Publicado em 22 de maio de 2019 por Site
Nos últimos 18 anos, a taxa de inflação acumulada dos planos de saúde individuais e familiares foi de 382%, superando em muito a inflação geral acumulada pelo IPCA, de 208%, e a do setor de saúde, de 180%. Esta é a conclusão do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que critica, em nota técnica a ser apresentada hoje, a atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) na definição do teto de reajuste dos planos. A ANS afirma que as comparações do Ipea “não são adequadas”.
“É de se esperar que a inflação dos setores de serviços, como saúde, seja maior que a geral, mas, no Brasil, constatamos um abuso de preços, sobretudo a partir de 2006”, afirma um dos responsáveis pelo estudo, o economista do Ipea Carlos Ocké-Reis. Ele avalia que a discrepância entre os reajustes dos planos e as taxas de inflação geral e setorial se deve à falta de regulação dos planos coletivos, que praticam preços livres, cuja média foi usada pela ANS até o ano passado como fator principal da fórmula do reajuste de planos individuais e familiares. Ocké-Reis frisa o que chama de “captura da ANS pelas operadoras”. “Fica claro que a ANS não foi capaz de regular a inflação dos planos de saúde”, afirma o estudo.
A ANS alegou, em nota, que “não é adequada a comparação entre o índice teto de reajuste dos planos de saúde e índices de preços, sejam eles gerais, como o IPCA, ou específicos”. Segundo a agência, as despesas das operadoras não variam somente em função das alterações no preço dos procedimentos, mas também pelas alterações na quantidade e tipos de serviços utilizados. A ANS argumenta que, entre 2014 e 2017, “ocorreu aumento no número médio de procedimentos realizados por beneficiário, o que impactou os custos setoriais”.
Segundo o Ipea, a alta de preços dos bens e serviços de saúde ofertados ao consumidor é o que tem impacto nas despesas das operadoras. Nos 18 anos pesquisados, afirma o instituto, o crescimento médio anual da inflação dos planos foi de 8,71%, enquanto o da inflação geral foi de 5,96%, e a do setor saúde, de 5,51%. Esses reajustes definem os preços de 9 milhões de planos individuais e familiares existentes no país, segundo dados de fevereiro da ANS. A agência aprovou, em dezembro, um novo método de cálculo para o reajuste das mensalidades de planos individuais e coletivos, tradicionalmente anunciado em maio e implementado na data de aniversário dos contratos. O novo modelo combina o chamado Índice de Valor das Despesas Assistenciais (IVDA), que reflete a variação das despesas dos planos com os beneficiários, com o IPCA, retirando-se deste último o item Plano de Saúde. Na fórmula, a IVDA tem peso de 80% e o IPCA, de 20%.
Mas a nota técnica do Ipea sugere que a nova metodologia “seja discutida com a sociedade para que o novo Índice de Reajuste dos Planos Individuais (IRPI) não seja objeto de indesejável judicialização em futuro próximo”. Ocké-Reis afirma que não foi realizada, publicamente, uma aplicação retroativa da nova fórmula que comprove sua capacidade de refrear o teto do reajuste.
No ano passado, o aumento chegou a ser suspenso pela Justiça, após ação do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) baseada em relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), que apontava duplo cômputo de fatores na antiga metodologia. Os pesquisadores do Ipea também dizem que, com a exclusão dos preços dos planos coletivos como base do novo cálculo, a ANS deixa de monitorar a categoria que conta com o maior número de clientes: 31,7 milhões de pessoas dos 47,1 milhões clientes de planos no país. O Ipea propõe, além do uso do IPCA saúde como parâmetro, a criação de um índice de preços sobre a produção dos serviços médico-hospitalares (Producer Price Index) e, a exemplo dos Estados Unidos, a instituição de outro índice capaz de medir a variação das despesas das operadoras com consultas, exames, internações e procedimentos (Medical Care Expenditure Price Index).
A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) afirma que a situação não é anormal e citou levantamento do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), segundo o qual o país tem variação de Custo Médico-Hospitalar (VCMH) 3,4 vezes maior que a inflação oficial, valor próximo ao dos EUA (3,7) e abaixo de países como Canadá (4,7) e Grécia (6,3).
Fonte: Valor Econômico