Meu
pai faleceu recentemente devido a um linfoma que não conseguiu vencer.
“Existem
poucas pessoas neste mundo que deixam uma marca indelével”, escreveu um amigo
para mim, “de tal forma que, quando você reflete sobre a essência da pessoa,
consegue ver seu sorriso, ouvir sua voz e sentir sua presença como se ela
estivesse com você naquele momento. Seu pai é uma dessas poucas pessoas. Cada
encontro com ele fazia você se sentir melhor consigo mesmo. O mundo mudou; não
é o mesmo lugar sem ele.”
Sinto-me um pouco perdido. Estou em pedaços. Não tenho
foco, enfrentando uma enorme dificuldade para ser produtivo e progredir de
forma significativa em qualquer área.
Estou enfrentando uma perda e um sentimento de tristeza
muito pessoais no momento. Mas estou ouvindo outras pessoas descreverem
batalhas semelhantes conforme todos nós enfrentamos a pandemia, o colapso
econômico e a injustiça racial cada vez mais evidente. Isso também é pessoal.
Não gosto de sentir tudo isso. Fico ansioso.
Uma forma instintiva de superar a situação vem à tona.
Planejar, fazer listas e criar métodos para produtividade, realizações e
progresso. Isso eu sei fazer. É a minha zona de conforto em meio à incerteza.
Mas também enfrento um impulso na direção contrária, uma
discreta voz que parece mais profunda, mais significativa e ainda mais
assustadora: continuar improdutivo.
Pelo menos por um tempo. Sinta a tristeza, a perda, a
mudança. Mergulhe no desconforto de não seguir em frente ou de não fazer as
coisas. De modo estranho, não progredir pode ser uma forma de produtividade.
Algo prolífico está acontecendo, apenas não estamos controlando.
Nesse momento, ser improdutivo parece importante. Acho
que é o que devo sentir — talvez o que nós devamos sentir —
para permitir que haja crescimento. Permitir-nos fazer uma pausa entre um
estágio e outro, demorar-nos em uma pergunta que pede uma resposta:
Como posso me permitir uma mudança?
Não, ‘como eu deveria mudar’, ou
‘como devo mudar para acompanhar um mundo em constante
mudança’. E certamente não ‘como posso não mudar e preservar a
forma de como tudo sempre foi’.
Essas perguntas se originam do hábito de ser produtivo e
alcançar realizações o tempo todo. Mas elas não consideram a magia e o poder
transformador do momento — nossa verdadeira oportunidade.
É possível permitir que a mudança pela qual está
passando — extremamente pessoal e global — tome conta de você, mude sua visão
de mundo e mude você? Não com sua disciplina ou ímpeto, não de um lugar
autodirigido, estratégico e orientado a objetivos, mas de um lugar de
honestidade e vulnerabilidade. Não por obstinação, mas por boa
vontade.
Nesse momento de pausa, honestidade e vulnerabilidade,
você consegue ouvir a sua voz interior e perceber os alertas, sem se colocar na
defensiva? Consegue encontrar coragem emocional para seguir seus
pressentimentos, passo a passo, em relação àquilo que parece certo, mesmo que
não tenha certeza?
Quanto a mim, desejo estar aberto a ser moldado pela
perda que sinto com a morte de meu pai e pela elegância com que ele viveu sua
vida. Sinto tristeza por nunca mais poder ver seu sorriso ou sentir suas mãos
fortes e delicadas em minhas costas. E também me sinto encorajado porque,
quando sinto sua falta, sinto sua presença ainda mais, e posso começar — aos
poucos — a sentir meu próprio sorriso, minhas próprias mãos, ganhando forma de
novas maneiras, mais generosamente, com mais ternura e mais força.
Todos nós precisamos de coragem emocional porque estar
disposto a mudar significa aceitar e admitir que não estamos no
controle e que não temos as respostas. São duas coisas que
muitos de nós passamos a vida inteira tentando não admitir e, assim, vivemos
com pressa, consumimos, competimos, buscamos o sucesso e mergulhamos no
trabalho. O desapego traz desordem. E fica difícil perceber — admitir — que o
controle que exercemos sobre algo se resume apenas a uma sensação de
controle.
É por isso que desacelerar em vez de acelerar, parar e
sentir e lidar com este momento com honestidade e aceitação à mudança é
extremamente difícil.
Então, o que podemos fazer para enfrentar a situação?
Essa não é a pergunta certa. Eu já li — e segui — muitos
conselhos sobre coisas que podemos fazer para diminuir o ritmo e dar espaço
para mudanças: meditação, poesia, caminhadas, fazer um diário, ter o trabalho
dos sonhos e outras coisas. Mas tudo isso também pode atrapalhar porque implica
mais ações. É uma tentativa de solucionar o problema com o
mesmo pensamento que o criou.
Veja uma alternativa que tem funcionado para mim: não fazer
nada. Ou, pelo menos, fazer menos. Tenho praticado esse conceito de
algumas formas que podem ser interessantes para você. Considere flexibilizar:
O seu tempo
Distancie-se um pouco da sua agenda. Deixe um espaço
para nada fazer, literalmente. Nadinha. Não é a hora de
redigir textos ou mesmo focar no trabalho. Não preencha esses momentos com as
tarefas de ler e responder e-mails ou criar listas do que fazer.
Permita-se um tempo. Permita-se ficar ocioso. Saí para ir ao supermercado com
uma de minhas filhas e, na volta, ela pediu que eu seguisse um determinado caminho
até em casa. “Mas vai demorar o dobro do tempo!”, protestei. “Mas qual o
problema?”, ela respondeu, “É um belo caminho.” E realmente foi, em todos os
sentidos.
A sua forma de pensar
Deixe a mente divagar. Quando for correr, não ouça
música ou podcast, apenas corra. Ao recolher a roupa do varal,
apenas recolha a roupa. Não estou sugerindo “mindfulness”, em que você
se concentra em cada peça retirada do varal, por exemplo. Sugiro o oposto, na
verdade. Não pratique mindfulness — ela será
apenas mais uma forma de controle, mais pressão, mais demanda. Em vez disso,
deixe a mente divagar, independentemente de onde ela escolher ir e, talvez,
observe para onde ela vai.
Os seus relacionamentos
Caso precise ficar um tempo sem se encontrar com as
pessoas, permita-se isso. Tenho amigos ótimos e atenciosos que se ofereceram
para ir correr comigo ou conversar, e digo a eles a verdade: “Eu adoro vocês,
mas, nesse momento, quero correr sozinho”. Eles entendem. Se você quiser estar
com as pessoas, experimente fazê-lo com curiosidade e vulnerabilidade, sem
desperdiçar energia tentando ser outra pessoa. Se estiver ouvindo, não julgue,
não traga a solução e não dê conselhos. Apenas confie que sua presença é o
suficiente. E se estiver desabafando, apenas peça que a pessoa lhe ouça. “Eu
não quero conselhos”, você pode dizer, “Só quero contar o que está acontecendo
comigo”. Você também fará um favor a eles porque não estará
exigindo que saibam de algo ou que desempenhem determinado papel.
Quando você flexibiliza o seu tempo, sua forma de pensar
e seus relacionamentos, você desacelera, reduz a carga e abre espaço para que
os sentimentos aflorem. Talvez haja lágrimas, risos, tédio ou aborrecimento.
Pode ser que você sinta o estresse de não fazer nada ou o medo de ficar para
trás enquanto as pessoas ao seu redor produzem, fazem networking e
fazem negócios. Talvez você sinta alegria, o que pode, também, ser assustador.
Sinta tudo com coragem, sem apressar, reprimir, negar ou
se distrair com atividades. Dê espaço para que seu corpo, sua mente e seu
espírito se reorganizem. Acredite que algo importante está acontecendo — que há
algo bom do outro lado — mesmo que você não saiba o quê. Não é possível forçar
isso.
Mas é possível sabotar o processo. É difícil confiar
no não fazer nada quando estamos todos sofrendo perdas no
momento. Parece arriscado. Nossos hábitos de estar sempre fazendo algo são
muito fortes.
Sinto vontade de me apegar ao que conheço e ao que me
manteve seguro até então. Mas também posso sentir que, com cautela, vou me afastando
do passado, deixando minhas mãos livres, abertas, e estendidas para o que está
por vir.
Espero que você possa ficar aqui, comigo, neste espaço
por um tempo, enquanto nos permitimos tempo e tolerância para descobrir quem
somos e a pessoa que estamos nos tornando.
Peter Bregman
- CEO da Bregman Partners, uma empresa que ajuda pessoas de sucesso a se
tornarem líderes melhore. Autor do livro mais vendido “18 Minutes”,
seu livro mais recente é “Leading with emotional courage”.
Fonte: Harvard Business Review