Brasil
criou o péssimo hábito de não tratar a todos da mesma forma. Pior ainda, o
costume ficou tão arraigado que já nem nos chocamos mais que alguns recebam
tratamento de primeira classe enquanto a maioria é tratada com
desdém. Enquanto funcionários públicos se aposentam com aposentadoria
integral, a maioria dos brasileiros tem de se contentar com uma fração disso.
Enquanto a Justiça para a maioria dos brasileiros é uma, para aqueles que gozam
de foro privilegiado, é outra. Enquanto juízes e legisladores gozam de
auxílio-paletó, auxílio-moradia, auxílio-isso, auxílio-aquilo a maioria dos
brasileiros nem sabe o que é isso. Enquanto funcionários públicos têm
estabilidade de emprego garantida, os brasileiros que pagam seus salários
através do pagamento de impostos podem ser demitidos a qualquer momento.
O mais
novo caso em que os mais fracos receberam tratamento de cidadãos de segunda
classe no Brasil refere-se ao Refis, o programa de refinanciamento de dívidas
do governo federal. Como é de conhecimento geral, o Congresso Nacional aprovou
um projeto que beneficia grandes empresas com o parcelamento de dívidas
tributárias com a União. Na sequência, o mesmo Congresso Nacional aprovou por
unanimidade um projeto que estende o mesmo benefício aos pequenos
negócios, nos mesmos parâmetros do que foi concedido às grandes empresas. A
diferença é que o governo federal sancionou o projeto que concede os benefícios
às grandes empresas, mas vetou aquele que concederia os mesmos benefícios às
micro e pequenas empresas.
A
justificativa para o veto presidencial foi que este projeto pioraria a situação
já precária das contas públicas. A justificativa é verdadeira, mas é
inaceitável que ela não tenha sido considerada no caso das grandes empresas e
ganhe uma importância desproporcional no caso das micro e pequenas empresas.
Além de não ser isonômico, este tratamento diferenciado é injusto e
contraproducente. As micro e pequenas empresas, deixadas de fora do Refis, são
responsáveis por mais da metade dos empregos no país e são mais vulneráveis que
as grandes a uma crise econômica das proporções da que atingiu o país nos
últimos anos.
Além
disso, em um país em que a carga tributária é uma das mais elevadas entre os
países emergentes e, ainda assim os serviços públicos deixam muito a desejar,
fica claro que o problema essencial das finanças públicas não é falta de receitas,
mas a corrupção e o excesso de gastos e desperdícios, incluindo, aliás, os
diversos casos em que alguns recebem privilégios que não são estendidos a todos
os brasileiros.
Seria
bom se o Congresso Nacional começasse a reverter este quadro, derrubando o veto
presidencial e garantindo que as pequenas empresas recebessem o mesmo
tratamento que as grandes. Imagine o país que poderíamos construir se todos
aqui fossem tratados da mesma forma.
RicardoAmorim - autor do bestseller Depoisda Tempestade, apresentador do ManhattanConnection da Globonews.