Meu primeiro bolo de aniversário após parar de
beber teve gosto diferente
Levei o doce para
o AA e acreditei que a gente comeria no intervalo da reunião, mas aquele dia
foi diferente
Parei de beber um mês antes do meu
aniversário. Minha família torcia para que eu segurasse a onda dessa vez.
As
primeiras reuniões de AA foram extremamente difíceis, eu estava um caco, mas as
pessoas me ajudaram muito, me acolheram e começaram a me incentivar. Toda vez
que eu chegava, demonstravam alegria: eu tinha voltado, estava conseguindo.
É
difícil fisgar alguém com força, mesmo porque depende muito mais da pessoa do
que do grupo, e o álcool é um adversário desleal.
Dias antes do meu aniversário, minha tia me ligou e
disse que ia fazer um bolo para eu comemorar com minhas amigas. Agradeci com
lágrimas nos olhos, mas pensei: que amigas? Não que eu não as tivesse,
mas elas haviam se afastado de mim e meu
estado não permitia procurá-las.
Aliás, comemorar o quê? Meu corpo todo doía,
minha cabeça só computava eventos ruins na minha vida.
Foi quando pensei: Ué, por que não levar o bolo
para o AA e comemorar com eles? Afinal, nas últimas semanas todos eles eram
meus amigos.
Me ligavam para saber se eu estava bem, me acompanhavam até a
reunião quando eu não estava em condições. Era isso, o destino do bolo já
estava traçado.
Minha tia me trouxe o bolo e me disse para
comemorar bastante porque eu estava entrando numa nova fase.
Agradeci e olhei
para aquele bolo lindo, recoberto de um creme branco, com uns morangos lindos,
uma obra-prima. Quando entrei na sala com aquele bolo, todo mundo veio me
abraçar e elogiaram muito o bolo.
Acreditei que, como das outras vezes, a gente comeria
normalmente no intervalo da reunião. Mas foi diferente.
Assim que o sino tocou para o intervalo, fui ao
banheiro e na volta apagaram as luzes, acenderam velas e cantaram parabéns.
Olhei para todas aquelas pessoas e chorei horrores, me emocionei mesmo.
Primeiro porque eu estava no meio de uma grande comemoração pela minha vida.
Aquela que eu tanto havia desdenhado. Claro que o alcoolismo não é minha culpa,
mas a depressão me conduzia a um desânimo que
não permitia nenhum sentido.
Além disso, apesar daquele bolo maravilhoso, não
tive nenhuma comemoração familiar. Ainda estavam desacreditados de mim e não
fizeram nada mais do que mandar mensagem ou dar um telefone.
Mas naquela sala tive uma sensação de vida, de
esperança... Mesmo porque no dia em que dei meu primeiro depoimento, disse que
eu estava querendo renascer.
Um mês depois, aquela festa me levou a crer que eu
estava certa. Que um novo recomeço era possível. Ninguém sabia o que eu tinha
feito, as dores que eu tinha causado e mesmo assim me acolheram como ninguém.
Talvez porque quando chegaram ali, ninguém lhes perguntou nada. Apenas
disseram: se você tem problema com bebida, você está no lugar certo.
No dia seguinte, minha tia me ligou perguntando se
eu tinha gostado do bolo. Disse que sim, que nunca tinha experimentado algo tão
gostoso e que minhas amigas também adoraram.
É verdade, o gosto daquele aniversário, com aquele
bolo delicioso, foi mais um passo para me assegurar de que estava no caminho
certo. Do bolo não sobrou migalha. Cada pedaço foi dividido com todo o amor que
eu estava sentindo naquele dia. Grande e inesquecível aniversário.
ALICE
S. –
blog Vida de Alcoólatra