A engenharia genética se barateou e se tornou acessível para amadores e curiosos em geral
Quer ver um fenômeno capaz de mudar o mundo, mas que
pouca gente notou? Então preste atenção na onda do biohacking, que começa a se
espalhar como um vírus pelo planeta.
O termo refere-se ao fato de que a engenharia genética
se barateou e se tornou acessível para amadores e curiosos em geral. Em outras
palavras, deixou de ser praticada apenas em laboratórios tradicionais ou no
mundo acadêmico e passou a ocupar garagens, espaços comunitários, cozinhas ou
porões espalhados pelo mundo.
É só perguntar para o jovem biofísico Josiah Zayner. No
ano passado, ele despertou a atenção global ao injetar em si mesmo uma terapia
genética com o intuito de modificar seu próprio DNA. Seu objetivo: aumentar o
crescimento muscular.
Sem buscar aprovação de nenhum órgão governamental, ele
usou a nova técnica CRISPR-Cas9 em um músculo do seu corpo, com o intuito de
limitar a produção de miostatina. Nas suas próprias palavras: "Quando a
miostatina não atua para impedir o crescimento muscular, os músculos
crescem". E, é claro, transmitiu tudo ao vivo pela internet.
Zayner não é um diletante. Formado em biofísica na
Universidade de Chicago, ele trabalhou no laboratório de biologia sintética da
Nasa. Largou tudo para se tornar um líder global da cena de biohacking.
Movimento semelhante ao que aconteceu nos anos 1970, quando a produção de
computadores migrou para as garagens, levando ao surgimento de empresas como a
Apple.
O fato é que hoje é possível comprar um kit de edição
genética em bactérias na internet por US$ 159. O kit vem com pipetas, discos de
Petri, plasmídeos Cas9 e mais. Por US$ 1.849 é possível comprar o kit completo
de engenharia genética, capaz de fazer o que até pouco tempo apenas grandes
laboratórios faziam.
Os dilemas éticos que esse tipo de atividade levanta não
são poucos. Analisando o discurso de Zayner, dá para ver que na defesa da sua
prática ele usa uma mistura de liberalismo com utilitarismo. Na visão dele,
"as pessoas têm direito de fazer o que quiserem com seus corpos".
Quando questionado se ele não acha que pessoas podem morrer nesses testes, ele
diz que "você tem de ponderar duas coisas: quantas pessoas podem morrer
versus quantas pessoas possuem desordens genéticas e estão morrendo por não
terem acesso a terapias".
A premissa é que o movimento de biohacking vai acelerar
as descobertas genéticas, da mesma forma como os hackers fizeram com os
computadores. A ver.
Em 2016, Zayner realizou outro experimento radical: o
primeiro transplante de microbioma.
Por sofrer de diversos problemas gastrointestinais, ele
decidiu trocar por completo sua cepa bacteriana intestinal. Fez isso por meio
de um transplante fecal. Testes realizados posteriormente mostraram que o
experimento foi bem-sucedido e ele alega que sua condição melhorou. O
experimento foi objeto de um documentário, chamado "Gut Hack".
Tudo isso ilustra como o biohacking inaugura
possibilidades aterradoras e promissoras.
JÁ ERA
Apenas computadores utilizando um sistema operacional
JÁ É Sistema
operacional Android, do Google, para carros
JÁ VEM
Sistema operacional Alexa, da Amazon, para carro
Ronaldo
Lemos - advogado,
diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org).
Mestre em direito por Harvard. Pesquisador e representante do MIT Media Lab no
Brasil.
Fonte:
coluna jornal FSP