A importância de saber fazer


De tempos em tempos observamos a inundação do Poder Judiciário por ações distribuídas em massa, comumente originadas de uma tese desenvolvida para um caso específico, eventualmente bem sucedida, na qual pega-se carona e pretendendo-se semelhança com alguma outra situação ocorrida, mercê de algum esforço de adaptação, aplica-se a outros casos, para tentar a sorte.

 

Longe de qualquer generalização e sem pretender caracterizar qualquer cerceamento ao livre exercício da profissão, segundo a consciência de cada profissional, a verdade é que nem sempre postulações desta natureza refletem o direito da parte que, muitas vezes por impulso e até cobiça, outorga o mandato para o aparelhamento da medida, bem ou mal instruída sobre suas reais chances de êxito.

 

No momento do aparelhamento da ação, é nossa forte convicção, o profissional do direito tem por imperativo o dever de aconselhar e atuar com conhecimento da questão, lembrando de sua responsabilidade ética e social quanto a eventuais prejuízos que uma causa infundada possa trazer, não só ao Poder Judiciário, já tão assoberbado, como às próprias partes envolvidas e à sociedade.

 

Infelizmente, não raras vezes vivenciamos situações em que estes cuidados não são tomados e, no âmbito da previdência complementar fechada muitas vezes participantes se veem contrapostos às entidades que administram planos de benefícios de que participam, sem fundamento algum, exigindo atenção redobrada para que através de um trabalho de defesa correto a questão seja adequadamente colocada ao Judiciário, impedindo que um desserviço seja ocasionado com a criação de um precedente equivocado, vulnerando a imagem de confiança construída com grande esforço, ao longo de décadas.

 

A esse propósito, recentemente tivemos a oportunidade de vivenciar na Região Sul do país o aforamento de medidas judiciais por centenas de participantes de um plano previdenciário administrado por entidade fechada de previdência complementar postulando, dentre outros pedidos igualmente descabidos, a reversão em seu favor de supostos resultados superavitários obtidos, nos termos do disposto no artigo 20, da Lei Complementar nº 109/2001, e artigos 7º e 8º, da Resolução CGPC nº 26/2008, quando na verdade o excedente superavitário sequer chegara a metade do valor mínimo definido em lei para acionar o mecanismo de sua destinação...

 

Para os operadores do Sistema de Previdência Complementar não é difícil perceber que a pretensão é absolutamente descabida e infundada diante dos próprios termos da legislação supracitada.

Todavia, se a compreensão não é de fácil assimilação por quem não vivencia a matéria cotidianamente, aí incluídos os bravos magistrados que lidam com enorme volume e variedade de demandas, escorados em estruturas de parco auxílio, o risco de indução a uma interpretação equivocada da matéria decorrente de escrita difícil, por vezes confusa e descontextualizada, muitas vezes abusando de artifícios, é bastante elevado.

 

É nessa hora que o papel daqueles que trabalham pela manutenção e desenvolvimento do sistema de previdência complementar ganha extrema relevância, cumprindo desempenhar o mister de esclarecimento com afinco redobrado.

 

A recompensa, contudo, chega, e verificamos com satisfação que referidas demandas vem sendo rechaçadas pelo Judiciário através de decisões fartamente fundamentadas, inclusive com a confirmação das sentenças judiciais perante o Tribunal de Justiça[1], o que nos tem permitido verificar o brilhantismo da atuação dos magistrados na análise detida dos autos, da situação fática em que a tese se inseriu, da legislação correlata e da prova técnica produzida, evidenciando-se verdadeiro empenho quanto à compreensão da matéria.

 

Os esforços, no entanto, não podem parar por aí. São necessárias constantes ações de educação financeira e previdenciária para combater o ímpeto litigioso incutido em participantes e assistidos de planos previdenciários, que de resto seguem um certo perfil do brasileiro, o qual nos levou à arrepiante cifra de mais de 100 milhões de ações em curso pelas frações de nosso Judiciário.

 

É importante que reconheçamos, todos, os nosso equívocos e laboremos em prol do acerto. Mas também é necessário que nós, profissionais do direito, entendamos que nossa missão não é incentivar a litigiosidade, mas antes buscar esclarecer e verificar meios efetivos de composição de desavenças, permitindo que as estruturas possam, com mais folga, voltar-se à consecução de sua boa administração, aí inseridas as entidades fechada de previdência complementar, a fim de que seu objetivo maior de atender à proteção social de seus participantes e assistidos seja alcançada.

 

Juliana Camargo de Araujo Lima – advogada de Messina, Martins e Lencioni Advogados Associados.

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