TEMPO: DE EXPERIÊNCIA INDIVIDUAL A PROCESSO COLETIVO




Quem trabalha com Previdência Complementar é sistematicamente atormentado pela pergunta: por que o produto/serviço que eu ofereço não tem apelo junto ao público?

As respostas para essa questão são muitas e todas reais: 
1. no Brasil não temos cultura previdenciária
2. sem cultura previdenciária, o trabalhador não faz planejamento de vida de longo prazo
3. sem planejamento, o trabalhador não poupa para a aposentadoria durante a carreira
4. poupança é renúncia de consumo/satisfação imediata
5. poupança é sacrifício
6. a ideia de aposentadoria é rejeitada/negada por ser associada a decadência, tristeza, fragilidade, dependência
5. apenas uma parte ainda muito pequena da população no Brasil não se enquadra nas evidências e estatísticas anteriores.


Post publicado pela OAB PREV - MG

Também é preciso reconhecer que, no Brasil, a longevidade é um fenômeno do século 21. Na Europa, por exemplo, já no século 20, a longevidade deixou de ser uma experiência individual para se transformar em processo vivenciado coletivamente. 

No Brasil, a longevidade e o envelhecimento são uma realidade nada atraente.
Sem referências positivas, o imaginário demora mais para assimilar tudo o que os dados estatísticos registram, antecipam e representam. Sem referências positivas que sinalizem para outras possibilidades, prevalecem as resistências às transformações.

"(...) na França metropolitana, pessoas de 85 anos ou mais, que representavam 0,5% da população em 1950, são 2,7% em 2012 e deverão representar 7,5% da população em 2050.

Já o número de centenários passou de 200 em 1950 a 17.000 hoje, devendo chegar a 60.000 em 2050. É o que os demógrafos chamam de 'envelhecimento no envelhecimento'.

Tal fenômeno é acompanhado de um aumento da expectativa de vida sem incapacidades e da chegada à idade avançada de pessoas em condições físicas relativamente boa. Essa realidade é ocultada pela focalização de políticos e dos meios de comunicação nas pessoas idosas que vão mal, que sofrem de alguma deficiência física ou psíquica e não conseguem mais realizar sozinhas certas atividades básicas da vida cotidiana, como a higiene pessoal, vestir-se ou alimentar-se". [*]

A experiência com o tempo depende de condições objetivas (ambientais, econômicas e sociais). É também uma relação simbólica que envolve valores e referências que se transformam permanentemente. No Brasil, o envelhecimento e a longevidade ainda são associados às mudanças físicas. Na França, o envelhecimento e a longevidade são associados a novas possibilidades e oportunidade de adaptação permanente (para superar as limitações funcionais, por exemplo).

Objeto do desejo

Ainda que o envelhecimento não tenha status de objeto do desejo, ele pode ser interpretado e vivenciado de formas diferentes em lugares diferentes. A "experiência de uso" mais realista, pragmática e positiva da longevidade termina ressignificando o envelhecimento como um processo de formação de patrimônio pessoal que não se restringe aos bens financeiros e contempla também a experiência de vida, a qualidade, o equilíbrio emocional, a liberdade, a independência e autonomia. Reconhecido e legitimado, esse patrimônio pessoal passa a ser identificado como objeto de atenção paras gerações mais jovens, que o associam a respeito e fator de sucesso.

"Os indivíduos contemporâneos são convidados a ser atores e responsáveis por sua vida e a decidir por si mesmos quanto a sua existência. Em outras palavras, a matriz cultural segundo a qual a vida é um 'projeto', exigindo que sejam feitas escolhas, está no cerne da modernidade". [*]

Não dá para saber se em lugares economicamente mais desenvolvidos - como é o caso da França - os jovens fazem associação imediata entre longevidade e Previdência Complementar ou plano de futuro. Mas dá para entender que o imaginário sobre envelhecimento e longevidade já inclui elementos de felicidade e plenitude. E ainda que a felicidade seja fugaz, como a juventude, graças a essa real "experiência de uso do tempo", a longevidade e o envelhecimento ganham uma feição, no mínimo, mais simpática.



O distante cada vez mais próximo

O envelhecimento está mais próximo para todos. Isso é fato! Menos natalidade e maior expectativa de vida são a base da fórmula. Vamos esperar que a experiência coletiva faça evoluir o imaginário, a cultura e a relação com o tempo.

Se viveremos mais e se o tempo de envelhecer será maior do que o da juventude, então será mais lógico e confortável fazermos as pazes com ele, ao invés desperdiçar energia rejeitando e combatendo a realidade. Sabedoria e equilíbrio para todos agora! E, no futuro, eu não sei bem se plano de aposentadoria. Mas planos para vidas cada vez mais longas, certamente!

[*] Trechos do artigo Da terceira idade à idade avançada: a conquista da velhice, de Vicent Caradec, publicado no livro Velho é lindo!, de Mirian Goldenberg. Civilização Brasileira, 2016.

Eliane Miraglia - mestre em Ciências da Comunicação, especialista em Gestão de Processos Comunicacionais e consultora de comunicação, tem participado em projetos com a Suporte Educacional.

Fonte: blog da Eliane:  www.elianemiragliablogspot.com.br

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