Vem em
boa hora a iniciativa do Conselho da Justiça Federal, em parceria com o
Superior Tribunal de Justiça (STJ), de promover a I Jornada sobre Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígios, nos próximos dias 22 e 23 de agosto,
inaugurando nessa temática a prática já adotada com sucesso das jornadas nas
áreas de Direito Civil e Direito Comercial.
A
Comissão Científica da Jornada, sob a coordenação-geral do Ministro Luís Felipe
Salomão, do STJ, foi dividida em três grupos de trabalho:Mediação, sob a coordenação
do professor Kazuo Watanabe; Arbitragem, a cargo do Ministro Antônio Carlos
Ferreira, do STJ; e Outras Formas de Solução, dirigida pelo professor Joaquim
Falcão.
De
acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil tem atualmente mais
de cem milhões de processos em tramitação.
O
ensino jurídico no Brasil ainda está calcado no litígio e na cultura
adversarial, em que os profissionais do Direito tornam-se capacitados apenas
para o enfrentamento e para o contencioso judicial.
Nosso
país também causa perplexidade na comunidade jurídica internacional pelos mais
de 1.200 cursos jurídicos em funcionamento e por haver cerca de um milhão de
advogados.
A
cultura do contencioso gera ônus para a sociedade e para o Poder Judiciário,
seja pela demora e queda de qualidade na prestação jurisdicional, seja pelos
custos que recaem sobre o orçamento público. A busca de meios mais adequados
(uns diriam “alternativos”) de solução de conflitos é um fenômeno mundial. Como
bem lembrou John Roberts, presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos, ao
prestar contas sobre o Ano Judiciário naquele país, o crescimento de demandas
judiciais tem se revelado incompatível com a escassez de recursos públicos
orçamentários do mundo atual, daí mais uma razão para a adoção de outros meios
de solução de controvérsias.
Há no
universo jurídico diversas iniciativas que procuram superar a velha cultura do
contencioso judicial, hoje improdutivo, acenando para um sistema “multiportas”
de resolução de conflitos, por meio da prevenção, negociação, mediação e
arbitragem. Nessa concepção, o Judiciário deve ser visto como o último remédio,
e não o primeiro, para o equacionamento de embates civis e comerciais.
O
próprio CNJ editou a Resolução 125, de 2010, que estabelece que “cabe ao
Judiciário estabelecer política pública de tratamento adequado dos problemas
jurídicos e dos conflitos de interesses, que ocorrem em larga e crescente
escala na sociedade, de forma a organizar, em âmbito nacional, não somente os
serviços prestados nos processos judiciais, como também os que possam sê-lo
mediante outros mecanismos de solução de conflitos, em especial os consensuais,
como a mediação e a conciliação”.
Como
desdobramento de tal diretiva, existem atualmente as mais diversas iniciativas,
levadas a cabo por lideranças do Judiciário e de seus servidores, que
desenvolvem projetos em favor da mediação e da conciliação. Dentre outros, vale
destacar os programas de conciliação conduzidos pelo Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul em temas do direito do consumidor e de superendividamento, os
trabalhos desenvolvidos em Fóruns Regionais da cidade de São Paulo na área de
conflitos de gênero e de famílias, assim como as atividades dos Núcleos
Permanentes de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos dos Tribunais de
Justiça, como o do Rio de Janeiro, em matérias de contratos bancários, planos
de saúde e relações com concessionárias de serviços elétricos e de telefonia.
Com a
Lei 13.140, de 2015, criou-se o marco legal da mediação, a partir do
anteprojeto de uma comissão de juristas do Senado Federal, dispondo sobre a
mediação judicial e, em especial, a extrajudicial, esta última mais vocacionada
para conflitos empresariais.
Na
esteira da Lei da Mediação, entrou recentemente em vigor o novo Código de
Processo Civil (Lei 13.105, de 2015), que estabelece, em suas “Normas
Fundamentais do Processo Civil”, que “a conciliação, a mediação e outros
métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes,
advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no
curso do processo judicial” (art. 3º, parágrafo 3º).
Em
harmonia com essa “norma fundamental”, o novo CPC prevê, em inúmeros dispositivos,
mecanismos de estímulo à autocomposição, valendo destacar a audiência prévia de
conciliação ou mediação (arts. 334 e seguintes).
A
arbitragem, graças a uma legislação moderna e surpreendentemente simples (Lei
9.307, de 1996, aprimorada pela Lei 13.129, de 2015) e aos formidáveis avanços
da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tornou-se uma grande
referência não apenas no meio empresarial brasileiro, mas também no ambiente de
comércio internacional.
Em tal
contexto, cabe à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em seus indispensáveis
exames de seleção, adaptar-se aos novos tempos e exigir dos candidatos à
advocacia não apenas a redação de petições ao Estado-Juiz, mas também a
elaboração de contratos e de termos de acordo, assim como a demonstração de
habilidades de negociação e mediação.
Nessa
linha evolutiva, os debates travados durante essa I Jornada sobre Prevenção e
Solução Extrajudicial de Litígio, contando com juristas, magistrados, membros
do Ministério Público, professores e estudantes, vão certamente produzir alguns
consensos doutrinários sobre esses importantes temas, acenar para a formulação
de políticas públicas e colaborar para a construção de uma nova cultura
jurídica”.
Adacir
Reis - Sócio do escritório Reis, Tôrres, Florêncio, Corrêa e
Oliveira Advocacia; presidente do Instituto San Tiago Dantas de Direito e
Economia, tendo sido membro da Comissão de Juristas do Senado Federal para a
Reforma da Lei de Arbitragem e Mediação:
Fonte: Diário ABRAPP