Quantas vezes devemos embaralhar as cartas?
Embaralhamentos
nunca são perfeitos, porque o corte do baralho não é ao meio ou porque a
alternância das duas partes não é exata.
No início do século, a indústria bilionária do jogo
contratou Persi Diaconis, da Universidade Stanford, para
validar a nova máquina embaralhadora que iriam usar em seus cassinos.
Ao
contrário dos apostadores, Las Vegas não gosta de perder dinheiro...
Ao começar qualquer partida, presume-se que a ordem
das cartas seja conhecida, ou porque o baralho é novo, e as cartas estão na
ordem de fábrica, ou porque ele foi usado antes, e os participantes podem
lembrar.
O objetivo do embaralhamento é misturar as cartas de modo a destruir
toda a informação que possa ser útil para os jogadores.
O método mais usual consiste em cortar o baralho em
duas partes mais ou menos iguais, e, em seguida, intercalar as cartas de uma e
outra de modo tão aleatório quanto possível.
Quando as duas partes são
exatamente iguais, e as suas cartas são intercaladas em alternância exata,
tem-se um "embaralhamento perfeito".
Pouquíssimas pessoas no mundo
conseguem fazer isso: Diaconis é uma delas.
Apesar do nome, o embaralhamento perfeito é muito ruim: se
fizermos oito embaralhamentos perfeitos seguidos, como por magia as cartas
voltam exatamente à ordem inicial! Por quê? (respostas são bem-vindas para viana.folhasp@gmail.com)
Na prática, embaralhamentos nunca são perfeitos, porque o corte
do baralho não é ao meio ou porque a alternância das duas partes não é exata.
Isso ajuda, mas ainda assim é preciso embaralhar várias vezes para que as
cartas fiquem bem misturadas.
Quantas vezes? Um dos teoremas mais famosos de Diaconis, que ele
pretende gravar em sua tumba, responde: exatamente sete vezes.
Mais
embaralhamentos não acrescentam e com menos resta informação no baralho de que
os jogadores podem tirar vantagem.
Nos cassinos, a mistura das cartas é feita por máquinas, e os
engenheiros de Las Vegas estavam confiantes de que o novo modelo faria um bom
trabalho em apenas uma rodada de embaralhamento.
Mas Diaconis identificou
diversas vulnerabilidades na máquina.
Os argumentos matemáticos não convenceram os engenheiros:
"Eles não estavam nem aí para a noção de distância de variação
total", lamenta-se Diaconis.
Então ele e seus colegas partiram para uma
demonstração prática: mostraram que, usando ideias simples, podiam explorar as
deficiências do embaralhamento para adivinhar cerca de 20% das cartas do
baralho, mais do que suficiente para vencer a banca.
Os engenheiros tiveram que repensar o aparelho mas, felizmente,
o trabalho dos matemáticos também apontava como os problemas podiam ser
resolvidos.
MARCELO VIANA - diretor-geral do Instituto de Matemática Pura e
Aplicada, ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.