Que o mercado de
previdência complementar tem sofrido grandes transformações nos últimos anos,
isto nós sabemos. De fato, os Fundos de Pensão não passariam incólumes a tantas
mudanças econômicas, políticas e sociais ocorrendo simultaneamente em nosso
país e fora dele. Nesse sentido, os bons Relatórios Trimestrais fornecidos pela PREVIC
são importantes fontes para conhecermos melhor as principais mudanças havidas e
inferir tendências para o sistema.
Visão
geral
Em dezembro de
2016, o Brasil contava com 307 fundos de pensão, número que vem decaindo ano
após ano. São trinta a menos que há cinco anos, em 2011. Em especial, chama
atenção a variação por tipo de patrocínio predominante:
Quantidade
de EFPCs
Patrocínio predominante
|
Dez/2011
|
Dez/2016
|
Variação
|
Instituidor
|
19
|
21
|
+10%
|
Privado
|
234
|
198
|
-16%
|
Público
Estadual
|
45
|
49
|
+9%
|
Público
Federal
|
37
|
37
|
–
|
Público
Municipal
|
2
|
2
|
–
|
Total
|
337
|
307
|
-9%
|
Como se vê, a
maior redução está no segmento de patrocínio privado. Doutro lado, aumentou o
número de entidades ligadas aos segmentos de Instituidor e Público Estadual.
Quantifica-se, portanto, tendências que já se observam há anos:
·
Consolidação das Entidades Fechadas
de Previdência Complementar, através de fusões, incorporações e/ou
transferências de gerenciamento para Entidades multipatrocinadas ou mesmo
retiradas de patrocínio;
·
Maior peso relativo, no sistema, às
Entidades instituídas e ligadas ao setor público;
·
Redução do número total de EFPC.
Fundamental
observar que um menor número de Entidades Fechadas de Previdência Complementar
não implica na redução do número de patrocinadores. Em verdade, observamos
significativo crescimento em quase todos os segmentos. Vamos novamente comparar
dados de 2011 com os mais recentes, de 2016:
Quantidade
de Patrocinadores
Natureza Jurídica
|
Dez/2011
|
Dez/2016
|
Variação
|
Instituidor
|
496
|
496
|
–
|
Privado
|
2.123
|
2.189
|
+3%
|
Público
Estadual
|
95
|
155
|
+63%
|
Público
Federal
|
81
|
351
|
+433%
|
Público
Municipal
|
20
|
8
|
-60%
|
Total
|
2.815
|
3.199
|
+14%
|
Lamenta-se que a
Previc não disponibilize em seu Relatório de 2016 as informações populacionais,
que eram facilmente encontradas em 2011. Saber a quantidade total de
Participantes, Aposentados e Pensionistas nos permitiria tecer análises das
mais importantes – dentre elas, inferir a evolução da cobertura oferecida pelo
sistema em relação à população economicamente ativa.
Investimentos
das EFPC
Ao longo de
cinco anos, os investimentos totais das EFPC cresceram quase um terço em
valores nominais – para ser mais exato, os R$577 bilhões registrados em
31/12/11 já correspondiam a R$758 bilhões em 31/12/16, uma variação superior a
31% no período.
A distribuição
dos investimentos por categoria de ativos também variou, embora de maneira mais
sutil, como vemos no gráfico a seguir:
Comparativamente
a 2011, vê-se em 2016 uma importante redução relativa nas posições em ações e
em crédito privado; em contrapartida, os fundos de investimento e os títulos
públicos tornaram-se ainda mais representativos na carteira das entidades,
certamente em consequência da maior volatilidade e alta das taxas de juros que
vivenciamos no período. Essas duas categorias, somadas, já ultrapassavam 80%
dos R$758 bilhões de investimentos das Entidades Fechadas de Previdência
Complementar.
Seria importante
conhecer de maneira mais analítica qual a posição detida pelos fundos de
investimento onde as entidades aplicam seus recursos, uma vez que referidos
fundos estão autorizados a aplicar em ativos de todas as demais classes –
títulos públicos, ações, imóveis, exterior e assim em diante. Da forma como
constam no Relatório, desconhecemos quais as categorias de ativos onde de fato
estão investidos os 62,9% de recursos apresentados como “Fundos de
Investimento”.
Também faz falta
alguma informação acerca da rentabilidade auferida pelas entidades no período,
de forma nominal e real, permitindo-nos analisar a performance da gestão de
investimentos.
Resultado
– Déficit e superávit
Observou-se uma
dramática inversão de resultados das entidades no período de análise. Enquanto
em 2011 o superávit acumulado era seis vezes maior que o déficit, em 2016 o
déficit representou quase quatro vezes o superávit existente. Cabe observar
que, há apenas um ano, a diferença era ainda maior: os dados de 31/12/15
apresentavam um déficit acumulado seis vezes superior ao superávit, ou seja, em
2016 já observamos uma melhora dos resultados gerais.
Também é digna
de nota a evolução das provisões matemáticas a constituir – em geral, refletem
equacionamentos de dívida já contratados em exercícios anteriores pelos planos
junto ao patrocinador, participante e assistidos ou ambos. Para fins de melhor
visualização da “dívida” em equacionamento e a equacionar, usualmente somamos
as provisões matemáticas a constituir aos déficits acumulados, obtendo com isto
o que denominamos déficit total. Apresentamos tais valores no gráfico a seguir:
Resultado
dos planos – em R$ milhões
Nota: o Déficit Total, estimado pelo
autor, é resultado da soma dos valores de déficit acumulado e de provisões
matemáticas a constituir, informados pela Previc nos respectivos Relatórios
Infelizmente, o
Relatório da Previc deixou de contar com o item “Informações Atuariais”,
presente em 2011. Ela nos permitia conhecer a variação das principais premissas
empregadas pelos planos, ajudando-nos a entender o quanto as alterações nas
taxas de juros e nas tábuas empregadas nas avaliações atuariais poderiam ter
influenciado os resultados apurados.
Mesmo assim, é
importante notar que o déficit e o déficit total representam menos de 10% e
15%, respectivamente, do ativo total dos fundos de pensão. Este é um percentual
relativamente adequado se observarmos o padrão mundial, inclusive nos sistemas
de previdência complementar de países desenvolvidos. Se contidos neste nível e
equacionados na forma legalmente prevista, não há ainda motivo para maiores
preocupações com relação ao nível de déficit total dos planos de benefícios.
Outras
informações relevantes
Além das acima
apresentadas, o Relatório da Previc nos demonstra que:
·
A proporção entre benefícios pagos e
contribuições recebidas, importante medida de maturidade dos planos, continua
praticamente a mesma: para cada real pago a assistidos, apenas cinquenta e sete
centavos ingressam nos planos a partir do dinheiro depositado por participantes
e patrocinadores.
·
As despesas incorridas pelas
Entidades na administração de planos continuam superando as receitas, por
diferença de 10% (R$ 200 milhões) em 2016. A categoria com maiores gastos é
“Pessoal e Encargos”, que variou 70% – ante 38% da variação de todas as
despesas somadas.
·
Como era de se esperar, o número de
planos BD diminuiu e o de CD e CV cresceu, contrariando a curiosa observação
feita pelo colega Frederico Vieira em artigo no ano passado – ele observou que,
entre 2014 e 2015, houve aumento no número de planos BD. Como ele apontou à
época, tal variação atípica poderia “ser justificada por eventual
reclassificação e ajustes nos cadastros dos planos, ou mesmo pela conclusão de
processos de cisão de planos, já que certamente não devemos observar criação de
novos planos e crescimento, além do vegetativo, nesta modalidade”.
Quantidade
de planos por modalidade
Considerações
finais
O período de
cinco anos analisado, que pode ser considerado um horizonte de médio prazo para
as Entidades Fechadas de Previdência Complementar, nos permite observar
importantes variações estruturais nessas entidades, a maior parte das quais em
linha com o que se poderia esperar como consequência das transformações
ocorridas no Brasil nesse mesmo interstício. O sistema de previdência
complementar de nosso país, um dos maiores do mundo, continua sua caminhada de
maneira sólida e consistente.
Frustra ver,
contudo, que em cinco anos pouco avançamos na ampliação da magnitude do sistema
para o país. Em 31/12/16, a relação entre os ativos totais das Entidades e o
PIB brasileiro foi de 12,6%, mesmo patamar visto em toda última década e muito
aquém ao de países onde a previdência complementar de fato abrange uma parcela
significativa da população e de suas respectivas poupanças. Ainda há, como
sabemos, muito a ser feito no âmbito do fomento – precisamos priorizar as
mudanças necessárias para ampliação do sistema.
Quanto ao
Relatório aqui analisado, é importante que a Previc não apenas continue
consolidando periodicamente as informações estatísticas do setor, mas também
invista em seu aperfeiçoamento, permitindo a consulta e análise dinâmica dos
dados (o Relatório atual é dado em PDF), ampliando a quantidade de dados
apresentados (inclusive reincluindo alguns presentes em 2011) e buscando o
menor prazo possível em sua apresentação, que hoje em dia é feita cerca de três
meses após o encerramento do exercício. Desta forma, contribui-se para o
amadurecimento da gestão dos planos através do compartilhamento dos importantes
indicadores estratégicos presentes no material.
Guilherme Gazzoni - Consultor líder da equipe da Mercer no Rio de
Janeiro.