ROBÔS, PRODUTIVIDADE E RENDA
País está ficando cada vez mais
para trás em termos de novas tecnologias e atraso relativo deve aumentar com
proliferação de avanços como a IA
O último período
de aumento contínuo da produtividade na economia brasileira ocorreu na primeira
década deste século.
Agora, será necessário um novo período de crescimento para
levar a nova classe média, forjada neste período, para outro patamar de renda e
emprego.
Para isso, é inevitável aumentarmos novamente a produtividade de
maneira sustentável. Como podemos aumentar o dinamismo da economia brasileira?
Antes um pouco de
história. Até o final dos anos 1980, o Brasil era um país muito atrasado em
termos sociais, com altos níveis de miséria, pobreza e desigualdade.
Desde
então, a sociedade brasileira fez um grande progresso em termos sociais,
reduzindo a pobreza, criando o Sistema Único de Saúde (SUS) e as aposentadorias
para os brasileiros mais velhos.
A mortalidade
infantil, por exemplo, se reduziu de 70 óbitos para cada mil crianças em 1980
para 14 por mil atualmente, em grande parte devido a melhorias no sistema de
saúde, com aumento de exames pré-natais e universalização da vacinação.
Para
superarmos este atraso histórico, foi necessário um grande aumento de gastos.
Afinal, criar um sistema de saúde gratuito para todos, atendendo pessoas que
nunca
tinham tido qualquer acompanhamento, criar programas de transferências de
renda, e universalizar o acesso à educação fundamental foi bastante caro.
E para financiar
estes gastos, foi necessário aumentar a carga tributária, que passou de 24% do
PIB em 1990 para 33% em 2007, já que não houve crescimento de produtividade no
período.
Este aumento de impostos foi plenamente justificado, pois era inadmissível
vivermos numa sociedade com tanta pobreza. Falta ainda aumentar os impostos
sobre os dividendos e a alíquota máxima do imposto de renda.
Além disto, as
renúncias tributárias são enormes, incluindo a baixa tributação dos
profissionais liberais que vivem do Simples e que dificultam sobremaneira o
equilíbrio fiscal.
Mas os obstáculos
políticos para avançar nestas áreas é enorme. O início dos anos 2000 foi o
período de maior crescimento de produtividade em tempos recentes.
Neste
período, aumentos reais no valor do salário mínimo foram importantes para
distribuir melhor a renda gerada por este crescimento, depois de um longo
período de queda no seu valor real.
O crescimento da renda, acoplado aos
aumentos do salário mínimo, forjaram a “nova classe média”, que teve seus
rendimentos dobrados no período.
Assim chegamos aos dias de hoje, em que 150
milhões de brasileiros dependem de alguma forma do salário mínimo ou do Bolsa
Família.
Para progredirmos
daqui em diante, precisamos agir em duas frentes. A primeira delas é cuidar dos
20% dos brasileiros que ainda estão na pobreza, incluindo os 5% extremamente
pobres.
Para isso, temos que aperfeiçoar as políticas públicas ligadas à assistência
social.
A segunda, será implementar políticas que levem ao crescimento
sustentado de produtividade, para aumentar novamente a renda da nova classe
média, para que ela consiga aumentar seu padrão de vida independentemente do
salário mínimo e das transferências de renda.
O grande obstáculo para isso
acontecer é a falta de dinamismo da economia brasileira. A figura, por exemplo,
mostra dados de utilização de robôs industriais em alguns países, oriundos da
International Federation for Robotics (IFR).
Os robôs
industriais são aqueles controlados automaticamente, multiuso e reprogramáveis,
que são usados em aplicações de automação em um ambiente industrial.
Atualmente, esses robôs são essenciais em uma ampla gama de aplicações
industriais, como usinagem, soldagem, montagem, embalagem de produtos e outras
atividades.
A figura mostra
que o Brasil está ficando cada vez mais para trás dos demais países em termos
de utilização de robôs.
Na Coreia do Sul, por exemplo, seu uso na indústria
passou de 16 robôs por mil trabalhadores em 2010 para 52 em 2023. Brasil e
China estavam num patamar parecido de utilização de robôs em 2010, mas,
enquanto a China atualmente usa 6 robôs para cada mil trabalhadores
industriais, o Brasil usa menos de 1.
O número total de
robôs dobrou na China nos últimos 3 anos, passando de 760 mil para um 1,5
milhão. Nos Estados Unidos, o uso de robôs também cresceu nos últimos 20 anos,
mas a uma taxa menor do que na China e na Coreia.
Como será que o Brasil poderá
ter um período de crescimento sustentado de produtividade, sem depender
unicamente da agricultura, passando a exportar cada vez mais produtos
industriais, se estamos ficando cada vez mais atrasados em termos de novas
tecnologias, patentes e uso de robôs?
Além disso, nosso atraso relativo só
deverá aumentar com a proliferação das novas tecnologias de inteligência
artificial e aprendizado de máquina.
Os diversos
programas de incentivo à inovação, como os voltados à indústria automobilística
por exemplo, que vigoram há décadas, tiveram muito pouco impacto na inovação.
Um primeiro passo na direção de maior inovação e produtividade seria ampliar a
abertura comercial da economia brasileira, reduzindo as tarifas de importação
para aumentar a competição e, ao mesmo tempo, permitir que as firmas mais
inovadoras consigam comprar insumos internacionais a preços mais baixos,
inserindo-as nas cadeias globais de valor.
Vários estudos
mostram que a abertura comercial tem impactos positivos na produtividade e na
inovação por meio destes mecanismos.
No entanto, a nossa economia política
impede avanços nesta direção. Assim, vamos ter que nos conformar com longos
períodos de baixo crescimento econômico, que vão depender em grande parte do
nosso desempenho agrícola.
NAERCO MENEZES FILHO - professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no
Insper e professor associado da Faculdade de Economia e Administração da
Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Fonte: Valor Econômico