Enfim, aposentado! E agora, o que fazer com aquele
dinheiro guardado? Poupar para as necessidades que o futuro incerto nos reserva
ou desfrutar a vida e gastar tudo? Esse é o dilema de quem acumulou dinheiro
durante a vida ativa, com muito trabalho e determinação de poupar para, um dia,
viver de renda.
Mas, quando esse momento chega, ainda temos muitos anos
pela frente. Sabemos quanto dinheiro temos, mas não quanto tempo vamos viver.
Nossa condição de saúde é incerta, e, apesar de todos os esforços de manter uma
vida saudável, é difícil prever o que vem pela frente.
Se nos deixarmos abater pelo cenário de incerteza, se
dermos poder ao medo de não sermos capazes de nos manter na velhice, se
quisermos afastar a possibilidade de depender financeiramente dos filhos,
abriremos mão de viver a vida e ficaremos chocando o dinheiro guardado. Decisão
prudente, mas muito elevado o preço a pagar. E não é de dinheiro que estou
falando...
Se, por outro lado, decidirmos que chegou a hora de
viver a vida, fazer um monte de coisa da qual nos privamos enquanto
trabalhávamos muito e criávamos os filhos, vamos sair pelo mundo gastando até o
último centavo. Felicidade garantida enquanto o dinheiro durar. Os herdeiros
preocupados porque nesse ritmo de gastança não vai sobrar nada para eles e,
pior, talvez tenham que bancar os pais na velhice.
Nem 8 nem 80. O ideal é o cenário intermediário,
equilibrado, de desfrutar a vida, ser financeiramente autossuficiente,
proporcionar alegria e prazer para si mesmo e, por que não?, aos entes queridos.
Será que é possível fazer as duas coisas, preservar e desfrutar ao mesmo
tempo?
Carlos tem 72 anos, é leitor assíduo da Folha e
está vivendo muito bem sua aposentadoria. Ele pratica o que chama de Herança
Antecipada. Tem dois filhos, muito bem casados. As noras ele adjetivou de
maravilhosas. Um neto e duas netas, de 11, 7 e 5 anos, completam a família
feliz.
Todos os anos ele planeja uma viagem em família. A
harmonia entre eles, a idade das crianças e a situação financeira de
Carlos permitem e viabilizam a viagem. Já foram conhecer a Disney e, no ano
passado, levou a neta para patinar no Central Park, em Nova York.
Viagens culturais estão sendo planejadas, um cruzeiro
pelos países nórdicos, uma viagem à Europa e outra à Ásia, para conhecer novas
culturas, algumas milenares, tradições e artes distintas das nossas, jovem
país de pouco mais de 500 anos. Muita história e sabedoria para absorver.
Não é o máximo? Ele desfruta a vida viajando, coisa que
ele adora fazer e está sempre bem acompanhado. A família desfruta também,
porque a generosidade de Carlos permite que eles antecipem experiências que não
poderiam ter, não agora. A prioridade dos pais (filhos de Carlos) é educar os
filhos, e todo o dinheiro disponível está sendo canalizado para essa importante
prioridade.
Os filhos (e noras) são gratos pelo presente. Os netos
devem achar que o avô é o cara mais legal do mundo e certamente vão se
lembrar dele com muito carinho e gratidão.
Carlos celebra a vida na companhia das pessoas que
mais ama. É previdente e não gasta mais do que a renda proporcionada pelo
patrimônio acumulado. Dessa forma, garante que os recursos não se esgotam, não
totalmente, garantindo sua autossuficiência.
Herança antecipada, é assim que Carlos denomina a
estratégia que permite unir o útil ao agradável. Além de desfrutar a vida,
viabiliza transferir aos herdeiros parte dos recursos aos quais eles só teriam
acesso depois de sua morte. Muito melhor desfrutar em vida, na companhia
de filhos e netos!
O procedimento formal de herança pode ser longo e caro.
Honorários advocatícios e o ITCMD (Imposto sobre Transmissão de Herança e
Doação) são calculados sobre o patrimônio objeto do inventário. Ao gastar parte
dos recursos patrocinando as viagens em família, reduzimos o patrimônio líquido
a ser inventariado e, portanto, as despesas relativas ao processo de
sucessão.
A
tática da herança antecipada aumenta a felicidade e o bem-estar de quem
proporciona financeiramente a experiência, transforma sonhos em projetos de
vida, beneficia e amplia a convivência familiar e ainda permite reduzir custos
futuros. Um bom exemplo de felicidade que o dinheiro pode comprar.
Marcia
Dessen - planejadora financeira pessoal,
diretora do Planejar e autora do livro 'Finanças Pessoais: o que Fazer com Meu
Dinheiro'.
Fonte: coluna jornal FSP