Vender
o melhor para o cliente ou bater a meta do mês e receber a maior comissão?
Para alguns, jogada de marketing. Para outros,
concorrência agressiva baseada na crítica do modelo de negócio do sócio
concorrente.
O confronto envolve duas grandes instituições financeiras, uma do setor bancário, e outra, uma plataforma de investimento que nasceu
independente, conclamando os investidores a “desbancarizar”.
As armas de ataque se referem, basicamente, à oferta de
produtos de investimento sem alinhamento com os interesses e objetivos do
cliente e à forma como são remunerados os agentes comerciais responsáveis pela
distribuição desses produtos.
Quem tem razão? Aparentemente, nenhum dos dois, já que o
modelo de negócio é o mesmo, com sutis diferenças que o cliente que paga a
conta, em ambos os casos, desconhece.
Nos bancos, a pessoa responsável pela distribuição dos
produtos é funcionário assalariado da instituição financeira. Além do salário,
recebe bônus se bater as desafiadoras metas de vendas.
Na plataforma, a pessoa que interage com o cliente é um
agente autônomo que atua como preposto da instituição. Sua remuneração advém de
comissões que variam conforme o tipo de produto que vende.
A plataforma acusa o banco de vender cheque especial a juros abusivos,
título de capitalização, consórcio e outros produtos que fazem parte da meta
que os gerentes são obrigados a cumprir todos os meses.
O banco acusa a plataforma de usar seu exército de
assessores para vender produtos com pouco ou nenhum alinhamento ao cliente, em
razão do modelo de remuneração dos agentes autônomos, baseado somente em
comissões e rebate da taxa cobrada nos produtos.
De que lado estou? Do único que não foi lembrado e o que
mais importa, o cliente, que investe, corre os riscos e paga a conta. Sem ele,
não haveria disputa, não haveria mercado.
Tudo bem ser remunerado de um jeito ou de outro, ninguém
trabalha de graça. Mas o cliente tem que saber quanto paga para investir, quem
ganha quanto. Se o cliente estiver de acordo com a forma e com o custo, tudo
certo.
Apesar do potencial conflito de interesses em razão do
modelo de remuneração, o distribuidor de ambas as casas pode atuar no melhor
interesse do cliente. O dilema, de vender o produto mais adequado para o
cliente ou receber a maior comissão ou bônus, não precisa existir.
Ambos os profissionais podem errar se não estiverem
comprometidos com a conduta ética de colocar o cliente em primeiro lugar. O
gerente vende porque precisa bater a meta, o assessor vende porque ganha a
maior comissão. Se o cliente perceber que não está no centro das atenções, que
o foco é o produto, e não ele, deve se afastar e buscar aconselhamento em outro
lugar.
Remuneração embutida em produtos e falta de clareza
sobre custos, uma prática que tem de acabar.
Os agentes autônomos que atuam nas plataformas poderiam
receber, por exemplo, um percentual sobre o montante do investimento,
independentemente do produto vendido. Assim, seria eliminado o conflito de
vender um produto que lhe paga comissão de 5%, em vez de outro, mais adequado
ao cliente, que paga somente 0,20%.
O critério para dar bônus aos funcionários dos grandes
bancos poderia deixar de considerar a venda de produtos que não têm nada a ver
com investimento.
A mudança virá quando o consumidor perceber o poder que
tem, que a ele compete definir quanto está disposto a pagar e escolher quem
merece sua confiança e seus recursos financeiros. Sozinhos somos formiguinhas,
mas juntos, muito poderosos.
Marcia
Dessen - planejadora financeira CFP
(“Certified Financial Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com
Meu Dinheiro”.
Fonte:
coluna jornal FSP