Tecnologia e governo, demanda sem oferta


Na semana passada, foi publicada uma pesquisa que mediu a utilização de aplicativos governamentais no país, bem como a percepção da importância da tecnologia para os serviços públicos. A pesquisa foi realizada pelo Ideias Big Data a pedido do Agora! (organização da qual sou cofundador) e teve abrangência nacional.

Hoje, apenas 12,5% dos brasileiros afirmam ter baixado algum aplicativo governamental no celular. O número cai para 8% na região Norte e sobe para 15% no Sudeste e no Centro-Oeste.

O aplicativo governamental mais baixado é o da Caixa Econômica Federal, citado por 16% dos entrevistados em pergunta estimulada. Em seguida vêm o app do FGTS (11%), o da Receita Federal (8%) e, curiosamente, o do Supremo Tribunal Federal (4,8%).

Os aplicativos do Bolsa Família e da Previdência, por exemplo, são citados por apenas 4,3% e 4%.


A pesquisa também perguntou se os entrevistados gostariam que mais tecnologia fosse empregada por parte do governo. Os que responderam sim foram 58%, tanto faz, 18%, e 18,5%, não.

O tema é importante. A pesquisa mostra que há demanda, mas não há oferta de serviços governamentais digitais. Faz sentido. Se bem empregada, a tecnologia pode fazer muito para melhorar os serviços públicos.

Para isso ser verdadeiro, é preciso uma mudança de rota. É necessário implementar dois movimentos simultâneos que hoje não acontecem no país. 

O primeiro é parar imediatamente com a multiplicação dos aplicativos governamentais. Cada um é um silo que não se comunica com outros. Essa é uma falha de arquitetura, cara e ineficiente. É absurdo esperar que cada pessoa baixe um aplicativo específico para cada serviço governamental de que precisar. Só na pesquisa apareceram 48 aplicativos diferentes. Há um até para a reforma trabalhista, usado por pífio 0,8%.

O que faz sentido é a criação de um portal governamental no qual os cidadãos acessam de uma vez só todos os serviços. Isso impede a multiplicação da burocracia, dos feudos e da corrupção. Cortar custos, gera eficiências e ganhos de escala. Países tão diversos quanto a Índia e a Estônia seguem nesse sentido.

O outro movimento que precisa ser feito é o de proteção dos dados pessoais do cidadão. Se a centralização das plataformas é desejável, a descentralização da guarda dos dados também é. O portal de serviços pode ser centralizado, mas a guarda dos dados não precisa ser.

É possível trabalhar com um modelo de identidades digitais que permite ao próprio cidadão custodiar seus dados, sem a necessidade de um big brother governamental. A Estônia está fazendo isso com sucesso e está sendo imitada por outros países. Podemos aprender com essa experiência.

Dados centralizados são a receita para ataques, vazamentos e manipulação política. Ainda mais em um país como o Brasil, que nem sequer tem uma lei de proteção de dados pessoais.

Ronaldo Lemos - advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio e representante do MIT Media Lab.

Fonte: coluna jornal FSP

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