“ A implantação de uma agenda focada
na sustentabilidade ainda é vista como uma oportunidade de mercado na
área hospitalar.
Entretanto, as perspectivas indicam que inevitavelmente será um padrão a
ser adotado e, mais do que isso, um diferencial competitivo”.
Muitos
gestores hospitalares ainda não se atentaram para relevância da
sustentabilidade. O cenário não é novo. Danilo Oliveira, Diretor Geral do
Hospital Municipal de Araucária, no Paraná, revela que apesar de muitas
instituições estarem focadas neste tema, ainda não há clareza na implantação de
uma agenda sustentável no âmbito da saúde.
“Ainda
temos dificuldades em enxergar além de nossas fronteiras e olhar além dos
nossos problemas crônicos como: subfinanciamento e falta de mão de obra
qualificada.
Grande
parte de nossos gestores ainda não se atentou de fato para a relevância da
sustentabilidade, e por isso, acaba atuando em ações pontuais ou voltadas
essencialmente para o pilar financeiro”. Discutir este tema em qualquer empresa
pode ser algo muito complicado – por ser abrangente e subjetivo. Por isso,
Danilo Oliveira ressalta que é preciso buscar ações práticas e efetivas.
“O
primeiro passo para que os projetos saiam do papel é que o líder máximo da
entidade esteja comprometido com o tema. Este comprometimento tem de ser
efetivo e não somente no discurso. É necessário envolver as demais lideranças
e, em seguida, iniciar ações que estejam alinhadas com o perfil da entidade e
possíveis de serem realizadas e mensuradas. Muitos líderes acreditam que
trabalhar o tema implica em investimentos, mas há a possibilidade de iniciar
com ações que não exijam grande investimento financeiro ou então buscar
parcerias para viabilizá-las”.
Um dos
principais desafios dentro do âmbito da sustentabilidade é fazer com que os stakeholders
entendam que estes projetos não são puro marketing e sim uma preocupação
real do impacto no negócio e na comunidade. “Gerar consciência envolve educar e
envolver as pessoas.
Este
envolvimento deve ser traduzido em ações e projetos práticos dentro da
entidade. Com esta consciência, as pessoas começam a agir de forma sustentável,
ou seja, preocupadas com o impacto financeiro, social e ambiental de seus
processos”, ressalta Oliveira.
Para
ele, as dificuldades na implantação de uma agenda sustentável são para todos os
portes de empresa. Entretanto, as pequenas e médias, por serem menores, têm
pouca capacidade para realizar investimentos, mas, por outro lado, têm mais
sucesso em sensibilizar sua equipe e seus stakelholders, por terem o
contato mais direto com estes públicos. O que pode ser um grande obstáculo nas
grandes empresas.
EXPERIÊNCIA
DE SUCESSO
O
Hospital Municipal de Araucária tem realizado um trabalho contínuo, passo a
passo, que envolve a educação e mudança de visão das pessoas. “Quando começamos
em 2009, acreditávamos que era necessário fazer algo diferente, pois até então
nossos programas e ações estavam focados na economia de recursos financeiros.
Isto
limitava o entendimento das pessoas, pois o colaborador se perguntava: vou
economizar para o hospital e ganho o que com isso? Na época, tínhamos uma
Comissão de Redução de Custos que atuava nisso, e que atualmente ganhou o nome
de Comissão de Gestão de Custos, atuando mais estrategicamente para utilizar os
recursos de maneira consciente. Para as demais atividades, foi criado o Comitê
de Sustentabilidade. Ou seja, até aquele momento nos preocupávamos exclusivamente
em poupar recursos para a entidade e não para nossa comunidade e para o
planeta.
Este
projeto permitiu que mudássemos nossa visão”, conta. Por exemplo, o hospital
não trabalha com meta de redução de energia somente para economizar valores
financeiros, mas pensando também nos benefícios que esta atitude traz para o
meio ambiente e para a sociedade. “Isso foi possível através de ações simples
como apagar a luz quando não estiver na sala, a substituição gradativa de
lâmpadas fluorescentes por lâmpadas de LED e instalação de sensores de presença
nos vestiários”, conta.
Trabalhar
o tema na área pública pode ser um desafio ainda maior. “Temos uma visão de que
uma entidade pública, falando em especial de um Hospital, precisa tratar da
saúde e da recuperação das pessoas, e isto é traduzido em investir na aquisição
de insumos e recursos diretos que garantam este atendimento ou recuperação.
Isso passa por uma questão de cultura da nossa população e dos nossos gestores
públicos.
É
inusitado, por exemplo, ver um hospital público preocupado com o
reflorestamento ou em reduzir pegada de carbono”, diz. O executivo ressalta que
os padrões de avaliação da qualidade dos serviços de saúde têm começado a se
preocupar com a questão da sustentabilidade e outras questões que o tema trata,
como por exemplo, governança corporativa.
“Nosso
cliente/ usuário também está despertando para isto, no sentido de valorizar os
serviços de saúde preocupados com o assunto”, revela.
A
IMPORTÂNCIA DA EQUIPE
Danilo
Oliveira conta que o primeiro grande passo é começar o movimento de dentro para
fora. “Não adianta, trabalharmos projetos ou ações sustentáveis na comunidade e
nossa equipe não saber do que se trata tal ação. Estas ações têm que estar
alinhadas com o negócio da entidade e com a preocupação de não perder o foco
principal da atividade.
Por
exemplo, se nosso principal perfil de atendimento envolve maternidade, nossas
ações sustentáveis têm de considerar e focar esta área”, explica. Reportar
todas as iniciativas e resultados aos stakeholders também é fundamental.
“Para isto, o mercado tem padrões bem definidos que podem nos auxiliar, como os
indicadores de sustentabilidade padronizados pela ONG holandesa GRI (Global
Reporting Iniciative), adotados por empresas do mundo todo”, diz.
O
Hospital Araucária criou um Comitê de Sustentabilidade, que tem representantes
de diversas áreas, como corpo clínico, enfermagem, direção, entre outras, e é
responsável pela definição dos projetos dentro do hospital. “O comitê está
ligado diretamente ao diretor geral, inclusive com uma cadeira para o mesmo.
Concomitantemente com a estruturação deste comitê, criamos nossa política de
sustentabilidade, alinhados com nosso planejamento estratégico.
Tivemos
o cuidado de definir uma quantidade pequena de projetos, mas que estivessem
alinhadas com nosso perfil de atendimento ou que atendessem demandas de nossos
colaboradores”, explica. O Comitê é responsável por planejar, acompanhar os
projetos e sensibilizar os profissionais.
Para
apoiar o comitê, a instituição criou o setor de Sustentabilidade, que fica
subordinado ao Núcleo de Gestão da Qualidade e é o braço executor do comitê.
“Esta definição hierárquica teve como objetivo demonstrar que a
sustentabilidade deve estar presente em todos os processos de qualidade e não
ser um setor à parte na instituição. Semestralmente divulgamos os projetos para
todas as lideranças e parceiros como fornecedores”.
PROJETOS
IMPLANTADOS
De
acordo com o executivo, cada projeto tem um indicador de efetividade que é
acompanhado mensalmente pelo Comitê.
“Posso
citar um projeto realizado em parceria com a Secretaria Municipal de Meio
Ambiente, chamado Vale Vida, que consiste em entregar uma muda de árvore
nativa para cada criança que nasce em nossa maternidade. Os pais do bebê
recebem junto com a muda um folheto informativo, explicando como plantar e
cuidar da planta. Após um período, fazemos uma busca ativa ligando para a
família a fim de saber se a muda foi plantada e cresceu.
E qual
a relação disso com o nosso negócio? Nossa cidade é um pólo industrial e nosso
perfil epidemiológico é maternidade, seguido da clínica médica, onde o CID de
doenças respiratórias é o segundo em prevalência. Desta forma, estamos
contribuindo para que as crianças da cidade morem em um local arborizado, que
no futuro, poderá reduzir os casos de doenças respiratórias”. Outro projeto
implantado pelo hospital é o de reciclagem de óleo. “Isto foi gerado pela
necessidade que nosso comitê detectou de tratarmos adequadamente o óleo que
sobrava na cozinha do hospital.
Posteriormente,
ampliamos o projeto para os colaboradores, que podem trazer de casa o óleo
usado, recebendo em troca um sabão vegetal, produzido por um parceiro com o
óleo coletado”, explica. Já na área social, a instituição realiza um trabalho
de orientação com adolescentes do município, que aborda assuntos focados em
sexualidade e prevenção de gravidez na adolescência. “No município, há diversos
casos de mãe adolescentes que, muitas vezes, podem gerar um nascimento
prematuro ou parto complicado, aumentando os custos para a cidade e os riscos
para mãe e para a criança”.
Há
ainda projetos em andamento, como o de “emprestar” bicicletas para os
colaboradores irem ao trabalho, visando a melhoria da qualidade de vida; ou a
compra de hortifruti de produtores locais, possibilitando a logística reversa
das sobras de alimentos usados no preparo das refeições, contribuindo para
economia local e reduzindo os resíduos descartados.
“Este
ano aumentamos um pouco nosso escopo de atuação, incluindo um projeto na área
cultural. Isto foi possível através de uma parceria com a Secretaria de
Cultura. Participamos de um projeto de leitura, no qual vários livros são
doados pelos colaboradores e pacientes e ficam expostos em uma estante na
recepção do hospital.
Qualquer
pessoa pode pegar o livro e ler, sendo orientado que devolva após a leitura na
estante do hospital ou em outro ponto espalhado pela cidade, isto com custo
zero para o hospital”, conta. Mais um projeto de destaque é o de alimentação
saudável para os funcionários, em especial os hipertensos e diabéticos, que
fazem refeições balanceadas, acompanhados por nutricionistas. “Quinzenalmente,
às sextas-feiras, os colaboradores da área administrativa e alguns da área
assistencial são liberados 30 minutos antes do final do expediente para
praticar uma caminhada no bosque do hospital”. Todos os projetos são
acompanhados por indicadores, uma vez que a efetividade ou benefício de alguns
destes projetos terão reflexos a médio e longo prazo.
“O
impacto na organização se dá na mudança de hábito da equipe, que conhece os
projetos, vê os resultados e contribui com novas ideias”
Para
iniciar uma agenda sustentável, o diretor do Hospital Araucária, Danilo
Oliveira, sugere que as instituições comecem por passos simples, mas de maneira
focada e alinhada ao negócio.
“Uma
das premissas das empresas globalizadas é ‘pensar globalmente e agir
localmente’, e acredito que isto seja válido também para ações de sustentabilidade.
Não é preciso ficar buscando novas alternativas – que já foram criadas. Temos
hoje entidades sérias, como o movimento dos Hospitais Verdes e Saudáveis,
vinculados à Saúde sem Dano da OMS, que define temas que podem ser trabalhados
na área da saúde, ou ainda aderir ao movimento ‘Hospital Livre de Mercúrio’ ou
o Pacto Global da ONU. Temos que começar, pois toda grande caminhada começa com
um pequeno passo, então, andemos sem demora”, conclui.
Fonte: Adm Prime