Por uma cidade mais inteligente


Hoje aproximadamente 50% da população mundial vive em áreas urbanas. Em 2050, esse número deve chegar a 75%. Considerando-se que as cidades ocupam somente 2% da área total do planeta, haverá um processo extraordinário de adensamento nas próximas décadas.

É muita gente vivendo junta.

Isso cria um dilema para prefeitos de grandes municípios. Ou o modo de administração se torna mais inteligente ou será preciso se preparar para maior desagregação social –ou até mesmo para o caos. Felizmente, a tecnologia digital, a internet e a "inteligência" trazida pela rede abrem caminhos para lidar com os problemas das metrópoles do presente e do futuro.

Vale lembrar que o surgimento da cidade moderna está relacionado diretamente a mudanças tecnológicas. A eletricidade, por exemplo, foi o fator que permitiu o adensamento dessas áreas. Prédios com mais de seis andares são impensáveis sem elevador (exceto se os moradores dos andares superiores forem atletas ou ermitões). Uma cidade como São Paulo só é viável porque existe bombeamento de água a partir de longas distâncias (quando a crise hídrica permite).

A conectividade funcionará como uma espécie de "segunda eletrificação". Nenhum grande município do planeta poderá se dar ao luxo de não aplicar diretamente a tecnologia na administração urbana. Por isso, a ideia das "smart cities" (cidades inteligentes) não é uma moda, mas uma questão de sobrevivência para as metrópoles.

O Brasil terá eleições municipais importantes neste ano. Não só por causa da elevada temperatura política, mas por ser o primeiro pleito eleitoral em que o tema das cidades inteligentes deveria se converter em pauta concreta de ação.

São muitos os exemplos globais para isso. Nos Estados Unidos, há um movimento crescente de "uberização" dos serviços públicos. Da mesma forma como todo motorista do Uber é avaliado pelo usuário a cada viagem, há cidades implementando um sistema de avaliação de seus serviços públicos pelo celular, disponível para o cidadão. Isso permite gerar um mapa em tempo real de satisfação com o serviço, a partir da experiência de quem o utiliza.

Esse esforço atribui responsabilidades também às próprias pessoas. Iniciativas como o Citizenvestor permitem a criação de financiamento coletivo para projetos de interesse público. Esse modelo reinventa o conceito de "parceria público-privada", abrindo novo potencial para soluções de questões urbanas.

Aplicar tecnologia à administração da cidade permite melhorar a gestão de recursos e a relação entre cidadãos e poder público. Claro que há riscos. A questão da privacidade é um deles e não pode ser ignorada. De todo modo, espera-se que o tema ingresse em todas as campanhas eleitorais dos grandes municípios do país. E que o eleitor possa ter a opção de votar por uma cidade (e um país) mais inteligente.

Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org); é mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil. 

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