Bom rendimento na educação depende mais de gestão
do que de recurso
Análise sobre os
gastos com educação mostra que municípios que recebem o mesmo valor têm
resultados muito diferentes.
O Brasil tem metas para a educação básica bem estabelecidas.
Algumas são constitucionais, como o artigo 208 da Constituição Federal, que
determina a obrigatoriedade e a gratuidade da educação básica a todos dos 4 aos
17 anos de idade.
Outras são definidas por lei, como as 20 metas do Plano
Nacional de Educação (PNE). Mesmo com os objetivos delineados, o país derrapa
no básico.
Em 2021, ao final do ensino fundamental, menos de
35% e 15% dos estudantes tinham aprendizado adequado em português e matemática,
respectivamente, na escala Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
Hoje, temos instrumentos como o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) para aumentar o
volume de recursos destinados à educação.
No entanto, são a
liderança e a qualidade da alocação dos recursos disponíveis que parecem
responder pela melhora dos resultados.
Considerando que o Brasil já tem estratégias para
aumentar o valor do gasto educacional, precisamos pensar na qualidade desse
gasto, ou seja, nas decisões de alocação desse orçamento.
Apesar de a média de desempenho em aprendizagem ser baixa,
temos territórios com bons resultados. Ao fazermos um cruzamento de dados do
Tesouro Nacional e do Inep, vemos que o município de Granja, no Ceará, gastou
cerca de R$ 1.200 por aluno e obteve um resultado de 8,5 no Ideb dos anos
finais.
Com um valor por aluno parecido, o município de São Paulo de Olivença,
no Amazonas, teve um resultado de 2. Trata-se de uma diferença de 6 pontos em
cidades com gasto similar por aluno.
Entre os mais de 5,5 mil municípios brasileiros, a
diferença de resultados de aprendizagem é enorme.
O Fundeb não apenas tem aumentado o recurso da educação como também está
preocupado em equalizar a desigualdade de recursos: ele redistribui a verba de
forma que as redes municipais recebam o mesmo montante por pessoa.
Dessa forma, graças ao fundo, o valor gasto por
estudante é hoje maior e mais igualitário. Mas os dados do Tesouro evidenciam
que a desigualdade de resultado está, majoritariamente, na qualidade do gasto.
Um aumento de 15% nos recursos da educação gera um
alta de 2% nos resultados, passando de um Ideb médio de 5 para 5,1 nos anos
finais do ensino fundamental.
É possível, claro, reduzir a desigualdade
aumentando o gasto com educação, no entanto, como 86% da desigualdade é entre
municípios que gastam o mesmo valor, precisamos repensar a gestão educacional.
A principal causa da desigualdade nas notas do Ideb
tem relação com a qualidade do gasto nos territórios, com a liderança
educacional e com a capacidade de gestão das redes.
O que explica a diferença
de resultados entre municípios que recebem o mesmo valor? Decisões mais
certeiras sobre o uso de recursos.
Nesse cenário, a política pública educacional deveria
seguir a mesma trajetória do programa "Se Puede" do Chile.
O sistema
educacional chileno tem uma equipe que vai até as escolas e redes de melhor
desempenho (como a do município de Granja, no Ceará) e documenta as práticas de
gestão, de liderança e de uso de recursos.
A compilação dessas práticas é documentada em um
livro anual gerado pelo Ministério da Educação do país, que é compartilhado com
todas as escolas e redes chilenas, de forma a incentivar que boas práticas
estejam acessíveis e passíveis de incorporação e adaptação.
Não nos faltam dados para identificar redes que
fazem bons trabalhos, precisamos compartilhar bons exemplos e ter os incentivos
corretos para que os mesmos sejam incorporados.
LAURA MÜLLER MACHADO - mestre
em Economia Aplicada pela USP, é professora do Insper e foi secretária de
Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo.