joseph
stiglitz, prêmio nobel de economia, acha que há um enigma a ser resolvido quando
se considera o efeito de inovação no PIB. segundo ele, mais de um, de fato.
stiglitz sabe que o assunto é polêmico, principalmente quando diz que o tipo de
inovação que vem do silicon valley não aparece nas estatísticas econômicas de
forma clara e que seu impacto na vida das pessoas não é muito evidente [na
melhor das hipóteses] e pode ser ruim, no pior caso, em função do desemprego
causado pelas ondas de inovação.
pois… olhe para o diagrama acima: a onda de inovação
de sistemas em rede é uma espécie de terceira onda de
inovação em TICs, e acontece no topo das revoluções de eletrônica
digital e da combinação de software e
redes de computadores. em conjunto, as três são o principal
motor do silicon valley e de lá pro mundo, e parte essencial de processos de
inovação em qualquer cenário. coisas como facebook, kindle, AWS, azure, google,
skype, twitter, instagram, whatsApp e android, só pra citar poucos, são
sistemas em rede. a onda de inovação de sistemas em rede começou de forma muito
primária lá no princípio da internet comercial, há uns 20 anos, “pegou” depois
da crise da internet do começo dos anos 2000 e se tornou parte do dia a dia de
muita gente a partir do advento dos smartphones contemporâneos, em 2007. daqui
até o fim da década, é bem provável que a maior parte da população mundial
tenha um dispositivo em rede que pode ser classificado como “smart” e, nele,
acesso a serviços que, há cinco anos, eram privilégio de comparativamente
poucos, se existissem. este é o cenário indicado pelos dois quadrantes
superiores e pelo centro do diagrama abaixo, que é explicado neste link.
o
professor stiglitz, quando ainda estamos no começo da internet das coisas [e de
tudo], está procurando o impacto das três ondas de inovação
digital no PIB. o departamento de comércio dos EUA diz que a noção de PIB foi uma das grandes invenções do séc. XX.
mas é claro que PIB não é uma medida ideal, nem tudo pode ser
medido pela produção de alguma coisa diretamente mensurável em receitas e [ou]
capital. claro que stiglitz sabe disso. ainda assim, quer ver o silicon valley,
na verdade o sistema global de inovação em
e com TICs, nas estatísticas de crescimento. tal pressa,
de querer resultados agora, lembra robert solow lá atrás, em 1987, vendo
“computação em tudo, menos nas estatísticas de produtividade”.
boa
parte da revolução das TICs, pra quem acredita numa, depende de pessoas: vem da
mudança de métodos, processos, do entendimento de novos artefatos e sistemas
para habilitar comportamentos, na vida pessoal e corporativa. como é de se
esperar, isso demanda atenção, tempo e competências cognitivas que já existem…
ou não. quanto menos houver, mais tempo vai se levar para que o impacto de TICs
[informaticidade, no primeiro diagrama deste texto] seja notado. mas os
analistas têm pressa. e parecem ignorar que inovações como eletricidade levaram
muito tempo para causar impacto significativo na economia e sociedade, como
mostra o gráfico ao lado, de chad syverson. note que
o efeito de eletricidade na produtividade é muito similar ao de informática, na
economia americana, nos primeiros 40 anos. nos dois casos, infraestruturas de
grande porte e alto custo tiveram que ser desenhadas, instaladas e entendidas
–e utilizadas apropriadamente- para que seu efeito se fizesse sentir. em 1882,
thomas edison dizia ter atingido tudo a que tinha se proposto;
trinta e cinco anos depois, a SEARS publicava anúncios estimulando as pessoas a
“usar eletricidade para mais do que luz”, com o
objetivo de vender eletrodomésticos. revoluções sempre levam tempo, porque as
pessoas não mudam de uma hora para outra e porque seus “sistemas” levam muito
tempo para, além de úteis, se tornarem econômicos,
confiáveis e resilientes. coisa difícil de
atingir, em quase qualquer cenário, quase sempre.
quase pra terminar, o anúncio abaixo é de 1892, dez anos depois de
edison ter “feito tudo”. pois… em 1900, eletricidade era 25 vezes mais cara do
que gás, na inglaterra, e apenas 7 vezes mais eficiente. você trocaria o
segundo pelo primeiro?… a menos dos early adopters, e com muito dinheiro,
quem trocaria?… pois é.
veja, no gráfico abaixo, como foi que a história da iluminação se desenrolou no reino unido,
com a luz elétrica passando a gás perto do meio do século passado, uns 60 anos
depois de edison ter “feito tudo”. leva tempo… muito tempo. se a gente imaginar
as possibilidades dos próximos 30, 50 anos de aplicações das novas gerações de
TICs nos mais variados cenários econômicos e sociais, talvez vejamos mudanças
radicais em muito mais atividades humanas. algumas delas, muitas delas, talvez,
deixarão de existir, como discutimos no texto deste link,
em função do impacto combinado de grandes volumes de dados, aprendizado
de máquina e robótica [móvel].
e o resultado vai ser muito mais dramático do que a curva de uso de
eletricidade para iluminação aí embaixo, professor stiglitz. é só esperar pra
ver…
Silvio Meira - pesquisador brasileiro da área de Engenharia de Software; formado em
Engenharia Eletrônica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica,
especializou-se em Ciência.