Oscilação negativa nos preços dos
títulos privados desconforta investidores.
Os
investidores conservadores que buscam refúgio na suposta segurança das
aplicações de renda fixa estão aprendendo, na prática, que riscos existem e
podem impactar suas aplicações.
Recentemente
dois eventos distintos desvalorizaram o valor de títulos privados, um
relacionado ao risco de crédito, e outro, ao risco de mercado.
O
pedido de recuperação judicial da Rodovias do Tietê
tirou o sono de quem investiu em RDVT11, código do título em questão, atraídos
pela generosa taxa de juros e, também, pela isenção do Imposto de Renda, por se
tratar de debênture de infraestrutura.
Trecho da rodovia Marechal Rondon (SP-300), na cidade de
Tietê; estrada é administrada pela Rodovias do Tietê, que pediu recuperação
judicial
Nem cogitaram abrir e ler o prospecto de 1.500 páginas com os detalhes da
transação. Só o tamanho do documento deixa claro que não se trata de uma
aplicação corriqueira, para amadores, mas as evidências foram ignoradas.
Diante da recuperação judicial e da incerteza em relação ao futuro da empresa e
do desfecho do processo, o título foi precificado a zero na carteira dos fundos
que possuem esse ativo. Esse é o procedimento de marcação a mercado, que obriga
os gestores de carteira a atribuir aos ativos dos fundos de investimento o
valor de mercado de cada um deles.
Garantia
do Fundo Garantidor de Créditos? Não nesse caso; o FGC protege somente títulos
de crédito emitido por instituições financeiras. Para tentar recuperar o
capital, o investidor que comprou o título diretamente precisa de paciência e
sorte. Ele entra na fila dos credores e só tem preferência em relação aos donos
da empresa.
Outro
risco que incomodou investidores foi o de mercado, caracterizado pela flutuação
no preço dos ativos. Em outubro e novembro, os gestores ajustaram para baixo o
valor de mercado de títulos privados, a maior parte incentivada.
Quando
aumenta o percentual do CDI exigido pelos investidores dispostos a correr o
risco de crédito do emissor, consequentemente, cai o valor do ativo. Títulos
que foram comprados a 94% do CDI, por exemplo, foram precificados a 104% do
CDI. A única maneira de aumentar a rentabilidade do título para o novo
comprador é reduzir o preço.
Diversos fatores contribuíram para o aumento da rentabilidade exigida, entre os
quais podemos destacar a queda da taxa do CDI, que reduz o premio absoluto do
investidor, e a venda antecipada de lotes importantes, pressionando a oferta no
mercado secundário desses títulos.
Esse
ajuste foi refletido no IDA (Índice de Debêntures Anbima), que teve resultado
negativo em novembro. IDA-IPCA Infraestrutura, formado por debêntures
incentivadas, teve o recuo mais importante, de 2,07%. O IDA-Geral, que espelha
o comportamento de todas as debêntures, caiu 0,65%.
Como
os investidores foram impactados na prática? Quando o gestor da carteira de
fundos de investimento contabiliza corretamente o novo valor de mercado dos
títulos, cai o valor da cota. Em compensação, um fundo que pagava 110% do CDI,
por exemplo, passa a pagar 115,0% do CDI e, salvo outro evento, a
desvalorização tende a ser recuperada nos próximos meses.
Quem
se assusta e resgata as cotas realiza a perda. Se o montante dos saques for
elevado, o gestor será obrigado a vender ativos, e a perda, irreversível. Se
você é cotista de um fundo que passou ou passa por esse ajuste de preço,
procure ouvir o gestor para entender o que causou a desvalorização e quais são
as perspectivas de recuperação.
O
valor dos ativos comprados individualmente também foi afetado, mas, como eles
não são marcados a mercados, a desvalorização só será percebida quando e se o
investidor tentar vender o título antecipadamente.
Marcia Dessen - planejadora financeira CFP (“Certified Financial
Planner”), autora de “Finanças Pessoais: O Que Fazer com Meu Dinheiro”.
Fonte: coluna jornal FSP