Zumbis do intestino chegam ao cérebro, o que pode explicar o parkinson


Doença pode ser causada por proteínas deformadas no intestino, dizem cientistas

 

Não, não há um “segundo cérebro” no intestino. Cérebros são aglomerações de tantos neurônios que eles começam a dividir tarefas e formam estruturas distintas com funções coordenadas, mas diferentes. O que temos no intestino é um número bastante impressionante de neurônios —entre 200 e 600 milhões, tantos quanto o córtex cerebral de um gato ou cachorro— espalhados em uma malha que abraça toda a tubulação, como uma meia de compressão.

Por outro lado, o intestino humano tem nove metros de comprimento, enquanto um cérebro de gato cabe na cabeça de um gato. Considerando que os neurônios no intestino dão conta dos movimentos peristálticos que garantem que o que entra pela sua boca deixa seu corpo antes de apodrecer (nojento, eu sei, e, no entanto, exato e imprescindível, sob pena de morte certa), não é surpreendente que um intestino longo como o nosso tenha tantos neurônios.


Cultura de bactérias fecais –

 

Também não é surpresa que essas duas partes do sistema nervoso se falam. O microbioma intestinal anda badalado, transplantes fecais salvam vidas sem chocar mais ninguém (bom, quase), o número de estudos comprovando que estados mental e intestinal são relacionados só faz aumentar.

A pesquisa básica contribui os pedaços que a clínica depois costura: a inervação do intestino pelo sistema visceral mantém o tubo antenado com o cérebro, e os sinais que o nervo vago recolhe informam o cérebro sobre o estado atual do trânsito intestinal.

O que talvez surpreenda é que doenças do cérebro podem vir do intestino. Um grupo na Universidade Johns Hopkins, nos EUA, acaba de testar e comprovar a suspeita do neuroanatomista alemão Heiko Braak de que a doença de Parkinson —cujo sinal característico é a degeneração de neurônios dopaminérgicos no cérebro, que causa um entrevamento de corpo e mente— pode ser causada por acúmulo de proteínas deformadas no intestino.

Já era sabido que a versão deformada da alfa-sinucleina, proteína natural do cérebro, se espalha ao interagir com a versão normal, transformando moléculas saudáveis em zumbis autopropagáveis. As moléculas-zumbis causam a morte de alguns tipos de neurônios, mas não antes de pularem para neurônios conectados, o que espalha a doença.

Liderado pelo coreano Han Seok Ko, o grupo em Johns Hopkins injetou sinucleina alterada no intestino de camundongos saudáveis, e constatou a progressão paulatina da doença pelo nervo vago até o cérebro, pulando de neurônio em neurônio, até a morte dos neurônios dopaminérgicos.

A boa notícia? Agora é “só” descobrir como os primeiros zumbis aparecem...

Suzana Herculano-Houzel - bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

Fonte: coluna jornal FSP

 



Tel: 11 5044-4774/11 5531-2118 | suporte@suporteconsult.com.br