O país
precisa se preparar adequadamente para uma situação de taxa de juros
estruturalmente baixa. No governo Dilma, os juros caíram durante um breve
período, apenas para voltar a subir posteriormente. Se a taxa Selic tivesse
permanecido baixa, a vida nacional sofreria uma série de impactos. Este
conjunto de notas versa sobre o que aconteceria na área dos fundos de pensão. O
que se pretende é que no dia em que os juros caírem de verdade e
estruturalmente e não por apenas poucos meses o país esteja devidamente
preparado. Em 2012, não estava, diz em artigo o economista Fábio Giambiagi.
A intenção
do economista é explicar como uma mudança da taxa de juros pode transformar uma
situação de equilíbrio em um caso de desequilíbrio dramático, na ausência de
medidas compensatórias.
Tomamos como
referência (de agora em diante chamado de "Caso A") a situação de um
fundo de pensão com ativos iniciais, por hipótese, de R$ 10 bilhões e um fluxo
de caixa inicialmente superavitário resultante da diferença entre a
contribuição dos ativos e o pagamento aos assistidos, de R$ 100 milhões/mês.
Supõe-se um
contexto inicial em que a taxa de remuneração real do ativo é de 6 % ao ano.
Definiu-se uma trajetória arbitrária conforme a qual, ao longo dos 80 anos
seguintes, esse fluxo se reduz, de tal forma que o saldo final do ativo
acumulado seja estritamente zero. O valor encontrado da redução mensal do fluxo
de caixa, para chegar a esse resultado exato, foi de R$ 759.827,07.
Trabalhamos
com valores reais, sem considerar a inflação, para facilitar.
Assim, no
segundo mês o fluxo de caixa hipotético é de R$ 99,240 milhões e assim
sucessivamente. Já o saldo acumulado cresce duplamente, no começo, pela
incorporação da remuneração financeira e pelo fato do fluxo de caixa ser
positivo, até a trajetória negativa do fluxo de caixa passar a diminuir o
estoque acumulado.
No final de
80 anos (960 meses), o fluxo de caixa no último mês do último ano é negativo em
R$ 629 milhões. O valor presente a preços do mês 0 desse mesmo fluxo, porém, é
de apenas R$ 6 milhões, dada uma taxa de desconto de 6 % ao ano.
Já no Caso
B, os fluxos monetários ou seja, a trajetória do fluxo de caixa são
idênticos aos do Caso A, porém supõe-se uma taxa de remuneração de 3 %.
Nesse caso,
no décimo segundo mês do ano 80, o mesmo fluxo de caixa negativo de R$ 629
milhões está associado a um valor presente a preços do mês 0 de R$ 59 milhões,
da ordem de 10 vezes do Caso A. Com uma menor remuneração do ativo, a diferença
entre o pagamento a assistidos e as contribuições acaba pesando mais em termos
relativos e o saldo declina rapidamente.
No final do
processo, o ativo desaparece e o saldo do passivo é de espantosos R$ 411
bilhões. Os gráficos 1 e 2 fornecem uma visão do processo.
No gráfico
1, mostra-se a diferença entre o comportamento dos fluxos de caixa expressos
mês a mês a valor presente do mês 0, enquanto o gráfico 2 exibe as trajetórias
do saldo acumulado do ativo ou, se negativo, do passivo nos Casos A e B.
Os exemplos
são obviamente inventados e embutem algumas simplificações que qualquer pessoa
familiarizada com questões atuariais identificará rapidamente. Eles são úteis,
porém, para o leitor ter uma dimensão de como uma taxa de juros elevada
favorece a geração futura de uma renda complementar.
O sistema de
previdência complementar não estava pronto em 2012 para uma situação de juros
estruturalmente baixos digamos, juros reais de longo prazo de 2 ou 3 % ao
ano.
Resta
esperar que se os juros voltarem a cair, daqui a alguns anos, estejamos melhor
preparados. Em tais circunstâncias, quem contribui para um fundo de pensão terá
que poupar mais, se quiser preservar a aposentadoria intacta a não ser que se
apele para o velho recurso de pedir uma capitalização do Tesouro.
Fabio
Giambiagi - economista e mestre em Ciências Econômicas, integra o Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade e o
Departamento Econômico do BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
Fonte: jornal Valor,
publicado no LaM dia 11/02.