Não resistiu em conhecer a solução mágica, hein? Está aberta
oficialmente a temporada de promessas demagógicas. Cada um dos milhares de
candidatos a um cargo eletivo no país tem as soluções para transformar o Brasil
no melhor país do mundo em todas as áreas da vida, da economia à educação; da saúde à infraestrutura; do transporte ao lazer. O melhor,
alcançaremos tudo isso, em apenas quatro anos, e sem abrir mão de absolutamente
nada.
Seria fácil culparmos apenas as eleições pelo tsunami demagógico
que assola o país. A democracia, inegavelmente o melhor sistema político
inventado até hoje, é cheia de defeitos. Um deles é o incentivo à demagogia a
cada ciclo eleitoral. Mentirosos demagogos são eleitos; quem diz a verdade
sobre os custos para alcançarmos objetivos maiores, não. Simples assim.
Infelizmente, temo que a raiz da inundação de mentiras é mais profunda. O problema somos
nós. Queremos tudo, queremos já e queremos de graça. Em resumo, queremos ser
enganados.
Esta postura dos eleitores não é nova, nem exclusividade brasileira. Em maior
ou menor grau, ela existe e sempre existiu em todos os países. No entanto, as
manifestações de rua parecem tê-la exacerbado. Queremos melhores transporte,
saúde e educação, e de graça. Resumindo, “me engana, que eu gosto.”
A resposta dos políticos? 10% do PIB para a saúde, 10% do PIB
para a educação, 10% do PIB para sei lá eu mais o que. Óbvio que saúde e
educação estão entre os fins mais nobres possíveis para recursos públicos, mas
será que o problema é, primordialmente, falta de recursos ou de gestão? De onde virá o
dinheiro? Magicamente, os políticos nos asseguram que teremos tudo e não
pagaremos nada.
Fontes de recursos? Por exemplo, a eterna proposta de renegociar a dívida
pública. Se ela resolvesse algo, a Argentina não seria um dos 3 únicos países
nas Américas onde o PIB terá desempenho pior
do que o Brasil neste ano,
segundo as projeções da CEPAL.
As pesquisas eleitorais e a voz das ruas provam que o Brasil quer mudar. Se
queremos mudanças construtivas, primeiro temos de reformular nossas próprias
expectativas. Chega de falsas soluções. É hora de discutirmos os custos de cada
política pública e não apenas seus supostos benefícios. Cotas garantem o acesso
de determinados grupos à universidade, mas reduzem o acesso dos demais. Meias
entradas barateiam o acesso a espetáculo para alguns, mas às custas de
encarecê-los para os outros. Tarifas de importações altas protegem subsetores
de nossa indústria, mas reduzem a
competitividade de subsetores industriais supridos pelos protegidos e tornam os
produtos no Brasil os mais caros do mundo.
Queremos, mesmo, adotar estas medidas?
O crescimento vertiginoso da candidatura de Marina da Silva e suas promessas
conciliatórias sugerem que o povo está farto da polarização paralisante que
dominou o país nos últimos anos. Chega de ricos x pobres. Chega de nós x eles.
Chega de um nacionalismo ufanista, onde nada no Brasil pode ser criticado – e, por
consequência, nada é melhorado. Não há complexo de vira-latas maior do que
achar que o país não resiste a nenhuma crítica. Chega também de uma
desesperança debilitante que teme que nada tenha solução no Brasil e onde nada
pode ser elogiado. Tomara que o Brasil do “ame-o ou
deixe-o” esteja morrendo, mas que ele não seja apenas substituído por um país
de novos sonhos demagógicos, e sim por escolhas e ações conscientes para
construirmos o país que queremos e podemos ser, não em um ano, sequer em um
mandato presidencial, mas quiçá em uma geração.
Ricardo Amorim - economista, apresentador
do programa Manhattan Connection da
Globonews e presidente da Ricam Consultoria.
Fonte: revista ISTOÉ