Ter e manter um filho


Ter e manter um filho custa caro, segundo reportagens em revistas, jornais, etc. Nelas, há contas, inclusive, que apontam valores que a presença de um filho acrescenta ao orçamento da família. E isso se estende por uns 20 anos, mais ou menos. Ou mais, muitas vezes bem mais.

No mundo do consumo, o valor financeiro das coisas é que está em questão. Por isso, quando alguém planeja ter um filho, considera primeira e antecipadamente o custo financeiro dele para, então, se preparar, se planejar. Ou postergar ou até mesmo desistir.

Quem não conhece mulheres e homens que fazem ou já fizeram um tremendo sacrifício financeiro em nome do filho?

Festas de aniversário com direito a recreacionistas, bufês, lembrancinhas etc.; viagens ao exterior; calçados ou roupas caras porque da moda; brinquedos e traquitanas tecnológicas de última geração; e mais: carro, escola, cursos extracurriculares, altas mesadas, aprendizado de língua estrangeira no exterior etc.

Quase nada disso podemos considerar como absolutamente necessário, mas tudo é, certamente, altamente desejado pelo filho ou pelos anseios dos pais em relação ao filho.

A lista é enorme e não para por aí. Os filhos querem, querem, querem, querem sempre mais. Nunca estão satisfeitos.

E os pais trabalham, trabalham, trabalham cada vez mais para ganhar mais e, assim, tentar satisfazer as necessidades e os caprichos do filho, que quase sempre custam bem caro.

Conheço mães e pais que fizeram financiamentos, parcelaram uma grande quantia de dinheiro em inúmeras prestações, abdicaram de gastos pessoais, tudo para dar ao filho um "book" ou um belo "look".

Há também os que fazem esses gastos para garantir seu próprio sossego. Afinal, a criançada e a moçada aprenderam muito bem como lutar para conseguir o que querem, não é verdade?

Mas, há outros tipos de sacrifício que os pais faziam pelos filhos e eles foram, quase todos, substituídos pelo sacrifício financeiro. Uma cena do filme "Billy Elliot" mostra um desses tipos de sacrifício.

O filme se passa em uma pequena cidade da Inglaterra nos anos 80. O protagonista é um garoto de 11 anos que se apaixona pelo balé, mas seu pai, um trabalhador comprometido com o movimento grevista dos mineiros, não aceita a escolha do filho até o momento em que se dá conta da possibilidade de o garoto ter uma vida melhor que a sua, dedicando-se ao balé.

É nesse momento que ele sacrifica suas convicções --ideológicas e trabalhistas--, deixa de honrar a greve da qual participava ativamente para possibilitar ao filho a busca de seu sonho.

Sim, ter e manter um filho custa caro, mas não vamos considerar agora o custo financeiro da questão. Vamos considerar o custo pessoal.

Ter um filho custa horas de sono e muitas preocupações; custa mudanças de vida temporárias e renúncias; custa a necessidade de disponibilidade pessoal constante; custa abdicar de sonhos e projetos; custa paciência quando ela já se foi, custa perseverança mesmo quando cansados, e muito mais.

É: realmente, ter filho custa bem caro, mas para se ter uma ideia aproximada desse custo, precisamos deixar de priorizar o custo financeiro que o filho acarreta.

O verdadeiro custo, este não pode ser colocado em números porque é pessoal. Mas é certo que esse custo sempre é alto, mesmo quando não reconhecemos isso. 

Rosely Sayão – psicóloga, consultora em educação, é colunista do jornal Folha de São Paulo, autora entre outros do livro “família: modos de usar”.

Fonte: jornal FSP

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