Neurologista americano dá dicas para proteger a
memória do envelhecimento
Jogos,
ler romances e ter cuidado com a tecnologia são alguns dos alertas.
A memória vai ficando mais fraca conforme
envelhecemos. Esse é um pressuposto arraigado para muita gente.
No entanto, de
acordo com Richard Restak, neurocientista, neurologista e professor da
Escola de Medicina e Saúde do Hospital Universitário George Washington, esse
declínio não é inevitável.
Autor de mais de 20 livros sobre a mente, Restak
tem décadas de experiência na orientação de pacientes com problemas de memória.
Seu livro mais recente, "The Complete Guide to
Memory: The Science of Strengthening Your Mind" (O guia completo da
memória: a ciência do fortalecimento da mente, em português), inclui
ferramentas como exercícios mentais e hábitos de sono e de
alimentação que podem ajudar a melhorar a memória.
Contudo, Restak se aventura além desse território
familiar, considerando todas as facetas da memória – como ela se conecta
ao pensamento criativo, o impacto da tecnologia
sobre a memória, como a memória molda a identidade:
"O objetivo do livro é
superar os problemas de memória cotidianos."
Principalmente os problemas
da memória de trabalho, situada entre a memória imediata e a de longo prazo, e
relacionada à inteligência, à coordenação e à realização.
De acordo com o neurologista, esse é o tipo de
memória mais crítico, e exercícios para fortalecê-la deveriam ser praticados
diariamente.
Ele acrescentou que o reforço de todas as habilidades de memória é
essencial para afastar futuros problemas.
O médico argumenta no livro que o declínio da
memória causado pelo envelhecimento não é inevitável. Por outro lado, aponta
dez "pecados" ou "obstáculos que podem levar à perda ou à
distorção das memórias".
Sete desses fatores foram descritos pela primeira
vez pelo psicólogo e especialista em memória Daniel Lawrence Schacter como
"pecados por omissão", como a falta de concentração, e "pecados
por ação", como as memórias distorcidas.
A esses sete, Restak acrescentou outros três:
distorção tecnológica, distração tecnológica e depressão, afirmando que, em
última instância, "somos aquilo de que nos lembramos". Aqui vão
algumas dicas de Restak para desenvolver e manter uma memória saudável.
PRESTE MAIS ATENÇÃO
Alguns lapsos de memória são, na verdade, problemas
de atenção: por exemplo, se você se esqueceu do nome de alguém que conheceu em
um coquetel, pode ser porque estava conversando com várias pessoas naquele
momento e não prestou atenção ao ouvi-lo.
"A desatenção é a maior causa das
dificuldades de memória, porque significa que você não foi capaz de codificar
adequadamente aquela lembrança".
Uma maneira de prestar atenção ao receber uma nova
informação, como um nome, é visualizar a palavra.
Associar uma imagem a essa
palavra pode melhorar a lembrança, conforme exemplo do próprio Restak, que,
recentemente, precisou memorizar o nome de um médico, o dr. King (um exemplo
fácil, ele reconheceu). Assim, visualizou um médico "de avental branco com
uma coroa na cabeça e um cetro na mão, em vez de um estetoscópio".
DESAFIE SUA MEMÓRIA
DIARIAMENTE
Há muitos exercícios de memória que podem ser
integrados à vida diária, como a sugestão de memorizar uma lista de compras.
Ao
chegar à loja, não cheque automaticamente a lista (ou o celular). Em vez disso,
vá pegando os itens conforme se lembra deles. Tente visualizar os produtos
mentalmente e consulte a lista somente no fim, se necessário, instruiu Restak.
Se você não costuma ir ao mercado, memorize uma
receita. O neurologista acrescentou que o hábito de cozinhar é efetivamente uma
ótima maneira de melhorar a memória de trabalho.
De vez em quando, entre no carro sem ligar o GPS e
tente se lembrar do caminho. Um pequeno estudo de 2020 sugeriu que as pessoas
que usavam GPS mais frequentemente apresentavam um declínio cognitivo da
memória espacial mais pronunciado três anos depois.
SIRVA-SE DE JOGOS
Jogos como bridge e xadrez são ótimos para a memória, assim
como jogos mais simples, segundo Restak. O jogo das 20 perguntas, por exemplo,
é seu preferido para exercitar a memória de trabalho.
Neste, um grupo (ou indivíduo) pensa em uma pessoa,
um lugar ou um objeto, e a outra pessoa faz até 20 perguntas cuja resposta é
sim ou não. Para vencer o jogo, a pessoa que faz as perguntas precisa se
lembrar de todas as respostas anteriores para adivinhar a resposta correta.
Outro exercício de memória testado e aprovado por
Restak requer apenas papel e caneta, ou um gravador de áudio: primeiro,
lembre-se de todos os presidentes americanos em ordem decrescente, começando
com Joe Biden e chegando até Franklin D.
Roosevelt, por exemplo, e vá tomando nota ou gravando essa sequência; depois,
repita a operação começando por Roosevelt até chegar a Biden.
Em seguida, liste
apenas os presidentes do partido democrata, e apenas os do partido republicano,
e, por último, faça uma lista em ordem alfabética.
Se preferir, experimente fazer o mesmo exercício
com os jogadores do seu time favorito ou com seus escritores preferidos. O
objetivo é envolver a memória de trabalho, "mantendo e movimentando
mentalmente as informações", escreveu Restak.
LEIA MAIS ROMANCES
Segundo o neurologista, um indicador precoce de
problemas de memória é desistir de ler ficção: "Quando as pessoas começam
a ter dificuldades de memória, geralmente passam a ler não ficção."
Ao longo de décadas tratando pacientes, ele notou
que a ficção requer um envolvimento ativo com o texto, do início ao fim:
"Quando chega à página 11, você precisa se lembrar do que o personagem fez
na página três."
TOME CUIDADO COM A TECNOLOGIA
Entre os três novos pecados da memória incluídos
por Restak, dois estão relacionados à tecnologia.
O primeiro é o que ele chama de "distorção tecnológica". Ao armazenar
todas as informações no celular, isso significa que "você não tem
conhecimento delas, o que pode deteriorar suas habilidades mentais.
Por que se
dar ao trabalho de se concentrar e se esforçar para visualizar algo quando a
câmera do celular pode fazer todo o trabalho por você?", escreveu.
O segundo pecado é que nossa relação com a
tecnologia é prejudicial à memória porque ela geralmente tira o foco da tarefa
a ser cumprida. "Ao longo do dia, o maior obstáculo à memória é a
distração."
Uma vez que vários dispositivos tecnológicos foram
desenvolvidos com o objetivo de viciar o usuário, acabamos nos distraindo com
eles.
Hoje em dia, é possível checar os e-mails e assistir à Netflix ao mesmo tempo que conversamos
com um amigo ou andamos pela rua. Tudo isso diminui nossa habilidade de
concentração no momento presente, que é fundamental para o processo de
codificação de memórias.
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O humor influencia bastante o que fazemos ou aquilo
de que nos lembramos. A depressão, por exemplo, pode diminuir muito a
memória. "Entre aqueles que são encaminhados a um neurologista por conta
de problemas de memória, muitos estão deprimidos", afirmou Restak.
O estado emocional afeta as lembranças. O
hipocampo (ou "centro de formação de memórias") e a amígdala (a parte
do cérebro que gerencia as emoções e o comportamento emocional) são conectados.
Portanto, "quando está de mau humor ou deprimida, a pessoa tende a se
lembrar de coisas tristes". Tratar a depressão – por meio de remédios ou
psicoterapia – geralmente também restaura a memória.
DETERMINE SE HÁ MOTIVO PARA PREOCUPAÇÃO
Restak contou que, ao longo de sua carreira,
dezenas de pacientes lhe perguntaram como melhorar a memória. Mas nem todos os
lapsos de memória são problemáticos.
Por exemplo, é muito normal você não se
lembrar do local em que parou o carro num estacionamento lotado; esquecer-se de
como chegou ao estacionamento, no entanto, indica possíveis problemas.
De acordo com Restak, não há uma fórmula simples
para saber o que deve ser considerado preocupante, porque grande parte depende
do contexto.
É normal, por exemplo, você se esquecer do número de seu quarto de
hotel, mas não do endereço do seu apartamento. Se estiver preocupado, é melhor
consultar um especialista.
HOPE REESE – The New York Times