A crescente incorporação de medicamentos de alto custo tem
colocado uma pressão significativa sobre as operadoras privadas de saúde no
Brasil. Enquanto esses tratamentos trazem esperanças para pacientes com
condições graves, eles também representam um desafio financeiro substancial
para o setor de saúde suplementar. Com a rápida evolução de novas terapias,
especialmente na área de oncologia e doenças raras, as operadoras
brasileiras enfrentam dificuldades para equilibrar a necessidade de
oferecer cobertura e manter a sustentabilidade financeira.
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Segundo dados da ANS, a introdução de novos medicamentos
para tratamento de câncer e doenças raras em 2022 aumentou os custos
operacionais das operadoras em até 20%. Esse aumento é especialmente
sensível para operadoras de médio porte, que não possuem a mesma capacidade
financeira de absorção de custos sem que os aumentos sejam repassados aos
consumidores.
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Na mesma linha, estudos conduzidos pelo Instituto de Estudos
de Saúde Suplementar (IESS) indicam que o custo médio de medicamentos
oncológicos incorporados recentemente pode variar de R$ 50 mil a R$ 200 mil
por paciente ao ano, dependendo do tipo e da fase da doença. Para as
operadoras, a incorporação obrigatória desses tratamentos leva a um dilema:
repassar o custo adicional aos consumidores ou correr o risco de
deterioração financeira. A situação é agravada pela falta de mecanismos de
negociação direta de preços com fabricantes e pela inexistência de acordos
de compartilhamento de risco, que já são comuns em outros países.
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Por exemplo, na Alemanha, o impacto da incorporação de
medicamentos de alto custo nas seguradoras de saúde é mitigado por um
modelo de avaliação rigorosa conduzida pelo Instituto de Qualidade e
Eficiência em Saúde (IQWiG) e pelo Comitê Conjunto Federal (G-BA). Após a
aprovação de um novo medicamento, há um período de 12 meses durante o qual
o fabricante pode determinar livremente o preço. Entretanto, após esse
período, o preço é negociado entre fabricantes e seguradoras com base em um
acordo de reembolso centralizado. Esse processo evita aumentos abruptos de
custos para os pacientes e seguradoras, criando uma previsibilidade
orçamentária para o sistema de saúde.
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Outro exemplo interessante é o do Reino Unido. Lá é adotada
uma abordagem focada na análise custo-efetividade realizada pelo Instituto
Nacional de Excelência em Saúde e Cuidados (NICE). Medicamentos de alto
custo só são incorporados após uma avaliação rigorosa de custo-benefício,
utilizando o modelo de custo por ano de vida ajustado pela qualidade
(QALY). Esse modelo assegura que apenas os tratamentos que demonstram valor
real sejam oferecidos no sistema de saúde, reduzindo o impacto financeiro
para o NHS (Serviço Nacional de Saúde) e, por extensão, para as seguradoras
que contratam serviços complementares. Além disso, o Reino Unido implementa
acordos de compartilhamento de risco com fabricantes, onde o custo do
tratamento é reembolsado parcialmente caso não atinja os resultados
clínicos esperados.
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Mais um exemplo de abordagem diferenciada é o da Suíça, que
se destaca por sua abordagem de "pagamento por desempenho", onde
os custos dos medicamentos são parcialmente reembolsados com base nos
resultados clínicos reais dos pacientes. Essa prática cria incentivos tanto
para a indústria farmacêutica quanto para os prestadores de serviços de
saúde a buscar maior eficiência.
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A comparação internacional evidencia que o Brasil ainda
precisa avançar em termos de transparência e critérios claros para a
incorporação de medicamentos de altíssimo custo. Uma possível solução seria
a adoção de modelos híbridos, como os acordos de compartilhamento de risco,
permitindo que operadoras e fabricantes dividam custos conforme os
resultados obtidos, algo já praticado com sucesso em países como o Reino
Unido e a Suíça, que citei anteriormente.
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Em um cenário global
onde os custos de saúde só tendem a crescer, o Brasil precisa buscar um
equilíbrio entre a sustentabilidade financeira do sistema e a incorporação
de inovações que tragam reais benefícios aos pacientes. A experiência
internacional pode oferecer caminhos e modelos que ajudem a melhorar essa
dinâmica, garantindo acesso justo e equitativo a medicamentos. O debate é
interessante e urgente, e deve envolver todos os players do mercado.
Andrea Mente - atuária certificada pelo Instituto
Brasileiro de Atuária - IBA e pelo IAA (International Actuarial
Association) e sócia da Assistants Consultoria.
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