A
sociedade concedeu expectativas de direitos que geram gasto elevado com
Previdência
O Brasil gasta com benefícios previdenciários 14% do PIB
(Produto Interno Bruto). Esse número soma o RGPS (Regime Geral de Previdência
Social), que gasta uns 9% do PIB, e os RPPS (Regimes Próprios de Previdência
Social) dos funcionários públicos, que gastam 5% do PIB, consolidando União,
estados e municípios.
Adicionalmente, o número de 14% do PIB inclui os
benefícios assistenciais e as pensões por morte aos viúvos e viúvas.
A razão de dependência —relação entre a população acima
de 65 anos e a que tem entre 20 e 64 anos— é no Brasil de 13%. Sociedades com
essa razão de dependência gastam em geral entre 5% ou 6% do PIB com
Previdência. Ou seja, nosso sobregasto previdenciário é da ordem de 8 a 9
pontos percentuais do PIB.
Nosso gasto é tão superior ao das demais sociedades
porque a taxa de reposição (valor do benefício previdenciário como proporção da
renda quando ativo) é próxima de 100% para uma parcela de 95% da população que
trabalha, segundo o trabalho “Será que o brasileiro está poupando o suficiente para
se aposentar?”, de Ricardo D. Brito Paulo T. P. Minari. Além da alta taxa de
reposição, o gasto é elevado pois a idade de concessão do benefício é muito
baixa.
Elevada taxa de reposição e reduzida idade de concessão
do benefício desestimulam a poupança privada. O mesmo trabalho citado mostra
que, para esses 95% da população empregada, é irracional a constituição de
poupança para a velhice.
Nosso sistema previdenciário, além de onerar as contas
públicas, desestimula a formação da poupança. Consequentemente, a taxa básica
de juros é muito elevada.
Em ano eleitoral surgem propostas rocambolescas para
enfrentar a questão. Diversos candidatos apostam no regime previdenciário
fundado: a acumulação de recursos em contas individuais.
O leitor pode achar estranho a taxa de reposição ser
elevada e os valores dos benefícios serem baixos. O que de fato é baixa é a
remuneração média do trabalho no Brasil, fruto da baixa produtividade.
Lembremos que uma hora trabalhada no Brasil produz a quinta parte da hora trabalhada
nos Estados Unidos, por exemplo.
Todas
as pessoas que estão no setor privado já estão em um regime fundado: para ter
aposentadoria acima do teto do INSS, é necessário poupar, seja adquirindo
patrimônio imobiliário, riqueza financeira ou alguma outra forma.
Todas as pessoas que ingressaram no serviço público da
União após 2013, quando a presidente Dilma Rousseff implantou o fundo de pensão
complementar dos servidores da União, já estão no regime fundado. O mesmo se
aplica a alguns estados.
O problema, portanto, não é o desenho do modelo. De
fato, é importante que o fundo de pensão complementar de servidores seja
implantado para os funcionários públicos de todos os estados e municípios.
O problema é que o Congresso Nacional concedeu expectativas
de direitos que geram esse gasto elevado, com altas taxas de reposição e idades
de concessão do benefício muito baixas.
Mudar o regime para os novos ingressantes no mercado de
trabalho, de sistema de repartição para sistema fundado, não alterará o fato de
que já concedemos expectativas de direitos que geram esse resultado
macroeconômico.
Se não repactuarmos nosso sistema previdenciário,
reduzindo a expectativa de recebimento de benefício —seja o valor ou a idade de
concessão—, não escaparemos do perverso equilíbrio que temos vivido nas últimas
décadas, de baixo crescimento, carga tributária crescente e juros elevados. Não
há atalho por aqui.
Samuel Pessôa - pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV)
e sócio da consultoria Reliance. É doutor em economia pela USP.
Fonte: coluna jornal FSP