Tenho um amigo em Nova York
chamado Tom White. Ele tem 34 anos e é o exemplo perfeito do que se pode chamar
de "a nova nobreza digital". Tom tem quatro secretárias que o atendem
24 horas por dia. Ele nunca se encontrou com nenhuma, mas elas cuidam de todos
os aspectos pessoais e profissionais da sua vida. Em síntese, ele
"terceirizou" o que precisa fazer ao longo do dia para
"assistentes virtuais" (AVs) contratadas pela internet.
Sua AV mais antiga chama-se
Lidia e foi contratada pelo site Zirtual.com. Quando Tom acorda, ela já leu
seus e-mails, selecionou os mais importantes e marcou os compromissos do dia.
As outras AVs são Ruth, encontrada pelo site Upwork.com, Isabel, que mora na
Carolina do Norte, e Clara, que é moradora das Filipinas e trabalha na
madrugada.
Uma das atividades favoritas de
Tom é andar pelos parques da cidade enquanto uma das suas AVs lê seus e-mails
em voz alta e transcreve respostas, tudo pelo telefone. Ele também terceirizou
para elas a organização completa de sua festa de despedida de solteiro.
Elas organizaram uma viagem
para 15 pessoas a uma ilha deserta na costa leste dos EUA, contrataram
motoristas para cada um, alugaram um barco e fecharam toda a contratação de
comidas e bebidas. Tudo o que Tom e os amigos tiveram de fazer foi ir até a
festa.
Tom usa as AVs para tudo. São
elas que fazem compras no supermercado pela rede e mandam para sua casa, enviam
flores e cartões para amigos e familiares, ligam para call centers para
reclamar de serviços que não funcionam. Tom também tem pedido para elas ligarem
para o gabinete de políticos em Washington para defender posições políticas que
ele acha importantes.
Serviços como esses estão se
tornando cada vez mais populares. Eles são exemplos da "internet dos
ricos". Trata-se da obsessão atual do Vale do Silício de criar serviços de
comodidade para liberar o tempo de jovens urbanos endinheirados, muitos deles
pertencentes às classes criativas. Tom é exemplo dessa categoria. Curiosamente,
ele usa o tempo extra que sobra para passar mais tempo na internet.
A onda está só começando. Quem
viu o seriado "Downton Abbey", que mostra a vida da nobreza na
Inglaterra do começo do século 20, pode ter se impressionado com a existência
de figuras como mordomos, valetes e lacaios, que coordenavam cada detalhe da
vida doméstica.
Hoje quem tem dinheiro pode se
juntar a essa nova aristocracia digital. O site HelloAlfred.com, por exemplo,
cobra a partir de US$ 32 (R$ 132) por semana pela contratação de
"mordomos" de ocasião para cuidar dos serviços da casa. Outros, como
Luxe.com, permitem acionar valets para estacionar e cuidar do seu carro a
qualquer hora e local. Os nomes das pessoas neste texto são fictícios. Mas
todas elas são reais. Assim como é real a disparidade entre o esforço de
inovação na internet para quem tem dinheiro e para quem não tem.
Ronaldo Lemos - É advogado, diretor do
Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro, mestre em direito por
Harvard e doutor em direito pela USP, pesquisador e representante do MIT Media
Lab no Brasil.
Fonte: site UOL