O MERCADO GRISALHO


Graças à valorização dos imóveis e à generosidade das aposentadorias, hoje os consumidores mais velhos são os mais endinheirados

Nos idos dos anos 1960, Diana Vreeland, então editora­chefe da revista Vogue, usava a expressão “tremor jovem” para se referir ao impacto cultural desestabilizador dos chamados baby­boomers (pessoas nascidas logo após o fim da 2.ª Guerra, quando por algum tempo houve pronunciada alta na taxa de natalidade dos países ocidentais).

Agora o mundo desenvolvido vive as etapas iniciais de um “tremor grisalho”. Os indivíduos com mais de 60 anos formam o grupo que mais cresce na população dos países ricos, devendo ter expansão de mais de um terço até 2030, quando passarão dos atuais 164 milhões para 222 milhões. Graças à valorização dos imóveis e à generosidade das aposentadorias, hoje os consumidores mais velhos são os mais endinheirados.

Os gastos anuais dos sessentões somam US$ 4 trilhões, e a cifra só fará aumentar. Apesar disso, as empresas não têm sido suficientemente ágeis para aproveitar essa oportunidade, ao contrário do que aconteceu quando se viram diante do “tremor jovem”. O Boston Consulting Group (BCG) calcula que menos de 15% das empresas têm estratégias voltadas para indivíduos idosos.

Pesquisa da Economist Intelligence Unit, do mesmo grupo que controla a revista The Economist, mostra que só 31% das empresas levam em conta o aumento da expectativa de vida ao traçar planos de vendas e marketing. Um dos motivos de tal letargia é o fato de os departamentos de marketing serem dominados por jovens, para os quais o melhor que os velhos têm a fazer é sair de cena e parar de inventar moda.

Como de hábito, a feminista Germaine Greer fala por sua geração quando diz que “só porque eu tenho mais de 60 anos ninguém quer vender nada para mim”. Estudo realizado conjuntamente pela agência fast.Map e pela consultoria Involve Millennium revela que 68% dos britânicos de 65 a 74 anos “não se identificam” com os anúncios que veem na televisão. Mas o fator determinante é que os idosos são consumidores difíceis. A definição do que significa ser “velho” é complexa e dinâmica. Entre um sujeito de 65 anos e outro de 85, a distância é grande. Além disso, a idade não pesa do mesmo jeito para todo mundo: em alguns, a marca dos anos logo se manifesta; em outros, os anos parecem não passar.

 

Entre os aposentados de hoje, as divisões de classe são mais evidentes que em gerações anteriores: os vencedores, instalados em mansões de localização privilegiada, desfrutando de planos de previdência de benefício definido, não conseguem gastar o dinheiro que têm, ao passo que os perdedores vivem de chapéu na mão e só podem contar com o apoio de instituições de caridade (nos EUA, segundo o Federal Reserve, 31% da população economicamente ativa não tem plano de previdência nem poupança).

A maioria dos baby­boomers grisalhos dos países ricos reluta em aceitar a velhice: 61% deles dizem ter a sensação de serem nove anos mais novos do que indica sua idade cronológica. Tratar os consumidores da terceira idade como velhos é receita certa para o fracasso.

Quando a Procter & Gamble acrescentou à embalagem de alguns de seus produtos dentais a informação de que eles haviam sido “elaborados especialmente para pessoas acima de 50 anos”, as vendas despencaram. Por outro lado, há um cheiro de mudança no ar. Alguns segmentos, como o de saúde e o automotivo, vêm estudando há algum tempo o mercado da terceira idade. Outros, como os setores de varejo e bens de consumo, recentemente começaram a prestar mais atenção nos idosos. Vem aí a onda grisalha.

 

Estudo conduzido pelo McKinsey Global Institute (MGI) aponta que um dos poucos motores de crescimento na atualmente empacada economia mundial são os consumidores mais velhos. O boom dos mercados emergentes vem perdendo força em alguns países, notadamente a China; em outros, notadamente o Brasil, já deu lugar à recessão. Pelos cálculos do MGI, os aposentados dos países desenvolvidos gastam, em média, US$ 39 mil em bens e serviços. Já no grupo formado por indivíduos que têm entre 30 e 44 anos, esses gastos caem para US$ 29,5 mil. Os velhinhos estão com a corda toda.

Algumas empresas querem entender melhor os idosos. A Kimberley­ Clark construiu um modelo experimental de loja do futuro, com as adequações que provavelmente serão feitas para atender melhor os idosos. A Ford criou o “macacão da terceira idade”, que os projetistas da montadora vestem para tomar consciência das necessidades das pessoas mais velhas: com uma cintura mais grossa e juntas mais rígidas, o traje dificulta os movimentos. Luvas grossas reduzem a sensibilidade do tato e óculos com lentes amarelas reproduzem a visão de alguém que sofre de catarata.

 

Estudo sobre idosos do BCG indica que na terceira idade as pessoas se interessam menos por posses materiais do que por adquirir experiência, em particular por meio de viagens e estudos. Com um entendimento aprimorado sobre o mercado grisalho, surgem novos produtos e modelos de negócios. A operadora de telefonia japonesa NTT DoCoMo não só criou um celular com teclas maiores e tela gigante, como reformulou seu marketing, passando a fazer propaganda de aparelhos novos em excursões de ônibus para aposentados e oferecendo aulas em suas lojas para explicar como funcionam os aplicativos.

 

Os fabricantes de eletrônicos têm produzido dispositivos desenvolvidos especificamente para idosos: a Independa, por exemplo, comercializa um sistema de monitoramento residencial que envia alertas quando alguma anormalidade é detectada, permitindo que velhos debilitados permaneçam em suas próprias casas e sejam poupados da transferência para um asilo. As empresas também vêm se aperfeiçoando na arte da discrição, veiculando mensagens destinadas a pessoas mais velhas, mas não de forma demasiado explícita.

Disfarçadamente, os varejistas diminuíram a altura das prateleiras e passaram a cobrir o piso de suas lojas com carpetes para evitar escorregões. As embalagens agora vêm com letras maiores e mais fundo branco. A Kimberley­ Clark submeteu a grande reformulação sua linha de fraldas geriátricas Depend, a fim de tornar o produto mais parecido com uma roupa de baixo comum. O escritório de design Sabi criou uma linha de bengalas coloridas. As montadoras de automóveis não alardeiam o fato de que velhos de pescoço duro e vista prejudicada serão os maiores beneficiários dos carros capazes de estacionar por conta própria. 

 

Aposentadoria

Todavia, esses são apenas os primeiros estágios de uma revolução. Os baby­boomers passaram a vida inteira fazendo barulho e chamando atenção. Não vai ser agora que vão parar. Eles formarão o maior e mais abastado contingente de aposentados da história. Também serão os de vida mais longa: muitos passarão mais anos curtindo a aposentadoria do que trabalhando. Desde seus anos de adolescência, os babyboomers transformam tudo que tocam, deixando atrás de si um rastro de invenções, da cultura pop às famílias com dois pais que trabalham fora. A aposentadoria é a próxima da lista.

 

© 2016 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. TRADUZIDO POR ALEXANDRE HUBNER, PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

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