Pesquisa divulgada na semana
passada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) diz que, na opinião atual
dos brasileiros, a corrupção é o maior problema do país. Diante disso, vale
lembrar a frase clássica do filósofo Henry David Thoreau: "É preciso mil
homens para cortar os galhos do mal e apenas um para cortar a raiz".
Enquanto os galhos da corrupção
manifestam-se nas inúmeras propinas e desvios revelados, sua raiz está na forma
como as democracias modernas vêm sendo sequestradas pela dependência dos
partidos e dos políticos de doações empresariais. Autores como o professor de
Harvard Lawrence Lessig mostram que políticos eleitos com doações de empresas
passam até 80% do seu tempo atendendo aos interesses de quem os financiou.
Tecnologia para derrotar a raiz
do problema já existe. Uma delas é secular. Trata-se do chamado "rule of
law" (império da lei), em que o sistema jurídico funciona, e a lei é
aplicada a todos igualmente. Isso começa a acontecer no Brasil. Além da Lava
Jato, o golpe essencial na raiz foi a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal)
de proibir doações empresariais a campanhas.
A decisão acaba com a situação
surreal da possibilidade de se defender dizendo que dinheiro ilícito seria
"apenas" doação de campanha ou caixa dois quando na verdade era
corrupção. Todas essas práticas corrompem e agora poderão levar ao mesmo lugar:
a cadeia.
Outra tecnologia para atacar o
problema é recente. Chama-se "blockchain" e consiste em um
sofisticado registro aberto de informações que existe de forma descentralizada
na internet. Esse registro é incorruptível. É como um gigantesco cartório, aberto
e gratuito, capaz de registrar e dar transparência perpétua para qualquer tipo
de operação.
O entusiasmo em torno do
blockchain é tão grande que ele foi capa há pouco da revista "The
Economist". Além disso, há uma mobilização global em torno dele, reunindo
programadores, investidores e líderes tecnológicos. A última dessas
mobilizações aconteceu em dezembro na Austrália. Em 2017 acontecerá no Brasil.
O blockchain, aliado à lei,
oferece soluções de baixo custo contra a raiz da corrupção. São muitos seus
usos. Por exemplo, a legislação pode exigir que todas as receitas financeiras
de partidos e candidatos sejam registradas no blockchain, independentemente da
proveniência.
Na mesma hora, os tesoureiros
dos partidos teriam de referendar aquela entrada, também no blockchain. Fazer a
conciliação de receitas e despesas torna-se muito mais fácil e transparente. O
procedimento é automatizado, aberto, barato, não toma tempo nem gera
burocracia.
Esse é um exemplo simples,
dentre muitas possibilidades. Da mesma forma como o Brasil foi pioneiro na
adoção de urnas eletrônicas em eleições nacionais, o país deveria ser pioneiro
no uso do blockchain para combater a raiz da corrupção.
Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do
Rio de Janeiro (ITSrio.org), é mestre e doutor em direito, pesquisador e
representante do MIT Media Lab no Brasil
Fonte: coluna no jornal FSP