Neste
momento tão difícil da vida nacional, eu busco paliativo na maior e mais
natural das drogas: a endorfina. No dia 15 de novembro, o meu primeiro triatlo
me espera.
É
um virada contundente na vida de um ex-gordo fumante de 160 quilos galopando
para os 200 quilos.
Naquela
época, Roberto Kalil, meu médico, foi taxativo: você vai morrer.
Eu
escrevo este texto às 4h40, o momento em que saí da cama nesta segunda-feira
fria de São Paulo rumo à piscina da academia.
O
triatlo "short" para o qual venho me preparando são 750 m de nado, 20
km pedalando e 5 km correndo.
Assim
escrito não parece tão difícil.
Mas,
na realidade do simulado que fiz no mês passado em São Carlos, no interior de São
Paulo, não é fácil não.
É
como ser empresário no Brasil.
Tributos
mais burocracia mais péssimo ambiente de negócios mais imprevisibilidade ...
Somos todos “ironmen”.
Empresário
hoje no Brasil não dorme e não sonha. Eu desmaio.
São
duas horas e meia de treino que caminham para três com uma folga na sexta. Nos
fins de semana, faço um treino longo no qual posso nadar com a roupa de
borracha que vestirei na prova e pedalar em ladeiras que me darão mais músculo.
Chego
geralmente às 8h na empresa, onde tomo banho, café da manhã (o segundo após o
treino), almoço lá mesmo e só saio às 20h.
A
endorfina foi fundamental para fazer a empresa que toco subir dez posições no
ranking de agências de publicidade do Brasil, numa virada espetacular. Ela nos
ajudou a conquistar uma das maiores vitórias de minha carreira profissional no
festival de Cannes deste ano, tem atraído clientes e talentos para trabalhar
conosco e mudou o ambiente de trabalho.
Sim,
foi tudo graças a ela: a endorfina.
É
muito melhor que Rivotril. A história da minha vida é a luta pelo sono e pelo
sonho. Esse triatlo tem me dado os dois.
Neste
momento de desalento nacional, sou um drogado na multidão.
Eu
fugi da realidade. Que, aliás, é meu truque no Brasil desde sempre.
Quando
cresci, havia a realidade da ditadura. Quando comecei minha agência, a
realidade da inflação. Hoje, a realidade dos fatos. Quando pulo da cama e vejo
meu peso, entro imediatamente num sonho grande, como diz Jorge Paulo Lemann.
O
homem não pode viver sem seu sonho grande. Sou baiano, vindo de uma família de
esquerda. A disciplina nunca foi minha praia. A endorfina me levou para a
disciplina, a rotina, a soneca depois do almoço, a castanha no meio da tarde.
E,
à noite, eu desmaio. Às 21h30, 22h sou um ser em transe.
Durante
o dia, a endorfina me deixa em ritmo de Brasil grande. Sou um sujeito
desconectado da realidade. Parece que a economia está crescendo a 4% ao ano.
O
Brasil está cheio de problemas, mas tenho um seriíssimo: a piscina.
Das
três modalidades, a natação é a que mais me desafia. Por isso, vou ter que
aumentar meus treinos de natação de duas para três vezes por semana.
Meu
peso no início do ano era 104 quilos. Agora estou em 97 e preciso perder ainda
mais sete para o triatlo do dia 15 de novembro.
Peso
é custo, a data é a meta.
Enfim,
é tudo gestão digna do meu mestre Galeazzi.
Não
é à toa que grande parte dos empresários modernos, como Alexandre Birman e Duda
Sirotsky Melzer, é também maratonista.
A
grande maratona é o Brasil.
O triatlo nos dá força para enfrentar esse “ironman” que é ser empresário
brasileiro
Nizan Guanaes - publicitário baiano, é dono
do maior grupo publicitário do país, o ABC.
Fonte: coluna jornal FSP