Assistência
médica à população que envelhece envolverá custos insuportáveis
Os
brasileiros vivem cada vez mais. Quem nasceu em 1940 tinha expectativa de viver
em média 45,5 anos. Entre os que vieram ao mundo em 2016, a média será de 75,8
anos. Se tiverem a sorte de nascer em Santa Catarina, a expectativa aumenta
para 79,1; no azar do Maranhão, cai para 70,6.
De
1940 para cá, o ganho médio de 30 anos na duração da vida ocorreu
principalmente graças ao saneamento básico, à melhora da nutrição, às vacinas e
aos antibióticos, avanços que reduziram as mortes por doenças
infecto-parasitárias e fizeram a taxa de mortalidade infantil recuar de 146 em
cada mil nascimentos, em 1940, para 13, nos dias atuais.
Futuros
aumentos da longevidade serão bem menos expressivos, uma vez que exigirão
intervenções complexas para reduzir a mortalidade por ataques cardíacos,
derrames cerebrais, diabetes, câncer e infecções por bactérias resistentes,
combater o fumo, as epidemias de sedentarismo e obesidade e encontrar soluções
para transtornos psiquiátricos e as demências da velhice.
A
assistência médica à população que envelhece —e envelhece mal— envolverá
custos que a economia brasileira será incapaz de suportar. Não há alternativa:
ou evitamos que os mais velhos fiquem doentes ou não haverá dinheiro que
chegue.
Veja
o exemplo dos Estados Unidos, o país que mais investe em descoberta de drogas,
equipamentos, modernização de hospitais e tecnologia médica. O investimento
americano em saúde é campeão mundial: 17,1 % do PIB.
Como
o PIB deles é de US$ 19 trilhões (quase R$ 67 trilhões), faça a conta: dá
aproximadamente US$ 3,2 trilhões (cerca de R$ 11,9 trilhões), ou seja, destinam
à saúde 60% mais do que o nosso PIB inteiro (equivalente a US$ 2 trilhões, ou
R$ 7,5 trilhões).
Tanto
dinheiro para resultados medíocres. A expectativa de vida dos americanos é de
78,7 anos, a mais baixa dos países industrializados. Em Santa Catarina é mais
alta. Na classificação geral de longevidade, o americano médio ocupa a 31ª
colocação, embora gaste US$ 9.400/ano.
Os
Estados Unidos oferecem ao mundo a oportunidade de entender que o foco das
políticas públicas de saúde deve estar centrado na prevenção. Custa os olhos da
cara tratar das doenças degenerativas crônicas responsáveis pelas taxas de
mortalidade atuais.
Uma
análise conjunta de 15 estudos (metanálise) com mais de 500 mil participantes
de vários países desenvolvidos, seguidos durante 13 anos, revelou que 60% das
mortes prematuras poderiam ser atribuídas a estilos de vida insalubres:
cigarro, consumo excessivo de álcool, sedentarismo, dietas pobres e obesidade.
Essa
metanálise demonstrou que, em países como Japão, Noruega, Alemanha, Canadá,
Dinamarca e Reino Unido, as expectativas de vida poderiam aumentar de 7,4 a
17,9 anos, caso a população adotasse hábitos mais saudáveis.
Neste
ano, a revista Circulation publicou o estudo mais completo sobre a influência
do estilo de vida na longevidade dos americanos. Foram colhidos dados
periódicos sobre cinco práticas ligadas ao estilo de vida: fumo, dieta, índice
de massa corpórea (IMC = peso/altura x altura), prática de atividade física e
consumo de álcool, de 79 mil mulheres acompanhadas durante 34 anos e de 44 mil
homens acompanhados por 27 anos (números arredondados).
Os
participantes foram classificados na categoria de baixo risco, quando: nunca
fumaram; mantiveram o IMC na faixa entre 18,5 e 24,9; praticavam pelo menos 30
min/dia de exercícios de intensidade moderada ou vigorosa (andar rápido ou
correr); bebiam álcool com moderação (mulheres: de 5 a 15 g/dia; homens: de 5 a
30 g/dia); estavam entre os 40% dos que se alimentavam da forma mais próxima de
uma dieta com ênfase em vegetais (Alternate Healthy Eating Index).
Os
autores estimaram a expectativa de vida das mulheres e homens que chegaram aos
50 anos, com estilos de vida sem nenhum desses fatores de baixo risco, isto é,
foram sedentários, fumantes, com excesso de peso, consumiram mais álcool e
dietas menos saudáveis. Concluíram que a expectativa média das mulheres desse
grupo foi a de viver mais 29 anos, e a dos homens mais 25,5.
No
extremo oposto, naquele dos que chegaram aos 50 anos respeitando os cinco fatores
de baixo risco citados, essas expectativas aumentaram para mais 43 e 37 anos
respectivamente.
Portanto, prezado leitor, adotando
um estilo de vida de baixo risco você viverá em média até os 87 anos. E você,
querida leitora, poderá chegar aos 93. Não está bom?
Drauzio Varella - médico cancerologista, é um dos pioneiros no
tratamento da Aids no Brasil e autor de 'Estação Carandiru'.
Fonte: coluna jornal FSP