Saiba como aproveitar o declínio da indústria financeira tradicional
 

Há vinte anos, o setor mais representativo no Ibovespa – principal índice de ações brasileiro – era o de telecomunicações. Uma década depois, a primazia foi substituída pelo segmento das empresas de commodities. Atualmente, o setor bancário domina a participação do indexador. Mas esta dominância pode estar com os dias contados.

A evolução dos pesos das dez principais ações do Ibovespa, ao longo das últimas duas décadas, pode ser vista na tabela abaixo com dados do sistema de informações ComDinheiro.




Evolução dos pesos das dez maiores participações no Ibovespa nas últimas duas décadas. Fonte: ComDinheiro.

 

A perspectiva de perda de posto será provocada pela intensa competição que deve ocorrer no setor nos próximos anos. Esta competição vem pela pressão dos reguladores e pelo avanço da tecnologia.

  • Como chegamos até aqui?

Com o intuito de sustentar a estabilização econômica e segurança do sistema financeiro, após o plano real, os reguladores acabaram por promover a concentração do sistema.

Um volume de 35 instituições financeiras quebrou desde a criação do FGC em meados da década de 1990. Mas quase metade decretaram falência antes do ano 2000.

O sistema financeiro estava fragilizado e, para a segurança, foi importante o desenvolvimento de instituições sólidas e maiores a partir de fusões.

No entanto, o feitiço virou contra o feiticeiro.

Hoje, a alta concentração possibilita a cobrança de taxas e juros elevados e, mesmo atuando de forma menos eficiente, ainda assim, terem retornos bem acima da média do mercado.

Mas algumas mudanças devem levar os grandes bancos a perderem parte de suas receitas nos próximos anos.

  • Por que os grandes bancos devem perder receita?

Os reguladores estão promovendo iniciativas para elevação da competição e redução dos spreads bancários. Adicionalmente, a tecnologia está permitindo a entrada de forma mais rápida, barata e simples de novos competidores.

Como ressalta Carlos Daltozo, Chefe de Renda Variável da Eleven Financial:

“O primeiro mercado a sentir as consequências dessa revolução foi a indústria de meios de pagamento. A enorme barreira de entrada existente até alguns anos atrás, com os bancos, principais emissores de cartões e donos das maiores adquirentes do país, presos em contratos de exclusividade, ruiu.”

Para redução dos spreads bancários, é possível citar a iniciativa do Open Banking. Esta resolução tira dos bancos a propriedade sobre o histórico dos clientes, passando para estes últimos. Sua implementação vai agilizar o crescimento dos novos bancos no mercado de crédito e reduzir os altos spreads cobrados.

Como somente os grandes bancos possuem o histórico dos clientes, eles têm melhor capacidade de dar crédito. Quando a informação deixa de ser sua propriedade, as fintechs podem cobrar juros menores de novos clientes, pois terão acesso ao seu histórico.

Até abril de 2016 os grandes bancos, com redes de agências espalhadas pelo país, tinham uma grande vantagem sobre os outros. Para uma pessoa abrir uma conta era necessário que ela fosse a uma agência. Desde então, foi permitida às instituições financeiras abrirem contas de forma digital.

Esta liberação, retirou a vantagem dos grandes bancos por sua capilaridade de agências.

Por exemplo, nos últimos dois anos, encerrados em junho de 2019, o Banco Itaú, maior banco privado da América Latina, abriu cerca de dois milhões de contas digitais. O Banco Inter, conseguiu em apenas um ano o mesmo número de novos clientes.

O fato de o Itaú e outros grandes bancos não incentivarem a criação de contas digitais é explicado pela gratuidades desta modalidade. Portanto, se eles promovessem a abertura de contas digitais, eles estariam canibalizando uma importante fonte de resultados que são os pacotes de serviços bancários.

No entanto, a perda de clientes com a entrada dos novos bancos digitais deve mudar o comportamento dos grandes bancos. E a cada dia mais competidores chegam ao mercado. Dentre eles, podemos citar: Nubank, Inter, Original, Agibank, BMG, C6, Neon e Uzzo.

Open Banking e o banco digital são dois exemplos de iniciativas que tiram dos grandes bancos suas vantagens competitiva e os deixa apenas com os grande custos de sua pesada estrutura. Mas há ainda outra perda advinda da fonte de recursos baratos dos clientes.

Os grandes bancos possuem uma vantagem nas suas margens financeiras pela fonte barata de recursos dos clientes. Os depósitos em conta corrente ou CDBs de baixa remuneração dos grandes bancos proporcionam boas margens a estes.

  • Quais vantagens os novos entrantes oferecem?

As novas instituições permitem que os clientes possuam acesso a serviços de melhor qualidade e de forma gratuita ou mais barata.

Todas os bancos citados acima permitem que clientes possuam contas correntes com cartão de débito e crédito para pagamentos, saques e transferências sem custos e sem exigências de contrapartidas como a compra de títulos de capitalização ou manutenção de investimentos.

Alguns deles disponibilizam de forma bem mais acessível inclusive a cartões de créditos exclusivos aos clientes de alta renda como os famosos Cartões Black e Infinity.

Outras instituições focaram no segmento de investimentos, como: XP, Órama, Easyinvest, Genial, BTG e Guide. Estas possibilitam que clientes atendidos pelo varejo dos bancos tenham acesso a produtos antes exclusivos aos clientes da modalidade alta renda dos grandes bancos.

Se seu banco exige reciprocidades como a compra de produtos de baixo retorno ou manutenção de investimentos desfavoráveis, experimente algumas das instituições acima para investimentos e transações bancárias.

  • O que pode ocorrer com as ações dos grandes bancos?

Daltozo alerta que:

“Em um futuro próximo, a rentabilidade dos grandes bancos de varejo deve convergir para algo próximo a 15%, mais perto dos padrões internacionais.”

A queda dos resultados já está sendo sentida. O resultado dos bancos Itaú e Bradesco no último trimestre decepcionou investidores e suas ações tiveram fortes quedas.

As ações de grandes bancos tiveram sucesso no passado, mas o mesmo não deve se repetir. Nos últimos 24 meses, as ações dos grandes bancos tiveram maior volatilidade e apresentaram retorno similar ao do Ibovespa, mesmo quando considerado os altos dividendos pagos por elas.

Portanto, quem simplesmente investiu no índice correu menos risco e teve o mesmo retorno. Vários fundos de ações diversificados conseguiram inclusive superar o índice.



Evolução de R$100 aplicados nos últimos 24 meses nos principais bancos e no Ibovespa. Fonte: ComDinheiro.

 

Outra razão que os investidores procuram nas ações dos bancos são os elevados dividendos. A tabela abaixo, produzida com dados do sistema ComDinheiro mostra como o ganho de dividendos de alguns bancos evoluiu nos últimos três anos.

O ganho de dividendos, ou dividend yield, pode ser calculado dividindo o valor que acionistas receberam em proventos no período pelo preço da ação.



Evolução das taxas de dividendos dos bancos. Fonte: ComDinheiro.

 

Os dividendos foram elevados, mas a necessidade de utilizar recursos para sustentar o crescimento do crédito e a queda de rentabilidade projetafa devem reduzir este dividend yield no futuro.

Alguns investidores já percebendo as mudanças começaram a comprar as ações dos bancos digitais. O banco Inter e o Banco Pan foram os preferidos no curto prazo (ver gráfico abaixo).



Evolução de R$100 aplicados nos últimos 13 meses em alguns bancos tradicionais (Itaú, Bradesco e Banco do Brasil) e digitais (Inter e Pan). Fonte: ComDinheiro.

 

No entanto, os preços das ações dos bancos médios já precifica um crescimento significativo, que pode não ocorrer devido à entrada de novos competidores.

Segundo o ComDinheiro, com data do dia 16/08, o Banco Inter possui um múltiplo Preço / Lucro superior a 100. Isto significa que se todo o lucro fosse distribuído em dividendos, levaria 100 anos para um investidor ter seu dinheiro de volta. Parece muito tempo para qualquer investimento.

Portanto, a melhor forma do investidor aproveitar o declínio do setor bancário tradicional é com a utilização dos serviços de investimentos e de conta corrente dos novos entrantes, mas não com a compra de ações dos antigos ou com as dos novos bancos.

Michael Viriato - professor de finanças do Insper e sócio fundador da Casa do Investidor.

Fonte: coluna jornal FSP




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