A importância do cuidado paliativo
Nova política
nacional torna o atendimento do SUS ainda mais humanizado.
O direito humano à saúde inclui o acesso a cuidados paliativos. Equipes
multidisciplinares ajudam pacientes que enfrentam doenças sem cura a viver o
mais dignamente possível até a morte, além de apoiarem os familiares.
Essas
equipes atendem às necessidades físicas, emocionais, mentais, sociais e
espirituais dos pacientes.
Câncer, doenças cardiovasculares, Aids, doenças respiratórias crônicas,
diabetes, insuficiência renal, esclerose múltipla, doença de Parkinson, artrite reumatoide,
demência, anomalias congênitas e tuberculose resistente a medicamentos são
algumas condições que podem demandar cuidados paliativos.
Se a morte é certa, o morrer não é igual para
todos.
Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde),
apenas 14% das pessoas que precisam de cuidados paliativos no mundo são
atendidas.
A maioria da demanda não atendida se encontra em países de renda
baixa e média e entre as pessoas mais vulneráveis.
Segundo um relatório publicado
na revista Lancet em 2022, entre 8% e 11,2% dos gastos anuais com saúde em
países de renda alta são destinados a menos de 1% das pessoas que morreram
naquele ano.
Em 2021, um estudo avaliou a
qualidade de morte em 81 países considerando 13 indicadores sobre o tratamento,
as informações fornecidas, a possibilidade de escolha do local da morte, a
empatia dos profissionais de saúde, o incentivo do contato com familiares e
amigos, o apoio às necessidades espirituais, religiosas e culturais dos
pacientes e a ajuda com preocupações não médicas.
O Brasil teve a terceira pior avaliação, à frente
apenas do Líbano e do Paraguai.
Esse resultado é preocupante considerando
o rápido envelhecimento da população, as
altas taxas de sobrepeso e obesidade, a atual carga de doenças e o fato
de que doenças cardiovasculares são a principal causa de morte no
país.
Segundo o Ministério da Saúde, mais de 590 mil adultos e
cerca de 34 mil crianças precisam de cuidados paliativos.
Atualmente o
atendimento é limitado e não normatizado, há carência de profissionais
qualificados, questões culturais são ignoradas, e pacientes morrem em UTIs
longe de familiares e sem terem seus desejos respeitados.
Uma exceção é o Inca (Instituto
Nacional do Câncer), que oferece cuidado paliativo aos pacientes com câncer e
promove o treinamento de profissionais.
Visando mudar esse cenário e atender a demanda
nacional, a portaria 3.681 de 7
de maio instituiu a Política Nacional de Cuidados Paliativos (PNCP) no âmbito
do SUS (Sistema Único de Saúde).
Os cuidados
paliativos serão integrados à rede de atenção à saúde, com ênfase na atenção
primária, por meio de equipes multidisciplinares organizadas territorialmente
segundo macrorregiões de saúde.
A estimativa é que sejam criadas 485 equipes
multidisciplinares estaduais e 836 municipais. Equipes são compostas de médico,
enfermeiro, assistente social, psicólogo e técnico de enfermagem.
A política
também considera o uso de telessaúde. Isso demanda conectividade, algo
que ainda não é universal no Brasil.
A habilitação das equipes depende de solicitação
dos secretários estaduais e municipais de saúde. Em outubro teremos eleições
municipais e, portanto, haverá mudanças nas Secretarias Municipais de Saúde.
A velocidade da implementação da PNCP, a cobertura
geográfica, a qualidade do serviço e o número de pessoas atendidas devem ser
monitorados.
É preciso recrutamento e treinamento, aquisição de insumos,
sensibilização da população, habilitação e monitoramento das equipes.
A PNCP é necessária e torna o atendimento do SUS
ainda mais humanizado.
Como disse Hipócrates,
"cura quando possível, aliviar quando a cura não for possível e consolar
quando não houver mais nada a fazer".
MARCIA CASTRO - professora de demografia e chefe do Departamento de Saúde
Global e População da Escola de Saúde Pública de Harvard.