Na área da saúde, algumas profissões são
predominantemente femininas —nos EUA, as mulheres são 83% dos enfermeiros, 91%
dos nutricionistas, 70% dos psicólogos e 82% dos assistentes sociais. No
Brasil, o cenário é semelhante.
Segundo as conclusões de um simpósio realizado em
Orlando no congresso anual da ADA (Associação Americana de Diabetes), essas
profissionais têm um grau de dificuldade aumentado dentro da carreira
acadêmica, quando pretendem ser professoras universitárias,
pesquisadoras e líderes científicas em suas áreas.
Um fator que contribui para isso é a prioridade baixa
atribuída às disciplinas que elas ministram —a remuneração delas é pior e há o
rótulo depreciativo de essas áreas serem “ciências soft”, em oposição às
ciências duras (hard), como matemática, física, química ou engenharia.
Não se ganha status por ministrar, por exemplo, cursos
com foco na prevenção de doenças, do cuidado com o paciente ou na mudança de
hábitos de vida, apesar da importância de iniciativas do tipo. Como existe um
estigma de feminização dessas áreas, a participação masculina também é
reduzida.
Sem prestígio, é pouco provável que essas profissionais
assumam posições de liderança e de gestão de serviços de saúde, por exemplo. No
fim das contas, elas acabam muitas vezes tomando papéis secundários,
vice-chefias, à sombra dos homens, geralmente médicos.
Felicia Hill-Briggs, presidente da seção de medicina e
ciência da ADA e uma das palestrantes do simpósio, enumerou algumas
características que fazem diferença na trajetória de mulheres de sucesso:
- Ter a casca grossa, ou
seja, não se deixar abater com facilidade;
- Ter um mentor forte na
instituição;
- Permanecer flexível e criativa;
- Criar ela mesma
oportunidades de liderança e aproveitar as chances para fazer mudanças no
sistema;
- Alavancar a carreira de
outras mulheres.
Homens geralmente dependem mais apenas do próprio
esforço do que as as mulheres. Já elas têm praticamente de pavimentar a própria
trilha. “Mesmo com um currículo parecido, muitos homens avançam na carreira e
as mulheres não. Nós precisamos aprender mais sobre os caminhos institucionais
e com quem falar”, diz a psicóloga, que é professora da Universidade Johns Hopkins.
Ela, que é negra, afirma que o preconceito racial pode
agravar a situação. “É comum ouvir que ‘alguém como você’ não pode assumir
determinada posição de liderança.”
A médica Elizabeth Seaquist, da Universidade de
Minnesota, afirma que mesmo com a fração de mulheres em ritmo crescente entre o
total de docentes da área médica, nas posições mais altas da carreira, em dados
de um conjunto de instituições, elas ainda se encontram subrepresentadas, com a
proporção estagnada na casa dos 20%.
Outro grande problema, diz, é a questão do assédio no
ambiente acadêmico. “Não é por acaso que grandes revistas médica, Jama e New
England Journal of Medicine, recentemente trataram do tema.”
“As mulheres não sabem se é seguro falar a respeito
desses assuntos, se não vão sofrer represálias.” Nesse sentido, o impacto do
movimento #metoo é bem-vindo e pode fomentar o funcionamento adequado dos
comitês institucionais antiassédio, opina.
Em
um documento recente lançado pela as academias nacionais de Ciência, Engenharia
e Medicina, as instituições afirmam que as ações de combate ao assédio tem
falhado e sugeriram reformas profundas e punições severas para lidar com
a questão.
Gabriel
Alves – jornalista
Fonte:
jornal Folha de São Paulo