Experiências
escolares inadequadas ou traumáticas podem gerar ansiedade quanto aos números
Semana passada, dei entrevista a uma TV do Rio de Janeiro,
sobre a promoção do Brasil ao grupo 5 da União Matemática Internacional e o
panorama do ensino de matemática. Simpática e competente, a entrevistadora
apressou-se a avisar que não era uma “pessoa de matemática”. A maioria dos
presentes fez coro, explicando: “eu sou de humanas”.
O cérebro do nascimento importa muito menos do que o
modo como ele é reorganizado, por meio da aprendizagem - Fotolia
Que algumas pessoas nascem “de exatas” e outras “de
humanas” é uma das ideias mais difundidas da civilização ocidental. E é também
um disparate, com consequências graves para o desempenho escolar de crianças e
jovens. Essa foi a mensagem central do seminário “Mentalidades matemáticas”, do
qual participei em São Paulo.
O seminário foi dedicado às ideias da professora Jo
Boaler, da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. A partir de avanços
recentes na pesquisa sobre o cérebro e de sua experiência como educadora, a
pesquisadora defende que todo ser humano saudável pode dominar os conteúdos de
matemática na educação básica.
Progressos na neurologia mostram que o cérebro é uma
estrutura extremamente plástica, que pode ser moldada de forma profunda. O
cérebro do nascimento importa muito menos do que o modo como ele é
reorganizado, por meio da aprendizagem, ao longo de nossa infância e juventude.
Uma experiência educacional feliz produz as conexões
sinápticas que formam um cérebro “inteligente”. Já uma experiência escolar
inadequada ou traumática, gera ansiedade matemática, um distúrbio psicológico
muito comum, que trava qualquer tentativa de raciocínio matemático.
Ao
contrário de tantas pesquisas em educação matemática “pura”, as afirmações da
professora Boaler estão amparadas em evidências e em uma abordagem prática para
o ensino da matemática para todas as crianças, “talentosas” ou não. Falarei
sobre isso na próxima coluna.
Marcelo
Viana
Matemático
e diretor-geral do Impa, é ganhador do Prêmio Louis D., do Institut de France.