O
papel da televisão no fornecimento de notícias ao público brasileiro é ainda
maior do que se imaginava, o que amplia extraordinariamente a importância da
observação crítica dos telejornais e programas jornalísticos. O
telejornalismo atraiu a atenção de 77,5% dos 18.312 entrevistados na pesquisa
nacional de hábitos informativos, realizada pela Secretaria da Comunicação da
Presidência da República (Secom) com apoio técnico do Ibope (ver Pesquisa Brasileira de Mídia 2014 – Hábitos de consumo demídia pela população brasileira).
Se
projetarmos os percentuais para o conjunto da população brasileira – estimada
pelo IBGE em 202,76 milhões de habitantes em 2014 – teríamos um total de 196,62
milhões de brasileiros dependentes da televisão como a sua principal fonte
de informação, e que nada menos que 157,92 milhões deles assistiriam
regularmente a telejornais e programas noticiosos na TV.
A
pesquisa, que ouviu pessoas em 848 municípios de todos os estados brasileiros
mais o Distrito Federal , concluiu que 45% dos telespectadores de telejornais
(total estimado em 71 milhões de pessoas) sintonizam regularmente o Jornal
Nacional, da TV Globo, e 16% ( estimativa de 25,2 milhões de pessoas )
assistem diariamente ao Jornal da Record, da TV Record.
Somando-se
os totais estimados para apenas dois telejornais teríamos uma audiência
possível de quase 97 milhões de brasileiros, ou seja 48% da população nacional
dependente de apenas dois telejornais para formar a sua imagem de sua região,
de seu país e do mundo. Trata-se de uma enorme concentração da oferta
informativa cuja principal consequência é uma forte redução da diversidade de
enfoques e perspectivas, algo que já é do domínio comum.
A
questão que se coloca agora é a necessidade de submeter a produção jornalística
das emissoras de televisão ao mesmo juízo crítico que já é exercido por
organizações como o Observatório da Imprensa em relação aos jornais e
revistas impressas. Não se trata de patrulhamento no sentido vulgar do termo,
mas de uma observação do conteúdo dos telejornais para identificar vieses,
intencionais ou não, no tratamento das informações transmitidas aos telespectadores.
Esta
é uma missão que supera a capacidade, técnica e humana, de monitoramento
televisivo da maioria das organizações e indivíduos que se dedicam à leitura
crítica da imprensa impressa e audiovisual. Com dependemos cada vez mais das
notícias recebidas da imprensa para tomar decisões, desde as mais simples até
as mais complexas, estamos diante de um desafio que atinge a todos nós.
A informação que desejamos e necessitamos depende de nós, porque as emissoras
de TV, assim como o resto da mídia jornalística, têm seus próprios interesses
determinados pela necessidade de sobreviver financeiramente.
A
forte dependência em relação ao noticiário produzido por duas emissoras de
televisão é um elemento que influi decisivamente na conformação do universo
cognitivo dos brasileiros. Cada notícia que recebemos gera uma reflexão
individual e comunitária cujos resultados alteram a forma como vemos a
realidade do nosso bairro, cidade, país e planeta. Trata-se de uma
responsabilidade imensa para as emissoras comerciais de televisão que, no
entanto, não conseguem dar conta dela porque precisam impor um ritmo industrial
na produção de notícias, visando baratear o seu custo.
Assim,
a maioria das notícias que saem num telejornal são aquelas cuja edição e transmissão
resultam mais econômicas para a empresa ou atendem a seus interesses
comerciais. A lógica empresarial dos telejornais é movida por índices de
audiência que, por sua vez, determinam o valor do minuto nos intervalos
publicitários. Temas que custam caro para ser transformados em notícia
televisiva, como temas comunitários, ou não se situam dentro das preocupações
editoriais da empresa, como movimentos políticos alternativos, ou ainda não
geram audiências, como reivindicações setoriais, dificilmente entram num
telejornal, embora possam ser de interesse de muitos brasileiros.
Nessas
condições, o papel da observação crítica passa a ser transcendental para que a
sociedade perceba quais as notícias que não recebe nos telejornais.
E o tipo de imagem que as emissoras projetam da cidade e do país em que
vivemos.
Carlos
Castilho – jornalista, professor, autor.
Fonte:
site Observatório da Imprensa