A importância da ciência básica


São as perguntas fundamentais que acionam o motor da ciência.

 

Michael Faraday não titubeou quando o ministro das Finanças lhe perguntou sobre a aplicação de sua pesquisa sobre eletricidade. “Um dia o senhor poderá cobrar por ela.”

Até então, em pleno século 19, para o grande público, a eletricidade não passava de uma curiosidade capaz de deixar em pé o cabelo das moças ou assustar os incautos com um show de fagulhas. A resposta do físico e químico inglês não poderia ser mais profética.

É claro que o objetivo dele não era locupletar os cofres ingleses. O que o movia e a seus pares era a vontade de desvelar os mistérios da natureza. Ao longo desse processo, descobriram uma regra universal para descrever os fenômenos elétricos e magnéticos. Tudo porque alguém viu uma faísca e se perguntou: como assim? São as perguntas fundamentais que acionam o motor da ciência.

A história da “enigmática” mecânica quântica revela a importância da ciência básica. A teoria quântica foi a solução encontrada quando, na virada do século passado, os cientistas se confrontaram com o comportamento aparentemente paradoxal do mundo do muito pequeno.

Átomos e seus constituintes como prótons e elétrons não se comportam como somos levados a crer por nossas experiências corriqueiras. Se usamos a intuição e as leis que regem o mundo visível, acabamos por acreditar que um elétron pode estar em dois lugares ao mesmo tempo, entre outras bizarrices.

Mais uma vez, a pergunta foi simples: por quê? E da resposta nasceram aplicações que geram até 30% do produto interno de países desenvolvidos. Sem a quântica, não haveria computadores, lasers, energia nuclear ou células solares.

​E isso é foi só o começo.

Em meados da década de 1980, cientistas começaram a se perguntar o que aconteceria se o próprio processamento da informação se tornasse quântico. Dessas divagações nasceu o campo da computação e informação quântica, sua segunda revolução.

Há 20 anos, quando ouvi falar disso, um computador quântico parecia ficção. Mas o ano passado, bem antes do esperado, o Google mostrou ao mundo um suposto computador quântico que seria capaz de cálculos que o maior supercomputador demoraria anos para realizar (vale dizer que a IBM contestou o sucesso do Google).


Promessas dessa nova área são inúmeras, desde modelagem molecular e descobertas de materiais e drogas até formas mais eficientes e seguras de se comunicar.

Na criptografia quântica, por exemplo, a menos que um hacker possa quebrar as leis da física, das duas uma: ele não conseguirá obter nenhuma informação ou, caso consiga, será imediatamente detectado.

Descoberta em meados da década de 1980, a criptografia quântica já é usada para garantir a segurança das eleições suíças desde 2007 e por bancos ao redor do mundo.

O caminho dos computadores quânticos, da criptografia quântica e de muitas outras descobertas ainda é longo e precisa do suporte da sociedade para seguir adiante. Sobretudo num momento como o que vivemos, em que o negacionismo científico, notícias falsas e desmonte da ciência brasileira parecem ser um projeto de governo.

Se pensarmos que há pouco mais de um século a varíola matava multidões e só tínhamos velas a nos iluminar, acredito não haver dúvidas do que devemos apoiar.

Rafael Chaves -líder do grupo de pesquisa em informação quântica do Instituto Internacional de Física (IIP-UFRN) em Natal.

Fonte: coluna jornal FSP

 

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