uma sociedade em
que a morte foi afastada. Por isso, a morte passou a ser relacionada em grande
parte com a velhice; e a solidão e a fragilidade são duas coisas que deixam os
idosos com medo.
Mas
a Ruby está certa: enquanto nos mantivermos saudáveis e ativos, podemos deixar
a doença e a fragilidade para depois. A outra notícia boa é que quando você
chegar aos 60, 70, 80, 90, você ainda estará cercado por seus amigos, já que
eles também vão viver mais.
Wax: É verdade, mas depende de cada um ser
esperto o bastante para saber o que fazer. No futuro, quero viver em uma casa
cheia de gente esperta e com os cérebros trabalhando a mil.
Harper: Quando você tem recursos,
isso é possível, mas a maioria das pessoas não pode se dar a esse luxo e são
justamente as desigualdades da velhice que se tornarão uma questão importante.
Osotimehin: Acredito que também haja um
fator cultural a ser levado em conta. Em algumas culturas, especialmente na
Ásia e na África, a idade traz respeito e as pessoas sentem orgulho de serem
idosas. Elas são tratadas como líderes em suas comunidades e, por isso, acho
importante que, onde essas estruturas ainda existam, o governo e as comunidades
encorajem e apoiem sua continuidade.
Vi
um documentário sobre a vida de uma família no sul da Itália, onde as famílias
se reúnem com frequência e compartilham uma grande refeição. Você vê gerações
de filhos e netos reunidos em torno dos patriarcas e das matriarcas e isso dá
um senso de pertencimento aos idosos. Isso é muito importante.
Deixe-me
falar também sobre a África. O continente africano está envelhecendo muito
rapidamente, mas os índices de expectativa de vida ainda não mostram isso, uma
vez que tantas pessoas morrem de Aids. Mas se excluirmos a Aids do cálculo,
será possível notar que muitas pessoas estão ficando muito velhas. Portanto,
acredito que também é importante reexaminar as políticas sociais na África.
Outra
coisa que não posso deixar de dizer é que, uma vez que as mulheres costumam
viver mais que os homens, vemos muito mais mulheres do que homens pobres no
mundo. As políticas sociais devem levar isso em conta. A desigualdade de gênero
é um problema no mundo todo. Até mesmo na Inglaterra e nos Estados Unidos as
mulheres recebem menos que os homens para fazer a mesma coisa. Então, quando as
mulheres se aposentam, elas recebem menos, mesmo que vivam mais tempo, do ponto
de vista estatístico.
Schmemann: Dr. Osotimehin, onde você
gostaria de passar a velhice?
Osotimehin: Sou nigeriano. Eu vivo em
Nova York, mas gostaria de passar a velhice na Nigéria. Minha rede social está
na Nigéria. Lá eu não preciso ligar para avisar que vou fazer uma visita.
Simplesmente apareço, bato na porta e a gente toma alguma coisa. São coisas que
a gente nem percebe, mas que permitem que a gente tenha o que os franceses
chamam de "joie de vivre".
Você
sai, tem uma vida, com gente ao seu redor. Acho que isso dá um senso de
pertencimento, de alegria, uma ideia de que se precisar de um serviço, uma
ajuda ou um conselho, vai haver alguém que possa fazer isso por você.
Schmemann: Drª Harper, nós falamos
sobre a necessidade de uma aposentadoria tardia, de trabalhar por mais tempo.
Porém, também existe o risco de que os jovens não consigam trabalho. Não existe
um conflito entre as novas gerações que procuram trabalho e as mais velhas, que
não param de trabalhar? Isso leva a mais uma questão complicada: por quanto
tempo as pessoas devem trabalhar? E, já que estamos falando disso, por quanto
tempo as pessoas devem viver?
Harper: Estas são duas perguntas muito
diferentes: Existe uma expectativa de vida ideal? Existe uma expectativa de
vida máxima? Sempre existiram pessoas que viveram muito e sabemos que a pessoa
que comprovadamente viveu por mais tempo foi uma francesa que morreu aos 122
anos. Acredito que se alguém aparecer dizendo que a primeira pessoa que viverá
200 anos já nasceu, nós devemos duvidar. Da mesma forma, se alguém disser que
existe um limite para a vida, nós também devemos duvidar.
Quanto
ao trabalho, é preciso olhar em perspectiva. A queda na taxa de natalidade
significa que um número cada vez menor de jovens entra no mercado de trabalho.
Além disso, a idade de aposentadoria de 60 a 65 anos não faz sentido, já que,
do ponto de vista biológico, estamos extrapolando os limites da fragilidade.
Biologicamente,
muito pouco muda entre os 20 e os 70 anos em termos de capacidade física e
mental que não possa ser adaptado ao ambiente de trabalho moderno. Ainda assim,
vou a muitas conferências, especialmente no setor bancário, em que jovens
banqueiros de 20 ou 30 e poucos anos dizem: "Ah, mas gente idosa – ou
seja, com mais de 45 anos – não consegue lidar com a tecnologia". Isso não
é verdade.
É
uma fantasia dizer que os velhos estão tirando os empregos dos jovens. O mesmo
argumento costuma ser usado em relação aos migrantes. Existem certas áreas do
país em que existem muitos empregos, de forma que há espaço para muitos
migrantes e muitos idosos, mas, ao mesmo tempo, há espaço de sobra para
trabalhadores jovens. Na maioria dos casos, pessoas mais velhas não impedem os
mais jovens de conseguir empregos.
"Porém,
como vamos nos adaptar aos idosos?", me perguntam. Eu sempre digo que, há
100 anos havia um número muito pequeno de mulheres com mais de 45 anos, já que
a maioria morria no parto. De repente, as mulheres pararam de morrer no parto e
tivemos que criar uma sociedade na qual as mulheres adultas ainda eram ativas e
foi por isso que elas entraram no mercado de trabalho. Nós nos adaptamos.
Schmemann: Até quando devemos
trabalhar?
Harper: Acredito que devemos trabalhar enquanto
tivermos capacidade física e mental para contribuir com a sociedade. Se você
disser a alguém de 50 anos que essa pessoa precisa se aposentar em quatro ou
cinco anos, sua produtividade vai diminuir gradualmente. Todavia, se você
perguntar para alguém de 50 anos: "o que vai fazer da vida nos próximos 20
anos, já que ainda vai estar ativa e saudável?", essa pessoa verá uma
oportunidade para ficar na empresa, trabalhar em meio período, começar uma nova
carreira. Seus horizontes passam a ter uma relação muito mais direta com sua
saúde.
Schmemann: Está certo, farei isso!
Osotimehin: Permita-me acrescentar que
acredito que nós também precisamos redefinir o mundo do trabalho. Ir adiante,
ser criativo e inovador será ainda mais importante em função de todas essas
novas tecnologias. Acredito que seja importante permitir que cada ser humano
tenha acesso às habilidades que acompanham essas tecnologias, para que todos
possam ser criativos. Na República da Coreia existem programas que ensinam
novas técnicas aos idosos, para que eles sejam capazes de lidar com os avanços
necessários da tecnologia.
Schmemann: Ruby, vamos voltar à questão
de gênero levantada pelo Dr. Osotimehin. As mulheres vivem significativamente
mais que os homens. As estatísticas que vi indicam que para cada 100 mulheres
com mais de 60 anos, existem apenas 84 homens; e para cada 100 mulheres com
mais de 80 anos, existem apenas 61 homens. Portanto, existem muito mais idosas
que idosos.
Isso
tem vantagens e desvantagens. Estudos revelam que mulheres mais velhas
encontram mais funções sociais cuidando de crianças ou parentes, ou fazendo
trabalho voluntário, e que as pessoas preferem cuidar das mães a cuidar dos
pais quando ficam idosos. Ao mesmo tempo, as mulheres sofrem mais discriminação
que os homens, conforme todos sabemos. Você dá muitas palestras e se encontra
com muitas pessoas, quais são suas impressões sobre o destino das mulheres que
envelhecem?
Wax: Bom, em nível individual, as pessoas não
toleram o envelhecimento no mundo ocidental. Nós gostamos da novidade e isso é
algo comum à natureza humana. Quando era jovem, acreditava que devíamos nos
livrar da velharia. Então, eu me tornei a velharia. O que farei a esse
respeito? Aprender a mexer em softwares. Aprender outro idioma. O estresse, o
amargor e a inveja é que envelhecem as pessoas.
Não
estou falando sobre ter dinheiro ou não. Descendo de imigrantes que chegaram
aos EUA com uma mão na frente e outra atrás. Portanto, não consigo ver a mim
mesma como uma pessoa indefesa ou que pede as coisas para os outros. Digo isso
de um ponto de vista pessoal; a culpa é sua se você fica fragilizado. A menos
que você tenha doença de Alzheimer ou alguma outra doença crônica, existem
tantas coisas que podem ser feitas para evitar que você fique física e
mentalmente doente. Quem continua curioso mantém a mente sempre viva.
Não
há nada que assuste mais as pessoas – especialmente as idosas – que a
incerteza. "Estou velho! O que vou fazer agora?" Vou fazer o que
sempre fiz, vou trabalhar até ficar exausta. Não estou nem aí se sou homem ou
mulher, é isso que vou fazer.
Schmemann: Drª Harper, você anotou
alguma coisa enquanto Ruby falava...
Harper: Eu ia dizer que existe essa ideia de que
à medida que ficamos mais velhos, nos tornamos menos criativos. Mas existem
diversas evidências de que, na verdade, as pessoas são criativas de formas
diferentes e que algumas pessoas que recebem estímulos externos durante o
processo de criação fazem as melhores obras quando são jovens. Por outro lado,
pessoas que recebem estímulos internos fazem suas melhores obras quando ficam
mais velhas.
Wax: Contudo, existe um fato biológico e
neurobiológico que diz que os lados esquerdo e direito do cérebro começam a
trabalhar juntos e que as pessoas se tornam mais prudentes. Isso é algo
biológico, que permite ver as coisas de longe e é por isso que as pessoas
gostam de falar com os idosos, porque eles veem as coisas em perspectiva.
Eu
gostaria de ter um idoso por perto. Onde é que eles estão. Talvez pudéssemos
treinar uns velhos para que eles nos inspirem.
Osotimehin: Concordo até certo ponto.
Mas acredito que a sociedade precisa repensar sua construção. As pessoas de 65
anos são os novos jovens e precisam de espaço. Concordo totalmente que, em
nível individual, as pessoas devem ir adiante. Porém, acredito que também seja
importante que a sociedade como um todo vá além e crie novas políticas para
garantir que a idade não é o problema, e sim sua capacidade de produzir.
Voltando
à questão do gênero, vivemos em uma sociedade global na qual são os homens que
tomam as decisões, seja nos Estados Unidos, na Inglaterra, na África ou onde
quer que seja. Precisamos continuar a insistir que as mulheres – velhas,
jovens, adultas ou crianças – sejam tratadas da mesma forma que os homens.
Wax: Mas a única forma de alcançar isso é se
cada indivíduo assumir sua responsabilidade.
Osotimehin: Eu entendo o que você diz,
mas existe gente com a personalidade forte como a sua e outras pessoas que não
são tão firmes e que dependem do sistema para poder se expressar. Por isso,
precisamos seguir sempre adiante e continuar a garantir que mulheres e meninas
não sejam discriminadas no mundo todo e que os idosos também não sofram com a
discriminação.
Harper: O futuro reserva desigualdades cada vez
maiores e nós já somos testemunhas disso. Muitos governos dizem aos idosos que
o Estado não permitirá que eles caiam na pobreza e que irá garantir que tenham
o mínimo, mas, se quiserem mais do que isso, a responsabilidade será deles.
Isso é muito bom para quem tem os recursos necessários para trabalhar mais e
poupar, para quem tem uma família que cuide deles. Porém, acho que você está
certo, esse será o maior desafio dos próximos 20, 30, ou 40 anos.
Osotimehin: Eu concordo com você, mas
acredito que essa seja a beleza da democracia. Se temos as evidências,
deveríamos fazer nossos governos tomarem as decisões corretas, por mais
desconfortáveis que sejam. Não consigo entender porque os governos do mundo
todo – e não apenas do ocidente – cortam o orçamento da educação e da saúde
quando precisam reduzir os gastos. O capital social, a pessoa humana, é o bem
mais importante de qualquer país: então, qual é o sentido de negar educação e
saúde às pessoas?
Schmemann: Ruby, você deixou claro que
deseja continuar trabalhando duro enquanto puder, embora não tenha dito
exatamente isso. Você gostaria de viver até os 100 anos de idade?
Wax: Claro! Sem dúvidas.
Schmemann: Por quê?
Wax: Sabe, uma jornalista me perguntou certa
vez qual era o meu maior medo e eu disse "a morte". Então ela
perguntou: "Alguma razão em especial?". É claro que não quero
continuar vivendo se estiver louca Richard Lillash
Richard Lillash –
jornalista do New York Times
Fonte: site UOL